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Promotor de Justiça João Leonardo, Brenda Carvalho e juíza Janaína Araújo - Imagem: reprodução |
O Ministério Público Eleitoral do Maranhão, por meio do promotor João Leonardo Sousa Pires Leal, afirmou em parecer que não houve fraude à cota de gênero no caso envolvendo a candidata Brenda Carvalho Pereira e outras mulheres do Podemos em São Luís nas eleições de 2024. A decisão, proferida na sexta-feira, 6 de junho, no âmbito da Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), desconsidera um robusto conjunto de confissões, vídeos e depoimentos que expõem as entranhas de um escandaloso esquema de desvio de recursos públicos.
O escândalo foi revelado pelo site Folha do Maranhão e confirmado em vídeo gravado pela própria candidata Brenda Carvalho. Sem rodeios, ela admite que não realizou campanha, passou o período eleitoral viajando e repassou os recursos recebidos ao presidente municipal do partido, Fábio Henrique Dias de Macedo Filho — filho do deputado federal Fábio Macedo e presidente do Podemos em São Luís. Brenda não só entregou o dinheiro ao partido, como também prestou depoimento à Polícia Federal, relatando que jamais teve qualquer atuação eleitoral e que foi mantida na disputa apenas para cumprir a cota de 30% de candidaturas femininas exigida por lei e viabilizar a utilização do dinheiro.
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Brenda Carvalho - Imagem: reprodução |
A Polícia Federal, ao tomar conhecimento dessas revelações e dos indícios colhidos nas reportagens do Folha do Maranhão, deflagrou a Operação Malversador. A ação desbaratou um esquema criminoso que forjava candidaturas femininas para desviar recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). Foram cumpridos 11 mandados de busca e apreensão contra pessoas físicas e jurídicas envolvidas no caso. O principal alvo, Fábio Macedo Filho, teve suas funções partidárias suspensas por ordem judicial. A PF descobriu contratos forjados, notas fiscais superfaturadas e empresas de fachada que movimentaram mais de R$ 1 milhão em dinheiro público. Só no caso de Brenda Carvalho, a “candidata laranja”, foram impressos fraudulentamente 1 milhão de santinhos e 50 mil bottons — tudo bancado com recursos do FEFC.
Apesar desse vasto acervo de confissões, vídeos e investigações, o parecer do MP Eleitoral ignorou a contundência das provas e se apoiou em registros genéricos de supostos atos de campanha apresentados pela defesa. Para o promotor, mesmo com a confissão de Brenda de que não pediu votos, imagens de caminhadas e eventos políticos foram suficientes para afastar a fraude — contrariando a farta documentação que evidencia a manipulação das contas eleitorais e o uso ilícito da verba pública.
Desde o ano passado, o Folha do Maranhão vem publicando reportagens detalhando o papel de Brenda Carvalho como “candidata de fachada” — uma laranja usada para desviar R$ 300 mil em recursos públicos, gastando, segundo as contas oficiais, R$ 16 mil por cada voto obtido (foram apenas 18 votos no total). A empresa contratada para esses serviços, KM Produções, opera a partir de um apartamento no bairro Olho d’Água, com capital social de apenas R$ 5 mil — um disfarce para movimentar recursos milionários de campanha.
Brenda admitiu ter sido apenas um nome no papel, sem qualquer envolvimento real, e afirmou que toda a movimentação financeira foi orquestrada pelo presidente do partido. Em suas próprias palavras: “Eu não fiz campanha, não pedi voto. Se alguém disser que pedi, está mentindo.” Ela também questionou quem realmente se beneficiou com o dinheiro: “Acham que sou burra? Pegar R$ 300 mil que não é meu e gastar aleatoriamente?”
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Wendell Martins, Macedo Filho e Raimundo Júnior - Imagem: reprodução |
Apesar do constrangedor silêncio do Ministério Público Eleitoral, a Justiça Eleitoral e a Polícia Federal continuam avançando nas investigações. Com base nas provas já reunidas, a AIJE movida por Mateus do Beiju, suplente de vereador pelo PL, pode resultar na cassação dos mandatos dos três vereadores eleitos pela legenda de Fábio Macedo Filho: Wendell Martins, Raimundo Júnior e o próprio Macedo Filho (foto).
O processo segue em trâmite na Justiça Eleitoral, que não está vinculada ao parecer do MP.
Juíza rejeita denúncia de fraude à cota de gênero contra o Podemos
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Janaina Araújo - Imagem: reprodução |
A Justiça Eleitoral de primeira instância rejeitou a ação que pedia a cassação dos vereadores do Podemos em São Luís por suposta fraude à cota de gênero nas eleições de 2024. A decisão, assinada pela juíza Janaina Araújo de Carvalho, da 1ª Zona Eleitoral, entendeu que não há provas suficientes para confirmar o uso de candidaturas fictícias, conhecidas como “laranjas”, pelo partido.
A denúncia, apresentada pelo partido Republicanos e por dois eleitores, apontava que o Podemos teria lançado candidaturas femininas apenas para cumprir o percentual mínimo de 30% exigido pela legislação eleitoral. O foco estava nas candidaturas de Brenda Carvalho, Maria das Graças de Araújo Coutinho e Ana Amélia Mendes Lobo Jardim, acusadas de participarem do pleito apenas de forma simulada, sem campanha efetiva, com votações inexpressivas e movimentações financeiras suspeitas.
Na sentença, a magistrada reconhece que, embora o desempenho eleitoral tenha sido baixo — Brenda com 18 votos, Maria das Graças com 103 e Ana Amélia com 394 —, isso, isoladamente, não caracteriza fraude. Para ela, há nos autos elementos que comprovam atos de campanha, como produção de material gráfico, participação em eventos e mobilização mínima, suficientes para afastar a tese de candidatura fictícia. A juíza também ressaltou que não se pode exigir que toda campanha dependa exclusivamente de redes sociais ou alcance resultados expressivos para ser considerada legítima.
Apesar da decisão favorável ao Podemos na primeira instância, o caso está longe de um desfecho. A própria sentença reconhece que o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MA) tem autonomia para reformar o entendimento. Na prática, os vereadores de São Luís, Fábio Macedo Filho, Wendell Martins e Raimundo Nonato dos Santos Júnior seguem sob risco de perderem seus mandatos, caso o pleno do TRE entenda que houve, sim, descumprimento da cota de gênero.
O caso ganhou ainda mais repercussão pela divergência de entendimentos que vêm sendo adotados pela Justiça Eleitoral em todo o país. Enquanto alguns tribunais têm sido rigorosos na análise de indícios de candidaturas fraudulentas, outros exigem provas mais robustas e incontestáveis.
Agora, caberá ao TRE-MA avaliar os recursos que devem ser apresentados pelos autores da ação. Caso entenda pela existência da fraude, o tribunal poderá não apenas cassar os mandatos, mas também anular todos os votos do partido e determinar uma nova recontagem do quociente eleitoral.
A nova decisão causou estranheza. Isso porque o processo reúne uma série de provas consideradas contundentes, como documentos, conversas, registros em redes sociais e, principalmente, a própria confissão de Brenda Carvalho, que admitiu ter sido coagida a se candidatar apenas para preencher a cota feminina. Além disso, ela prestou depoimento à Polícia Federal, no âmbito de uma operação que revelou outras irregularidades, incluindo contratos suspeitos, repasses de recursos e utilização de empresas ligadas a dirigentes do partido. Mesmo diante desse conjunto de evidências, a sentença ignorou pontos que, na visão dos autores da ação seriam mais que suficientes para comprovar a fraude.
Fonte: Folha do Maranhão
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