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quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

'Aristóteles não é simplesmente o filósofo mais importante, mas o ser humano mais importante que já viveu'

O filósofo grego Aristóteles (384-322 a.C.) foi um polímata cuja obra é considerado
um pilar fundamental da cultura ocidental - Imagem: reprodução

"Aristóteles não é simplesmente o filósofo antigo mais importante, nem simplesmente o filósofo mais importante de todos os tempos; Aristóteles é o ser humano mais importante que já viveu".

Essa afirmação foi feita pelo filósofo britânico John Sellars em um artigo na revista acadêmica Antigone pouco antes da publicação de seu livro, Aristóteles: Entendendo o Maior Filósofo do Mundo.

O título do livro, reflete a motivação de Sellars para escrever o livro: sua experiência como estudante de Filosofia mergulhando fundo na obra do pensador grego.

"Quando comecei, sabia muito bem que Aristóteles era uma figura importante, mas achei isso muito intimidador. Toda vez que eu tentava mergulhar em suas obras, quase imediatamente me perdia."

No entanto, ele perseverou e aprendeu que "você precisa saber lê-lo".

Como? "Lentamente", diz.

Seu livro é uma amostra que ele espera que incentive mais gente a conhecer os escritos do filósofo dos séculos IV e III a.C., sirva como um guia nesta jornada e nos ajude a descobrir como ele é brilhante.

E ele é, mas "o maior do mundo", "o maior de todos os tempos", "o ser humano mais importante"?...

"Esse é o meu ponto de vista, e sei que existem outros acadêmicos que o compartilhariam, nem todos, é claro, mas eu não sou o único que pensa assim", disse ele à BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC.

Sellars é um respeitado especialista em conhecimento, professor de Filosofia na Universidade Royal Holloway, em Londres, e autor de aclamadas palestras sobre estoicismo e epicurismo.

Mesmo assim, pedimos que ele nos convencesse da importância de Aristóteles.

Mas primeiro...

Relembrando brevemente

Aristóteles faz parte da tríade dourada da Filosofia clássica completada por Sócrates e Platão.

Ele era originário do norte da Grécia e, aos 18 anos, foi estudar na Academia de Platão em Atenas, onde, por duas décadas, foi aluno e depois colega do grande pensador.

Com o tempo, embora sempre tenha reconhecido o quanto devia ao professor, ele se distanciou de suas ideias e desenvolveu suas próprias opiniões.


"Platão é meu amigo, mas o mais amigo é a verdade", disse Aristóteles (em toga azul),
referindo-se ao seu mestre (em toga vermelha) - Imagem: reprodução

Após a morte de Platão, Aristóteles deixou Atenas e, depois de um tempo na Ásia Menor, mudou-se para a ilha grega de Lesbos, onde se dedicou ao estudo do mundo natural.

Anos depois, o rei Filipe da Macedônia o convidou de volta ao norte da Grécia para ensinar seu filho Alexandre, que mais tarde se tornaria conhecido como Alexandre, o Grande.

Quando Filipe foi assassinado enquanto Alexandre estava em sua grande campanha no Oriente Médio e na Índia, Aristóteles temeu por sua segurança e retornou a Atenas, onde fundou sua própria escola, o Liceu, aos 50 anos.

Ele morreu aos 62 anos, deixando para trás uma vasta biblioteca, incluindo seus próprios numerosos escritos.

De acordo com a Enciclopédia Britânica, as obras sobreviventes de Aristóteles, embora representem provavelmente apenas um quinto de sua produção total, somam cerca de um milhão de palavras.

Embora Sellars admita que dizer que Aristóteles é a pessoa mais importante de todas seja uma afirmação aparentemente "exagerada, tão grandiloquente que parece uma hipérbole afetada", ele tem argumentos para isso.

"Acho que ele é o maior em termos da escala de sua influência e do impacto que teve."

"Ele contribuiu tanto para tantas coisas que ainda são relevantes hoje em dia que nem percebemos que elas estão conectadas a ele."

Com água até os joelhos

Aristóteles não era apenas o protótipo de um filósofo sentado em uma academia ou palácio na Grécia Antiga, meditando com o olhar perdido à distância.

Como seu objeto de estudo era o mundo ao seu redor, ele também costumava fazer trabalho de campo, diz Sellars.


Aristóteles retratado no século XIII - imagem: reprodução

Quando ele partia para estudar a vida natural, ele "ia às praias e, com as águas até os joelhos, observava os animais, pegava insetos, peixes, caranguejos e polvos e depois os examinava".

"Até então, ninguém havia tentado estudar sistematicamente os seres vivos."

Assim, ele criou a disciplina de biologia.

Mas cuidado, isso não significa que suas conclusões estavam corretas. Na verdade, a maior parte do conhecimento que obteve nesse campo está obsoleto.

No entanto, o fato de ele ter sido provado errado em algumas observações não desvaloriza seu trabalho, porque no cerne de seu pensamento está que a evidência triunfa sobre a teoria.

"Toda teoria está aberta à refutação por meio de observações subsequentes, disse Aristóteles mais de uma vez", enfatiza Sellars.

O que também é excepcional é a maneira pela qual ele buscou o conhecimento, que "lançou as bases da ciência empírica".

"Refletindo sobre a natureza da ciência, ele criou um método para o pensamento científico, que foi outro avanço muito importante."

E enquanto "estava tentando entender como os seres vivos funcionavam, ele desenvolveu uma abordagem que depois aplicou a outros campos."

Outras águas

Por exemplo, Aristóteles adotou sua metodologia de conhecimento em seus estudos de política.

Para entender e escrever sobre isso, precisava de amostras, então "ele coletou cópias de todas as constituições que regiam as diferentes cidades do antigo mundo mediterrâneo", diz Sellars.

Isso permitiu que ele comparasse e analisasse as diferentes cidades e comunidades.

Assim como os animais, os diferentes tipos de governos poderiam ser classificados — monarquias, oligarquias, democracias — e, com base em informações históricas, ter uma ideia de quais floresceram.

Foi uma abordagem bem científica que marcou o início das ciências sociais.

"A política pode ser um assunto acalorado, e as pessoas têm opiniões fortes."

"A ideia de tentar dar um passo atrás e adotar essa abordagem mais científica, coletando informações antes de fazer um julgamento, é uma forma muito madura de se pensar sobre política que ainda não aprendemos totalmente", diz o autor..


Ao contrário da Academia de Platão, o Liceu de Aristóteles realizava muitas palestras
abertas ao público em geral e gratuitas - Imagem: reprodução

Ele fez a mesma coisa quando explorou a literatura em sua obra poética.

"Para entender o drama grego, de uma forma muito científica, ele o desmontou e pensou em todos os diferentes elementos que contribuem para seu sucesso", Sellars explica.

"Ele analisou o enredo, os personagens, a encenação — tudo o que é importante."

"E, embora pareça muito óbvio agora, ele ressaltou que você precisa de um começo que dê ao público uma ideia de qual é a situação, depois a ação principal e, finalmente, uma resolução que não deixe pontas soltas, para que seja satisfatória para o público e eles possam sair com uma sensação de satisfação."

Assim, ele estabeleceu os elementos básicos de uma boa história, com uma análise que ainda é usada hoje e que também deu origem à crítica literária.

Como se isso não bastasse

Assim, resume Sellars, Aristóteles foi "a primeira pessoa a estudar sistematicamente a política e a pensar a literatura e a ciência dessa maneira, e ele inventou a lógica formal, o que é uma grande conquista por si só".

A lógica também?

"Ele foi o primeiro a estudar as estruturas do pensamento racional e, com isso, inventou a lógica formal e articulou claramente pela primeira vez os principais princípios lógicos, como a Lei do Meio Excluído: qualquer proposição só pode ser verdadeira ou falsa."

"Essa divisão binária é a ideia fundamental subjacente ao mundo digital."

Além disso, "Ética a Nicômaco, de Aristóteles, foi provavelmente o livro de ética mais influente de todos os tempos", diz Sellars.

Por quê?


O sistema filosófico e científico de Aristóteles se tornou a estrutura e o veículo
tanto da escolástica cristã quanto da Filosofia islâmica medieval - Imagem: reprodução

"Por causa da riqueza e complexidade da resposta que ele dá. Ele não simplifica. E ele reconhece todas as dificuldades reais de tentar viver uma vida humana."

"Ele também traz seu espírito científico para o assunto".

"Temos que pensar primeiro sobre o que é um ser humano e quais são suas capacidades e habilidades, e depois sobre o que significaria ser um bom ser humano que usasse essas capacidades e habilidades da melhor maneira possível."

Aristóteles acreditava que, além de crescer, se mover e se reproduzir, como outros seres vivos, nossa capacidade distinta é raciocinar: a grande maioria dos seres humanos adultos são pensantes... potencialmente.

"Para citar um exemplo que ele gostou, os olhos servem para ver; essa é a função deles. Se alguém tem olhos, mas nunca os abre, eles não seriam olhos no sentido mais pleno", ilustra Sellars.

Na mesma linha, "só somos seres verdadeiramente pensantes quando realmente pensamos".

Ao fazer isso, exercitamos o fato de sermos humanos. E o que é um bom ser humano, então?

Social, curioso e racional

É aquele que usa bem a razão, diz Sellars, acrescentando que "uma maneira de usarmos a razão é controlando os desejos e emoções irracionais que temos, impedindo que eles nos dominem."

"Ou seja, se um ser humano adulto ainda é excessivamente emotivo — fazendo birras quando não consegue o que quer e se comporta como uma criança — poderia-se dizer que ele nunca cresceu de verdade, que nunca se tornou adulto de verdade, certo?"

"Aristóteles também insiste que somos seres sociais e é por isso que temos que nos dar bem com outras pessoas. Isso é absolutamente fundamental."

"Outra coisa é que ele acha que, por natureza, somos curiosos, queremos conhecer e aprender, e que esse é um instinto humano natural."

"Se quisermos florescer e viver uma vida boa, devemos ser sociais, curiosos e racionais", diz Sellars.

Os conceitos de Aristóteles continuam enraizados porque "ele moldou a maneira como pensamos."

"Suas ideias e conceitos permearam nossa maneira natural de pensar a ponto de se tornarem imperceptíveis."

O que você acha... o argumento de Sellars te convenceu?


Fonte: BBC Brasil

sábado, 28 de setembro de 2024

Hildegarda de Bingen, a santa que descreveu o orgasmo feminino pela 1ª vez e 'inventou' fórmula da cerveja

Imagem: reprodução

Platão disse que quem inventou a cerveja era um homem sábio. Ele estava errado. Na verdade, foi uma mulher. Uma pessoa sábia, sim, mas uma mulher.

As mulheres não são apenas responsáveis pela descoberta, mas suas contribuições ao longo da história da cerveja foram cruciais para o desenvolvimento da bebida, e para a construção da concepção cultural do uso que fazemos dela hoje.

O livro The Philosophy of Beer (A filosofia da cerveja, em tradução livre) oferece uma história interessante de uma das bebidas mais consumidas no mundo, cuja produção remonta milhares de anos atrás. Mas que começou a passar por um processo de popularização mundial a partir do fim da Idade Média, quando era produzida em mosteiros europeus e transportada por navios que buscavam novos horizontes comerciais.

Mas qual é, de fato, a origem, da cerveja?

Há pouco mais de 7.000 anos, a fabricação de cerveja começou a se desenvolver na Mesopotâmia; eram as mulheres que misturavam grãos de cereais com água e ervas para fazer uma bebida com fins nutricionais.

Elas cozinhavam a mistura e, dessa mistura intuitiva, para aplacar a fome, surgia um caldo que fermentava espontaneamente.

Logo começaram a desenvolver suas habilidades em torno desse líquido turvo, espesso, mas altamente nutritivo, que também era capaz de iluminar o espírito.

Desde então e por centenas de anos, seu grau de conhecimento fez com que as mulheres fossem as únicas que podiam produzi-lo e também comercializá-lo. Elas eram responsáveis por sua produção e comercialização. Elas ainda eram responsáveis e as licenças e os equipamentos para produzi-lo eram delas.

E assim foi até a Idade Média, quando na Europa as licenças passaram para os nomes dos maridos.

A mudança legal da licença pode ter tido a ver com o fato de que, naquela época, a cerveja era um bem muito precioso e, embora fosse fabricada para consumo doméstico, o excedente era vendido para obter uma renda familiar extra. Assim, elas continuaram a trabalhar, mas o produto não era mais delas. E nem o dinheiro que ele rendia.

A versão mais difundida da origem da cerveja atual afirma que ela foi inventada por monges. No entanto, quando os monges viram o potencial do que as famílias e, em especial, as mulheres, já estavam fazendo, decidiram investir no cultivo de cereais para criar novas misturas e comercializá-las.


A versão mais difundida da origem da cerveja atual afirma que ela foi inventada por monges
 - Imagem: reprodução

Lúpulo e Hildegarda de Bingen

Entretanto, apesar desse monopólio clerical, a cerveja como a conhecemos hoje também foi inventada por uma mulher.

Foi na Idade Média que a fabricação de cerveja sofreu uma mudança substancial com a adição do lúpulo, um parente próximo da cannabis, cujas flores dão à bebida seu amargor característico e propriedades conservantes que permitem que ela seja armazenada por muito mais tempo.

A abadessa Hildegarda de Bingen (1098-1179), a versão feminina de Leonardo da Vinci, foi responsável pela descoberta que provocou essa mudança radical na fabricação de cerveja.

Essa boa mulher, que combinou sua função de mestre cervejeira com a de teóloga, escritora, compositora musical e botânica (em sua obra Physica, ela descreveu mais de 200 plantas), entre outras habilidades, acabou sendo canonizada pela Igreja Católica. Embora isso tenha levado doze séculos.

Em 2011, o Papa Bento 16 acrescentou Hildegarda ao catálogo de santos católicos, e um ano depois a nomeou “quarta Doutora da Igreja Católica”, depois de Santa Teresa, Santa Catarina e Santa Teresa de Lisieux.

Uma santa que descreveu o orgasmo

Além de sua notável contribuição para a cerveja, essa freira de clausura nos legou também uma outra “descoberta” prazerosa: a primeira descrição escrita conhecida de um orgasmo feminino.

Ao contrário de escritores da época, como seu contemporâneo Constantino, o Africano, que em seu Liber de coitu descreveu todos os tipos de prazeres carnais sem mencionar as mulheres, Hildegarda foi a primeira a ousar afirmar que o prazer não era obra de Satanás, que residia no cérebro e que as mulheres também o sentiam.

No Book of Causes and Remedies of Diseases, a carismática abadessa de Binguen escreveu que o sexo não era fruto do pecado e que o prazer sexual era uma questão de dois, e descreveu o momento do clímax e da ejaculação de um casal em termos inequívocos:

Assim que a tempestade da paixão surge em um homem, ele é lançado nela como uma pedra de moinho. Seus órgãos sexuais são então, por assim dizer, a forja à qual a medula dá seu fogo. Essa forja, então, transmite o fogo para os órgãos genitais masculinos e os faz queimar poderosamente.

E sua parceira está longe de ser um recipiente insensível:

Quando a mulher se une ao homem, o calor do cérebro da mulher, que tem prazer nele, faz com que ele sinta o prazer da união e ejacule seu sêmen. E quando o sêmen cai em seu lugar, esse calor muito forte do cérebro o atrai e o retém consigo mesmo, e imediatamente o rim da mulher se contrai e fecha todos os membros que, durante a menstruação, estão prontos para se abrir, assim como um homem forte segura uma coisa em sua mão.

Esse tratado médico foi publicado há doze séculos. A verdade é que, somente por isso, ela merecia ser uma santa.

*Manuel Peinado Lorca é professor emérito de Ciências da Vida e diretor do Jardim Botânico Real da Universidade de Alcalá (Espanha)

**Este artigo foi publicado no site The Conversation e reproduzido aqui sob a licença Creative Commons. Clique aqui para ler a versão original.

Fonte: BBC Brasil


quinta-feira, 15 de agosto de 2024

Feminismo atual é voltado a uma minoria privilegiada, diz filósofa feminista

Imagem: reprodução

O feminismo atual é "distante" para a grande maioria das mulheres e só encontra eco entre as "muito privilegiadas". Essa avaliação é feita por Nancy Fraser, filósofa americana e professora titular de ciências políticas e sociais da New School for Social Research, em Nova York.

Feminista, Fraser publicou diversos livros sobre filosofia política e social nos EUA e Brasil, incluindo Feminismo para 99% - um manifesto, e conversou com a BBC News Brasil sobre o debate acerca da diversidade e pautas identitárias que toma conta do cenário político atual.

Ela faz críticas à esquerda sobre representantes de movimentos identitários que, segundo ela, se unem a uma "agenda neoliberal", que teve efeitos negativos no bem-estar social dos trabalhadores em todo o mundo, em uma luta para 1% da população.

"O feminismo para os 99%, como entendemos, é um projeto de entender que você não pode separar gênero de raça, classe, sexualidade, ecologia, democracia e políticas econômicas", disse.

Fraser cunhou o termo "neoliberalismo progressista" para tentar descrever uma aliança entre parte da elite capitalista, centrada em Wall Street e no Vale do Silício - e que busca o livre mercado para empresas e a redução da intervenção do Estado - e liberais de movimentos feministas, antirracistas, ambientalistas e LGBTQIA+.

Para ela, a aliança do "neoliberalismo progressista" dominou a pauta política das últimas décadas e ajudou na ascensão de nomes como Donald Trump, nos EUA, e de Jair Bolsonaro, no Brasil.

Fraser também critica o debate que se formou acerca da indicação do advogado Cristiano Zanin Martins para a vaga no STF (Supremo Tribunal Federal) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva neste mês. Políticos de esquerda e representantes da sociedade civil afirmaram que a opção deveria ter sido por uma mulher negra.


'O feminismo atual é um grito distante para a grande maioria e faz eco apenas para
essas mulheres muito privilegiadas', diz Nancy Fraser - foto: reprodução

Para a filósofa, contudo, as condições de sexo e raça do candidato não devem ser as únicas a serem consideradas para a escolha.

Confira a entrevista da BBC News Brasil com a filósofa:

BBC News Brasil -Para começar, queria entender melhor a sua definição do "neoliberalismo progressista" e como a senhora vê a atual crise pela qual a democracia passa em países como EUA e Brasil?

Nancy Fraser - O neoliberalismo progressista é um termo que cunhei para tentar descrever uma aliança entre uma fração da elite capitalista, centrada em Wall Street, no Vale do Silício e Hollywood, lugares simbólicos do capital hi-tech, e de parte dos liberais mainstream de movimentos feministas, antirracistas, ambientalistas e LGBTQIA+.

Em muitos países, o neoliberalismo se consolidou com esse tipo de aliança com os progressistas. Você poderia citar Ronald Reagan [ex-presidente dos EUA] e Margaret Thatcher [ex-primeira ministra do Reino Unido], tipos originais de conservadores e que introduziram o neoliberalismo nesses países, mas em outros locais, o neoliberalismo foi realmente consolidado por um tipo de política quase que de centro-esquerda.

Falamos, por exemplo, de Bill Clinton, que construiu o que chamamos de “Novos Democratas” - uma força política utilizada para marginalizar a ala esquerda do partido Democrata. Podemos citar também o novo Partido Trabalhista de Tony Blair, no Reino Unido, que são os exemplos mais célebres.

Clinton e Blair colocaram, em um mesmo movimento político, feministas, antirracistas, ambientalistas e ativistas LBGTQIA+ de um lado e uma parte muito cosmopolita e super tecnológica dos empresários do outro.

A ideia era realmente promover uma liberalização, mercantilização e financeirização da economia, mas que teve efeitos muito negativos na segurança econômica e no bem-estar social das classes trabalhadoras em todo o mundo.

As forças que desejavam esse tipo de projeto econômico precisavam de algum carisma, algum tipo de toque especial, que faria esse projeto se tornar atrativo e vinculado a algo que poderia obter amplo apoio. Isso, de certa forma, forneceria cobertura perante a sociedade, dado que essa política econômica é feita para os ricos, mas que, com isso, poderia ser vista como algo amigável pelo restante.

Portanto, tal política econômica foi fundida com uma forma de feminismo meritocrático, antirracista e ambientalista. Com isso, essa forma de política socioeconômica conseguiu a imagem de ser algo emancipatória, excitante, que olhava para frente.

Em alguns países, como na Alemanha liderada pelo ex-primeiro-ministro Gerhard Schröder, do SPD (Partido Social-Democrata alemão), essa política teve muito sucesso, mas acho que nunca houve um nome para isso. Por isso, comecei a definir esse conjunto de políticas como “neoliberalismo progressista”, pois eu queria realmente sinalizar o neoliberalismo como um projeto econômico muito inconstante e oportunista.

BBC News Brasil - O "neoliberalismo progressista" fez com que as discussões se tornassem mais identitárias, ao invés de econômicas, tanto nos EUA como no Brasil?

Fraser - Eu distinguiria a discussão entre políticas de distribuição e políticas de reconhecimento. Distribuição é exatamente sobre economia. É sobre trabalho, seguros, salários, sobre também quem paga impostos, quanto as empresas deveriam pagar ou quanto a classe média deveria pagar. Tudo isso é o que eu penso sobre as políticas de distribuição.


Fraser afirma que 'para ter uma sociedade genuinamente justa, precisamos de uma política
de inclusão e reconhecimento e de políticas de distribuição igualitárias' - foto: reprodução

Do outro lado, há as políticas de reconhecimento, que tem a ver realmente como nós reconhecemos todos os membros da nossa sociedade. Pessoas que pertencem a grupos que são historicamente marginalizados, como, por exemplo, gays e lésbicas, trans, mulheres negras, imigrantes, minorias religiosas, entre outros.

Essas pessoas serão reconhecidas como membros plenos da nossa sociedade? Eles terão os mesmos direitos? Para mim, você precisa das duas discussões. Para ter uma sociedade genuinamente justa, precisamos de uma política de inclusão e reconhecimento e de políticas de distribuição igualitárias. E, caso haja um desbalanceamento, se focar em um e ignorar o outro, as coisas irão dar errado.

Eu diria que na era do New Deal e da social democracia nos EUA, havia um grande stress sobre políticas mais igualitárias de distribuição, sem uma atenção igual para políticas de reconhecimento. Nas décadas seguintes, em especial nas décadas de 1980, 1990 e 2000, a ênfase mudou apenas para o reconhecimento ou diversidade.

Acredito que, por muito tempo, isso sugou o oxigênio de outras discussões. O foco principal dos movimentos sociais progressistas não estava na parte da distribuição, o que foi um desastre porque foi nessas décadas que o neoliberalismo estava se desenrolando e que era o momento real em que você precisava redobrar a atenção sobre a distribuição de renda.

Ao invés de trabalharmos para que ambas políticas fossem o foco e houvesse uma conexões entre eles, nós tivemos o foco apenas no reconhecimento ou, como você diz, nas pautas identitárias.

Mas, tenho que dizer que recentemente as coisas estão mudando novamente. Eu acho que nós estamos tendo, desde a eleição de Trump nos EUA em 2016, uma mudança das massas, que começam a se virar contra o sistema.

Com essas circunstâncias, há mais atenção sobre distribuição e há versões disso na direita e na esquerda, como Trump e Sanders, nos EUA, por exemplo. Agora, a diferença entre os dois está no reconhecimento. Trump é um branco, nacionalista, anti-imigração, antigay e antitrans, enquanto que do outro lado há inclusão.

Estamos começando a retornar nessa questão de distribuição e reconhecimento e, nos EUA, neste momento, a direita está fomentando uma guerra cultural focada naquilo que podemos falar nas escolas, o que devemos ensinar sobre o racismo nas escolas, dentre outras coisas.

Isso é uma estratégia deliberada para distrair a atenção para longe das políticas econômicas porque os Republicanos, incluindo Trump e seus concorrentes, ainda têm um programa econômico pró-ricos. Eles não querem falar muito sobre isso. Isso é distração.

Então, o desafio para o outro lado é resistir a ser tragado pela guerra cultural e deixar o debate econômico de lado ou, ao menos, entender como conectar essas duas visões novamente.

A diversidade está se tornando uma palavra utilizada apenas pelas empresas. Todas as companhias, toda universidade, tem um departamento de diversidade e essas pessoas são completamente desconectadas de qualquer ideia de como um conteúdo crítico deveria ser. Isso é uma política muito rasa. Não é algo igualitário.

As vezes, aqui nos EUA, nós dizemos "black faces in high places". Então, sem qualquer atenção para a situação da massa das pessoas negras, essa diversidade não possui um conteúdo real e é uma nova distração basicamente.

BBC News Brasil - Mas isso ocorreu por causa da própria esquerda ou a extrema-direita pautou o debate?

Fraser - Eu acho que é uma ótima questão, mas muito complicada. Eu venho pensando muito nisso. De um lado, nós não devemos fazer parte dessa política de distração, não podemos deixar com que todos os debates institucionais sejam sobre esses problemas. Nós não podemos jogar o jogo deles.

Ao mesmo tempo, o que eles estão fazendo é tornar alvo e usando de bode expiatório pessoas reais. Então, nós não podemos lidar com um projeto que nega serviços sociais para uma juventude trans, por exemplo, que está em uma situação frágil e vulnerável.

Nós temos que, de alguma forma, estarmos preparados para defender indivíduos que estão sendo usados, ao mesmo tempo que defendemos os direitos de reprodução, que é um outro foco de ataque.

Por isso, deveríamos falar sobre tais pontos, mas a parte difícil é perceber como conectar esses dois problemas. Isso não é fácil.

BBC News Brasil - A senhora acha que esse "neoliberalismo progressista" ajudou na eleição de presidentes da direita radical, como Trump nos EUA e Bolsonaro, no Brasil?

Fraser - Sim, com certeza. Nos EUA não há dúvidas que o bloco do neoliberalismo progressista, que consolidou o neoliberalismo e marginalizou a parte pró-trabalhista do partido Democrata, realmente tem uma grande parte de responsabilidade na deterioração das condições e dos padrões de vida no país.

No chamado Cinturão da Ferrugem, que é historicamente o coração da indústria americana e hoje é um terreno baldio com muitos problemas de vício em opioides e violência armada, o neoliberalismo progressista tem muito o que responder. Eles, basicamente, supervisionaram a transição de uma classe trabalhadora altamente sindicalizada para uma massa de trabalho mal paga e precarizada.

Não há dúvidas que isso ajudou Trump, mas também ajudou Bernie Sanders. Em outras palavras, as pessoas entenderam, em um certo momento, que eles não poderiam seguir essas políticas neoliberais, que eles precisavam de uma alternativa para uma situação que Antonio Gramsci chama de “crise da hegemonia”.

Elas perceberam que o establishment não é mais confiável, o senso comum já não era mais persuasivo, então as pessoas estavam olhando para uma alternativa radical. Algumas olharam para Trump, outras para Sanders, e o que é muito interessante é que às vezes elas optavam por Sanders, mas com ele fora da disputa, votaram em Trump, em um fenômeno semelhante ao que ocorreu no Brasil, com o voto “Bolsolula”.


Para Fraser, em alguns países, como os EUA, 'o feminismo liberal vem sendo
hegemônico' - foto: reprodução

Qualquer forma de neoliberalismo se tornou tóxica, politicamente falando. As pessoas começaram a procurar alternativas para esse sistema. Em um país como os EUA, onde o neoliberalismo se aliou aos progressistas, é compreensível que Trump fosse o beneficiário maior dessa busca. Isso porque o neoliberalismo se associou muito ao tema da diversidade e, ao rejeitar esse sistema econômico, acabam por rejeitar também a pauta identitária.

BBC News Brasil - No livro Feminismo para os 99% por que a senhora afirma que “o feminismo liberal está falido” e que “é necessário um feminismo para a grande maioria”. O que seria isso?

Fraser - O feminismo sempre foi um movimento com muitas correntes e facções diferentes, ou seja, o feminismo é algo com muitas visões e argumentações. No entanto, em países como os EUA, o feminismo liberal vem sendo hegemônico. Isso se tornou um padrão porque o liberalismo é muito forte na nossa cultura, em geral.

O feminismo surgiu como um movimento radical, em uma nova esquerda, anti-imperialista e anticapitalista, mas assim que a poeira baixou, o feminismo virou um grupo de interesse por assim dizer, e amplamente colado ao partido Democrata nos EUA.

Isso se tornou um assunto normal, uma tendência, e mais e mais focado em como colocar um pequeno número de mulheres em posições de poder dentro de uma hierarquia corporativa, do mundo político e até mesmo na hierarquia militar.

A ideia era que segurar as mulheres embaixo seria uma discriminação e se removessemos essa discriminação, essas mulheres super talentosas poderiam alcançar o topo. Isso é uma visão absurdamente rasa, que ignora completamente as bases da subordinação das mulheres em uma sociedade moderna, que é como dividimos o trabalho produtivo do trabalho de reprodução social, onde pagamos um e o outro não.

Isso é uma característica arraigada profundamente na sociedade, que tem efeitos gigantescos nas chances de vida de homens e mulheres. Então, focaram na ideia de que queremos a meritocracia, da ascensão talentosa, mas a meritocracia não é o mesmo do que igualdade.


Para Fraser, é necessário ir além da legalização do aborto - foto: reprodução

Eu acho que nós tivemos evidências suficientes nos últimos 40 anos para ver que esse feminismo realmente não é capaz de garantir uma condição satisfatória e igualitária para mulheres de todas as classes sociais e raças.

Isso foi manejado de maneira perfeita pela classe dominante, que já tem uma boa educação, boa formação cultural e muitos recursos, mas por isso nós tivemos basicamente um “feminismo de uma só questão”, focado apenas no gênero de uma mesma classe social.

Então, agora eu acredito que o problema é conseguir entender que não podemos isolar a questão de gênero. Se tentarmos, nós acabaremos no feminismo para 1% da população.

O feminismo atual é um grito distante para a grande maioria e faz eco apenas para essas mulheres muito privilegiadas, que possuem o luxo de dizer que nós não precisamos nos preocupar com classes, cor ou temas econômicos, apenas com gênero. O feminismo para os 99%, como entendemos, é um projeto de entender que você não pode separar gênero de raça, classe, sexualidade, ecologia, democracia e políticas econômicas.

Eu acho que sempre houve feministas que praticam esse tipo de feminismo para os 99%, mas que pode ter outros nomes pelo mundo. Nos EUA, os movimentos feministas populares existem, mas são muito marginalizados, enquanto que a mídia foca no feminismo de Hillary Clinton, das atrizes de Hollywood com o movimento “Me too”, mesmo que a maioria das vítimas de assédio sexual sejam trabalhadoras de fazendas ou de hotéis, por exemplo.

Quando Hillary Clinton perdeu para Donald Trump, no exato momento em que estávamos escrevendo o livro, pensamos que seria um tipo de chamado, uma derrota do feminismo liberal. Agora, eu não diria que o feminismo liberal está derrotado, mas acho que há mais abertura agora para formar alternativas de feminismo, como o que ocorre no Brasil e Argentina, onde algumas feministas conquistaram grande visibilidade e que representam o que chamamos de feminismo para 99%.

BBC News Brasil - No Brasil, o STF deverá colocar em julgamento a possibilidade do aborto legal ainda neste ano. No mesmo livro, as autoras afirmam que “o aborto legal faz pouco pelas mulheres pobres”. O que isso significa? A luta pelo aborto legal, em si, não é suficiente?

Fraser - Eu sou uma forte apoiadora do aborto legal, quero deixar isso bem claro. Mas, se você pensar qual é o objetivo que buscamos alcançar ao tornar o aborto legal é tentar dar as pessoas a liberdade, incluindo os recursos que elas precisam para entender a liberdade e fazer que a decisão de ter um filho seja autônoma. Para que elas consigam organizar suas vidas, elas precisam viver com o poder de decisão, mas também com dignidade, segurança e com suporte de um sistema público forte.

De maneira simples, eu estou dizendo que o fato de podermos interromper a gravidez quando nós quisermos é necessário, mas não o suficiente para ter uma autonomia reprodutiva. Aborto legal é uma condição absolutamente necessária, mas apenas uma. Há outras e precisamos de segurança dos meios de subsistência, moradia decente e acessível, assistência médica e suporte para as crianças, com escolas, etc. Isso faria com que as mulheres tivessem uma decisão realmente empoderada e autônoma.

No momento, as pessoas estão fazendo o seu melhor em termos de tentar dar o poder de decisão sobre a gravidez, mas infelizmente isso não é o ideal. Agpra, é a hora das feministas de esquerda tentar unir o direito ao aborto para o serviço social, com garantia de renda e moradia.

É o mesmo caso da violência contra a mulher. A esquerda entendeu que apenas colocar o parceiro abusador na cadeia não é o suficiente, que é necessário oferecer saídas reais para que as mulheres possam realmente sair de relações abusivas. Elas precisam ter um local seguro para criar suas crianças e reconstruir suas vidas, o que, novamente, é algo para o serviço social e o direito à renda e moradia.

BBC News Brasil - Neste mês, o presidente Lula indicou seu ex-advogado, um homem branco, para a Suprema Corte. Parte da esquerda criticou a indicação apenas por ser um homem branco, enquanto que a outra parte silenciou, mas sem uma discussão acerca das posições políticas do indicado. Como a senhora vê isso?

Fraser - Em uma escolha para uma Suprema Corte, eu acredito que é necessário prestar muita atenção para entender as posições jurídicas e em relação ao mundo do candidato.

Se voltarmos às eleições de 2016 nos EUA, eu apoiei Bernie Sanders contra Hillary Clinton. Eu sou uma feminista. Você acha que eu achei incrível ter mais um homem branco na Casa Branca? Mas o mais importante para mim, naquele momento, era o que Bernie e Hillary representavam. Para ser honesta, as feministas estavam divididas e também existiu esse tipo de debate que surgiu agora no Brasil.


Fraser vê como um erro o foco 'apenas na questão identitária' - foto: reprodução

Nós tivemos a experiência de eleger o primeiro presidente negro dos EUA, Barack Obama, e foi um momento de muita esperança, mas que se tornou uma grande decepção. Isso mostra os limites sobre essa discussão de ter que eleger um político que apenas pareça você fisicamente.

Claro que seria incrível ter uma pessoa negra e tenho certeza que há muitos negros e negras qualificados para serem indicados para o STF no Brasil. Mas, eu diria que focar exclusivamente na questão identitária é um problema.

BBC News Brasil - Discussões sobre as escolhas no STF baseada em diversidade também fazem surgir críticas sobre a suposta “americanização” da política brasileira, cada dia mais influenciada e pautada pelos debates e formas dos EUA. A senhora acredita nisso?

Fraser - Eu não tenho certeza. Vocês ao menos têm um partido dos trabalhadores, coisa que não temos por aqui (risos). Eu diria que o que ocorre em todo lugar é a influência das redes sociais e da tecnologia na comunicação política.

Isso é uma mudança no jogo e, com certeza, tem um efeito gigantesco. Se você me perguntar o que fez Trump ter a possibilidade de capitalizar os efeitos negativos do neoliberalismo na classe trabalhadora, eu responderia a mudança radical na estrutura da mídia e na comunicação política.

O que começou lá atrás, com a rádio, depois TVs como a Fox News, se transformou para as redes sociais. Agora, temos um mundo estranho da não-comunicação, fatos alternativos, etc. Discutimos os depoimentos de Trump para a Justiça, mas nas redes a população se divide como eles enxergam isso.

Não sei se as coisas são exatamente assim no Brasil, mas claramente podemos ver como a tecnologia também impacta a política por aí. Quando essa tecnologia de transformação encontra a deterioração das condições de vida da população, coisas como a eleição de Trump, que é um gênio da comunicação e da demagogia, podem ocorrer. Então espero que o Brasil consiga escapar dessa espiral.

Fonte: BBC Brasil


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terça-feira, 10 de outubro de 2023

Por que o Hamas atacou Israel agora?

Imagem: reprodução
O grupo militante palestino Hamas lançou um ataque sem precedentes contra Israel, com seus combatentes adentrando comunidades próximas à Faixa de Gaza, matando mais de 900 pessoas e fazendo reféns.

Em resposta, Israel tem lançado ataques aéreos que já deixaram quase 690 pessoas mortas em Gaza. Outras 3,7 mil ficaram feridas.

Segundo o editor de Internacional da BBC News, Jeremy Bowen, esta foi a operação mais ambiciosa que o Hamas já lançou a partir de Gaza e o ataque transfronteiriço mais sério que Israel enfrentou em mais de uma geração.

Para alguns analistas, houve ainda uma grande falha da inteligência israelense, que apesar de ser a mais extensa e bem financiada do Oriente Médio não conseguiu prever ou agir com base em um aviso.

O conflito entre Israel e palestinos se estende por 75 anos - e a atuação do Hamas na guerra também não é nova.

Então por que o Hamas escolheu justamente este momento para um ataque surpresa de tamanha magnitude?

Retaliação

Embora o ataque do final de semana tenha ocorrido sem aviso prévio, ele ocorreu em um momento de crescentes tensões entre Israel e palestinos.

O ataque de surpresa pode ter sido uma retaliação à violência contra palestinos na Cisjordânia ocupada no ano passado.

Foram 146 palestinos mortos na Cisjordânia pelas forças israelenses em 2022, um número de mortos mais elevado do que em qualquer outro ano desde que as Nações Unidas começaram a manter registros, em 2005.

Soldado israelense prepara artilharia perto de Gaza - Foto: reprodução

Além disso, em uma gravação de áudio divulgada no momento do ataque, Muhammad al-Deif, comandante da ala militar do Hamas, a Brigada al-Qassam, disse que a violência foi uma retaliação ao que chamou de "ataques diários à mesquita Al-Aqsa" que "ousaram insultar nosso Profeta dentro dos pátios da mesquita".

Poucos marcos simbolizam mais as tensões entre israelitas e palestinianos do que a mesquita de Al-Aqsa em Jerusalém Oriental. Localizada em um complexo no topo de uma colina, é o terceiro local mais sagrado para o Islã, mas também é o lugar mais sagrado para os judeus, que o conhecem como Monte do Templo.

Mas um acordo em vigor desde 1967 proíbe que não-muçulmanos orem no templo.

Mesmo assim, nos últimos anos, nacionalistas religiosos israelitas aumentaram as suas visitas ao complexo, o que preocupou os palestinianos.

Alguns judeus chegam a se disfarçar de muçulmanos para orarem ali.

O complexo tem sido palco frequente de confrontos entre fiéis palestinos e forças de segurança israelenses. Em abril, a polícia israelense invadiu a mesquita usando granadas de efeito moral e balas de borracha, após uma disputa sobre atividades religiosas no local.

Em 2021, um ataque israelense desencadeou um conflito em grande escala de 11 dias entre Israel e o Hamas.

Negociação de prisioneiros

Segundo números divulgados pelas forças armadas de Israel, mais de 100 pessoas (civis e militares) foram capturadas por combatentes do Hamas durante o ataque e são mantidas em cativeiro.

Alguns estão vivos e outros já são considerados como mortos, declarou o porta-voz militar de Israel, o tenente-coronel Jonathan Conricus.

Crianças, mulheres, idosos e deficientes estão entre os reféns, acrescentou ele.

Segundo o Hamas, o número de israelenses capturados foi "bem maior" do que as dezenas inicialmente estimadas, e eles são mantidos em locais espalhados por toda a Faixa de Gaza.

No passado, grupos palestinos usaram reféns como moeda de troca para garantir a libertação de militantes detidos por Israel, o que pode explicar uma das motivações do ataque.

Cerca de 4,5 mil palestinos estão detidos em prisões israelenses atualmente – uma questão que é muito sensível para a população da Palestina.

Segundo a agência de notícias Reuters, o governo do Catar estaria tentar negociar a soltura de 36 mulheres e crianças capturadas pelo Hamas em troca de 36 prisioneiros palestinos.


Destruição na cidade de Gaza, na Faixa de Gaza - Foto: reprodução

Propaganda

O Hamas também pode ter usado o ataque como propaganda contra Israel para aumentar a sua popularidade na Palestina e radicalizar mais pessoas na região.

"O Hamas sabe que não pode sobreviver, especialmente diante das condições de ameaça na Faixa de Gaza, sem fazer propaganda de que eles estão lutando para um Estado da Palestina e contra Israel", diz Rashmi Singh, professora de Relações Internacionais da PUC Minas que tem mais de 20 anos de experiência em terrorismo e contra-terrorismo.


"Existe uma raiva e uma frustração muito grandes contra Israel que pode ser transformada em apoio. Qualquer facção ou grupo quer promover isso e até usar violência para esse fim."

 

Neste contexto, o crescimento de outros grupos menos, mas cada vez mais extremistas, podem estar sendo vistos como uma ameaça à autoridade do Hamas em Gaza.

Para Ian Parmeter, do Centro de Estudos Árabes e Islâmicos da Universidade Nacional Australiana, uma dessas organizações é a Jihad Islâmica.


"Um fator importante que motiva o Hamas para a violência é a necessidade de vigiar os seus flancos", afirmou Parmeter em um artigo publicado no site The Conversation.

"Estes grupos lançaram, por vezes, ataques de foguetes de forma independente contra Israel, o que traz retribuição contra todo o território."

 

Arábia Saudita

O Hamas também se opõe fortemente à perspectiva crescente de um acordo de paz histórico entre Israel e a Arábia Saudita.

Os governantes sauditas são historicamente críticos de Israel e defensores dos palestinos. Mas um compromisso com o governo israelense poderia mudar muitas coisas na política regional.

As conversas entre as nações foram privadas até o momento, mas no final de setembro o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, disse acredita que o acordo seria finalizado em breve.

A perspectiva de um entendimento também se torna maior diante dos Acordos de Abraham, por meio dos quais — graças ao apoio dos Estados Unidos — Israel normalizou suas relações com os Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Marrocos e Sudão em 2020.


O príncipe herdeiro saudita, Mohammed bin Salman, e o presidente dos EUA, Joe Biden
- Foto: reprodução


"Se a Arábia Saudita entrar de fato nesse processo, certamente mais países do Golfo farão isso também", diz Rashmi Singh. "E o Hamas sabe que esse período é muito importante em termos de criar tensão e tentar quebrar qualquer possibilidade de paz."


Segundo a especialista, que entrevistou militantes do Hamas durante suas pesquisas, dificilmente um país árabe ficará em silêncio diante de ataques indiscriminados de Israel contra os palestinos.


"O Hamas sabe disso e entrou nessa guerra esperando uma resposta violenta de Israel, para tentar prejudicar o processo de paz", diz.

 

Há também especulações de que o ataque foi orquestrado pelo Irã - o arqui-inimigo de Israel - embora o embaixador do país na ONU tenha negado qualquer envolvimento.

Uma guerra que se estende por gerações

Para Rashmi Singh, ataques como o do último final de semana costumam acontecer de forma cíclica, a cada 15 ou 20 anos.

Isso porque todas as vezes em que há um movimento maior de resistência contra Israel, os militantes envolvidos são mortos ou presos, diz a especialista.

E diante da continuidade do conflito nos últimos 75 anos, novos grupos ou integrantes sempre costumam surgir.


Ataque israelense em Gaza - Foto: reprodução

 

"E uma nova geração de resistência só surge dali uns 15 ou 20 anos novamente, quando podemos ter novos ataques."

 

Segundo a professora da PUC Minas, isso fica evidente nos vídeos do ataque que circularam nas redes sociais. "As pessoas nos vídeos são extremamente jovens. Ou seja, provavelmente não conhecem a vida na Faixa de Gaza sem guerra", afirmou.

Fonte: BBC Brasil


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Entrevista à BBC do Embaixador da Palestina, Husam Zomlot, no Reino Unido





quinta-feira, 7 de setembro de 2023

Ciclone no Sul: o que está por trás das tempestades devastadoras que já mataram 40 pessoas

Cidade de Venâncio Aires, no Rio Grande
do Sul - Imagem: reprodução

Inundações causadas por fortes chuvas e por um ciclone extratropical nos últimos dias deixaram ao menos 39 pessoas mortas no Rio Grande do Sul e uma em Santa Catarina, segundo informações das defesas civis dos Estados.

Cerca de 6.000 pessoas estão desalojadas ou desabrigadas no Rio Grande do Sul.

Há registro de 9 pessoas desaparecidas, todas na cidade de Muçum, na região central do RS. Segundo a Defesa Civil, com a forte chuva, cerca de 85% do município gaúcho ficou inundado, com a água atingindo parte das casas e do comércio. A energia elétrica e o sinal de telefone do município foram cortados.


"Estamos consternados com a letalidade desse evento climático e mobilizados para salvar todos que ainda correm perigo", escreveu Leite nas redes sociais na terça (5/9).

 

O governador declarou estado de calamidade pública no Estado. Cerca de 2.700 pessoas foram resgatadas pelas equipes do governo nos 79 municípios atingidos.

Além de Muçum, cidades da região norte do Rio Grande do Sul também tiveram registros de mortes: Estrela, Lajeado, Mato Castelhano, Passo Fundo e Ibiraiaras. A tormenta também causou uma morte no Estado vizinho de Santa Catarina.

Por conta de alagamentos, dezenas de estradas e rodovias do RS estão bloqueadas. Cinco aeronaves — da Força Aérea, PM e Bombeiros — estão sendo utilizadas para auxiliar nos resgates nas cidades afetadas.

A Defesa Civil do RS está alertando para mais chuvas nesta quinta (7/7), com temporais isolados nas regiões noroeste, centro e sul do Estado.

Também podem ocorrer rajadas de vento intensas, descargas elétricas e eventuais quedas de granizo.


Cidade de Bom Retiro do Sul também ficou debaixo d'água com fortes chuvas
- Foto: reprodução

Fenômenos 'casados'

Mas o que está por trás, afinal, das chuvas devastadoras no Rio Grande do Sul?

Segundo o meteorologista Marcelo Seluchi, coordenador-geral de operações e modelagem do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), o ciclone extratropical não foi a causa das fortes chuvas que atingiram a região, e sim sua consequência.


"A causa da chuva foi uma frente fria estacionária, por isso choveu no fim de semana inteiro. Na segunda-feira, coincidiu uma área de baixa pressão na alta atmosfera. Essa combinação derivou na formação de um ciclone extratropical, que rapidamente se encaminhou para o oceano. Ou seja, ele foi a consequência e não a causa da chuva", explica Seluchi.

 

Ciclones extratropicais como esse se formam praticamente todas as semanas no Oceano Atlântico, segundo meteorologistas.

Eles são centros de baixa pressão atmosférica que se formam fora dos trópicos, em médias e altas latitudes, segundo explica Estael Sias, meteorologista da empresa MetSul Meteorologia.

Comuns na história climática brasileira, esses fenômenos costumam se formar no extremo sul do país, entre o Rio Grande do Sul e Argentina e Uruguai, países vizinhos.


"Ele é formado pelo contraste de massas de ar quente e frio. Parte da sua ação é sugar toda a umidade pra essa região do centro de baixa pressão e jogar para a atmosfera, resfriando e transformando a umidade em nuvens. É nesse processo que o fenômeno espalha chuva e vento", diz Sias.

 

O problema é que, para alguns especialistas, as mudanças climáticas podem estar contribuindo para o surgimento de ciclones extratropicais atípicos, mais intensos, que podem se formar com mais rapidez e causar impacto maior.


"Pela minha experiência de 20 anos de previsão de tempo, acredito que esse cenário das mudanças climáticas de alguma forma tem ajudado ou tem auxiliado na formação desses ciclones com características especiais", diz Sias.

 

Para Marcelo Seluchi, do Cemaden, embora haja elementos para afirmar que sim, não existem dados conclusivos para confirmar com 100% de certeza que as mudanças climáticas estão deixando os ciclones extratropicais mais intensos.


"Para afirmar isso precisaria ter uma análise de dados de ciclones por décadas. E por que não temos esses dados? Porque os ciclones se formam no oceano e precisamos de dados de satélites, e esses dados nós só temos faz uns 20 ou 30 anos. Então, não dá para fazer essa análise. A resposta honesta é 'não sei'", explica.

 

Nesta quarta-feira, o governador Eduardo Leite deve visitar a região acompanhado de ministros do governo Lula.

O próprio presidente se solidarizou com as vítimas da chuva no RS.

"Queria prestar minha solidariedade a população do Rio Grande do Sul, que está vivendo as fortes chuvas. O chefe da Defesa Civil vai ao Estado para ajudar a remediar os problemas causados pelas fortes chuvas. Faremos de tudo para ajudar a população gaúcha a atravessar esse momento", escreveu o petista na rede social X, antigo Twitter.

Fonte: BBC Brasil


sexta-feira, 4 de agosto de 2023

O experimento sobre os efeitos dos alimentos ultraprocessados

Imagem: reprodução

"É um pouco assustador ver esses resultados depois de apenas duas semanas."

Aimee, de 24 anos, passou duas semanas seguindo uma dieta de alimentos ultraprocessados ​​como parte de um estudo realizado por cientistas do King's College, de Londres, para o programa Panorama da BBC.

Nancy, sua irmã gêmea, seguia uma dieta que continha exatamente a mesma quantidade de calorias, nutrientes, gordura, açúcar e fibras. Mas no caso dela comendo apenas alimentos frescos ou pouco processados.

Aimee, que apresentou níveis piores de açúcar no sangue e aumento dos níveis de gordura, engordou quase um quilo. Enquanto isso, sua irmã Nancy perdeu a mesma quantidade de peso.

Esse foi um estudo curto com apenas um par de gêmeas, mas os resultados reforçam temores de cientistas que têm acumulado evidências de que os alimentos ultraprocessados ​​são prejudiciais à saúde de maneiras inesperadas.

"Estamos falando de todos os tipos de câncer, doenças cardíacas, derrame e demência", diz Tim Spector, professor de epidemiologia no King's College e pesquisador do comportamento das doenças, supervisionou o estudo.


Os emulsificantes melhoram a aparência e a textura dos alimentos e ajudam a prolongar
sua vida útil - Foto: reprodução

O termo "alimentos ultraprocessados" começou a ser usado há apenas 15 anos. Esse tipo de alimento representa aproximadamente metade do que se come em países como o Reino Unido.

No Brasil, um estudo feito pelo Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (USP) mostrou que cerca de 20% das calorias consumidas pelos brasileiros vêm de ultraprocessados.

De pães integrais fatiados a pratos prontos e sorvetes, esse é um grupo de alimentos feitos com níveis variados - mas muitas vezes altos - de processamento industrial.

Ingredientes utilizados para o seu preparo como conservantes, adoçantes artificiais e emulsificantes não costumam ser utilizados na culinária caseira.

"Alimentos ultraprocessados ​​são alguns dos mais lucrativos que as empresas podem obter", diz a professora Marion Nestle, especialista em política alimentar e professor de nutrição na Universidade de Nova York.

À medida que nosso consumo aumenta, também aumentam as taxas de diabetes e câncer.

Alguns acadêmicos acreditam que a relação não é acidental.

O programa Panorama acessou novas evidências científicas que mostram a relação entre esses tipos de produtos químicos e doenças como câncer, diabetes e derrame.

A revista científica The Lancet publicou em janeiro um dos estudos mais abrangentes sobre o tema, feito pela Faculdade de Saúde Pública do Imperial College, em Londres.

O estudo, realizado com 200 mil adultos no Reino Unido, determinou que o maior consumo de alimentos ultraprocessados ​​pode estar relacionado ao aumento do risco de desenvolver câncer em geral e, especificamente, câncer de ovário e cérebro.


Os alimentos ultraprocessados mais usados:

- Pães e cereais açucarados embalados;

- Sopas instantâneas e refeições prontas para microondas;

- iogurtes com sabor de fruta;

- Carne reconstituída, como presunto e linguiça;

- Sorvete, batatas fritas e biscoitos;

- Refrigerantes e algumas bebidas alcoólicas, como uísque, gim e rum.


O termo 'alimentos ultraprocessados' começou a ser usado há apenas 15 anos
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A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou no mês passado evitar o consumo prolongado de adoçantes artificiais, devido aos possíveis riscos à saúde.

Provar que certos ingredientes causam doenças pode ser difícil porque há uma série de fatores em nosso estilo de vida que podem gerar problemas de saúde. Por exemplo, falta de exercício, tabagismo ou dietas açucaradas.

As primeiras pesquisas sobre consumo de alimentos ultraprocessados ​​e mortalidade começaram na França, na Universidade de Sorbonne, como parte de um estudo, ainda em andamento, sobre os hábitos alimentares de 174 mil pessoas.

"Temos registros dietéticos de 24 horas durante as quais os participantes nos contam todos os alimentos e bebidas que ingerem", explica a médica Mathilde Touvier, que lidera a pesquisa.

O estudo já publicou algumas conclusões, que mostram que os ultraprocessados podem aumentar as chances de desenvolvimento de câncer.

Emulsificantes, a jóia dos ultraprocessados

Ultimamente, os pesquisadores têm estudado o impacto, na alimentação, de um ingrediente específico, os emulsificantes.

Os emulsificantes são compostos químicos que melhoram a aparência e a textura dos alimentos e contribuem para prolongar sua vida útil - que acaba sendo bem maior que a dos alimentos não ou menos processados.

Esse elemento está em toda parte: na maionese, no chocolate, na pasta de amendoim e nas carnes. Ou seja, é bem provável que você esteja consumindo ou consumiu emulsificantes em algum momento.

O Panorama teve acesso exclusivo aos primeiros resultados da pesquisa de Touvier, que ainda não foram analisados ​​por outros especialistas, etapa crucial para a verificação de estudos científicos.

“Temos observado uma relação clara entre a ingestão de emulsificante e um risco acrescido de câncer em geral, e de câncer da mama em particular, mas também de doenças cardiovasculares”, diz a pesquisadora.

"Isso significa que vimos um padrão entre o consumo de alimentos ultraprocessados ​​e o risco de doenças. Mas mais pesquisas são necessárias."


Os alimentos ultraprocessados ​​representam boa parte do que comemos
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Aspartame, mais doce que o açúcar

Um dos aditivos mais polêmicos de alimentos ultraprocessados ​​é o adoçante aspartame.

Duzentas vezes mais doce que o açúcar, tem sido anunciado como uma ótima alternativa de baixa caloria, transformando bebidas açucaradas, sorvetes e mousses anteriormente não saudáveis ​​em produtos comercializados como "saudáveis".

Durante as últimas duas décadas, surgiram dúvidas sobre seus possíveis efeitos nocivos.

No mês passado, a OMS afirmou que, embora as evidências sejam inconclusivas, teme que o uso prolongado de adoçantes como o aspartame possa aumentar o risco de "diabetes tipo 2, doenças cardíacas e mortalidade".

Em 2013, a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) decidiu que o aspartame era seguro, assim como o Comitê de Toxicidade na Grã-Bretanha, que determinou em 2013 que os resultados "não indicam a necessidade de tomar medidas para proteger a saúde pública".

No entanto, seis anos depois, Erik Millstone, professor da Universidade de Sussex, decidiu revisar as mesmas evidências examinadas pela EFSA, para ver quem havia financiado os diferentes estudos.

Millstone descobriu que 90% dos estudos que defendem o adoçante foram financiados por grandes empresas de química que fabricam e vendem aspartame, e que todos os estudos sugerindo que o aspartame pode ser prejudicial foram financiados por fontes independentes e não comerciais.

A EFSA garante que vai estudar a avaliação em curso da OMS sobre este aditivo.

Fonte: BBC Brasil