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sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

Flávio Dino toma posse como ministro do STF

Foto: reprodução

Dino assume a vaga da minha Rosa Weber, que se aposentou em setembro. Com sua posse, o STF retoma sua composição completa.

Em sessão solene realizada na quinta-feira (22), Flávio Dino tomou posse como ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Participaram da cerimônia, realizada no Plenário da Corte, autoridades da República, convidados e familiares. Com a posse, o Supremo volta a ter a composição completa, com 11 ministros. Flávio Dino foi indicado pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e assume a vaga deixada pela ministra Rosa Weber, que se aposentou em 30 de setembro passado.

Solenidade

A solenidade foi conduzida pelo presidente do Supremo, ministro Luís Roberto Barroso. Seguindo a tradição, após a execução do Hino Nacional pela Fanfarra do Primeiro Regimento da Cavalaria de Guardas, o novo ministro foi conduzido ao Plenário pelo ministro mais antigo, Gilmar Mendes, e pelo mais recente, Cristiano Zanin.

Flávio Dino prestou o compromisso regimental de “cumprir fielmente os deveres do cargo de ministro do Supremo, em conformidade com a Constituição e com as leis da República”, e foi declarado empossado pelo presidente do STF. Em seguida, foi conduzido pelos dois ministros à sua cadeira no Plenário.


Fotos: reprodução / divulgação

Boas-vindas

Em nome do colegiado, o presidente do Supremo deu as boas-vindas ao ministro empossado. “A presença maciça neste Plenário de pessoas de visões políticas as mais diversas apenas documenta como o agora ministro Flávio Dino é uma pessoa respeitada e querida pela comunidade jurídica, política e pela sociedade brasileira”, disse.

Barroso acrescentou que a solenidade também documenta a vitória da democracia, da institucionalidade e da civilidade. “Nós o recebemos aqui com muita alegria. A vida é dura, mas é boa porque nos dá o privilégio de servir ao país sem nenhum outro interesse que não seja de fazê-lo melhor e maior”, declarou.

Terminada a cerimônia, o ministro Flávio Dino recebeu os cumprimentos no Salão Branco. O mais novo membro do Tribunal integrará a Primeira Turma ao lado dos ministros Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Cristiano Zanin e da ministra Cármen Lúcia, e será relator de 340 processos do acervo da ministra Rosa Weber.

Autoridades

Participaram da solenidade os presidentes da República, Luiz Inácio Lula da Silva, do Senado Federal, Rodrigo Pacheco, e da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, e o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin. Também estiveram presentes no Plenário o procurador-geral da República, Paulo Gonet, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Beto Simonetti, o advogado-geral da União, Jorge Messias, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, governadores, ministros de Estado, presidentes e ministros de Tribunais Superiores, ministros aposentados do STF e membros de associações de magistrados.

Biografia

Natural de São Luís (MA), Flávio Dino de Castro e Costa chega ao Supremo aos 55 anos de idade. Graduou-se em Direito pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA) em 1990, de onde também é professor desde 1993. Fez mestrado em Direito na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e foi professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB), entre 2000 e 2002.

Ao longo de sua vida profissional, exerceu cargos nos três Poderes da República, nas esferas estadual e federal. No Judiciário, foi juiz federal por 12 anos, entre 1994 e 2006. No período, representou a categoria presidindo por dois anos a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).

Na política, exerceu mandatos eletivos e cargos de destaque. No Poder Legislativo, elegeu-se deputado federal pelo Maranhão para a legislatura de 2007 a 2011. Em 2014, foi eleito governador de seu estado e tomou posse no ano seguinte. Ele permaneceu no cargo, após reeleição, até 2022. Em seguida, Dino foi eleito para o Senado Federal. Tomou posse, mas logo se licenciou para atender ao convite do presidente Lula para integrar o Poder Executivo, no comando do Ministério da Justiça e Segurança Pública, órgão onde estava quando foi nomeado para o STF.

Entrevista

Foto: reprodução

Em conversa com jornalistas, Flávio Dino disse que, no exercício da magistratura, se assume um compromisso formal de respeito à Constituição e às leis, de isenção, de parcialidade e de contribuir para que o Judiciário funcione bem e distribua justiça. Ele destacou que, às vezes, há uma certa incompreensão ou discordância em relação ao papel do Supremo, mas isso é um fenômeno comum nos países que adotam esse modelo institucional. "O principal é não perdermos a nossa referência, que é o cumprimento da Constituição", afirmou.

Além disso, ele reforçou a importância de se elevar a harmonia entre os Poderes, cada um respeitando a sua função e o seu papel, com muita ponderação, de modo a "ajudar o nosso país no principal, que é fazer com que as políticas públicas evoluam e os direitos cheguem a todos os lares".

O ministro ressaltou ainda que, ao longo de sua trajetória, sempre teve muita clareza de suas posições, mas sempre procurou agregar, dialogar e respeitar as diferenças. "Acho que a posse expressou isso bem, na medida em que tivemos a comunidade jurídica fortemente representada, mas também as outras instituições, outros Poderes e a sociedade civil", apontou.

Missa

À noite, após a cerimônia no STF, o novo ministro foi até a Catedral Metropolitana de Brasília para participar de uma missa de ação de graças pela sua posse, celebrada por Dom Paulo Cezar, cardeal arcebispo de Brasília. Além de Flávio Dino, compareceram ao ato o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, e os ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli e André Mendonça.

Ao final da missa, o ministro Flávio Dino subiu ao altar da Catedral, juntamente com o ministro Barroso e com o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin. O presidente do STF elogiou a trajetória do novo colega de Corte. “Flávio Dino é sempre simples, sempre carismático, um bom cidadão, bom caráter e bom amigo. Um juiz como ele, íntegro, vocacionado e trabalhador é uma benção para a democracia. O universo protege as pessoas que se movem com bons propósitos, seja muito bem-vindo”.

Emocionado, Flávio Dino agradeceu a presença de amigos, autoridades e familiares, explicando o porquê da escolha pela missa na Catedral. “Há exatos 30 anos, vim para Brasília fazer uma prova de concurso para juiz federal. Era garoto, fiquei hospedado em um hotel na Asa Norte e, de lá, durante três dias da reta final de preparação, volta e meia eu via essa Catedral pela sacada. Sempre pedi a Deus para me guiar e, ao longo desses 30 anos, percorri caminhos com os quais nunca sonhei, mas com Deus à frente." Dino acrescentou que “se entregará para a missão de ser ministro do Supremo com valores, profissionalismo, olhar técnico, mas acima de tudo, norteado por valores e com propósito”.

Fonte: STF/SP/AD/VP


quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Imprensa responde por declarações de entrevistados, define STF

Imagem: reprodução
O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, na quarta-feira (29), que a responsabilidade por declarações caluniosas ou falsas de entrevistados em matérias jornalísticas se aplicam também aos veículos de comunicação que publicaram a matéria. Apesar de já existir condenação anterior nesse mesmo sentido, ela não possuía repercussão geral até então.

O voto vencedor, do ministro Alexandre de Moraes, prevê que a responsabilidade dos veículos será aplicada em ações por danos morais quando houver indício concreto de que a afirmação do entrevistado é falsa, bem como quando não for plenamente cumprido o “dever de cuidado” do veículo de comunicação no na verificação dos fatos relatados pelo entrevistado.

De acordo com o ministro, a proteção constitucional à liberdade de expressão vem acompanhada da responsabilidade do conteúdo publicado, prevendo a possibilidade de responsabilização civil em casos de produção de conteúdo nocivo e/ou comprovadamente calunioso, injurioso ou mentiroso.

O caso que deu origem ao processo foi uma matéria do Diário de Pernambuco de 1995, quando o delegado pernambucano Wandenkolk Wanderley acusou, em entrevista, o ex-deputado Ricardo Zarattini Filho de ter participado de um atentado terrorista em 1968. O falecido parlamentar venceu a disputa judicial no STF, afirmando que o jornal também havia cometido crime contra sua honra.

Antes mesmo do julgamento da repercussão geral, diversas organizações de defesa do jornalismo já haviam se posicionado de forma contrária ao entendimento de que o veículo seja co-responsável. Sete associações, que incluem a Federação Nacional dos Jornalistas, Associação de Jornalismo Digital e o Instituto Vladimir Herzog publicaram um manifesto argumentando contra a decisão.


“Imputar uma responsabilidade que não cabe aos veículos pode forçá-los, por exemplo, a ter que fazer um controle prévio das respostas de seus entrevistados ou então a deixar de entrevistar, principalmente ao vivo, muitas pessoas, sob risco de terem que enfrentar posteriormente ações judiciais que podem esgotar os recursos do meio de comunicação ou do próprio jornalista processado”, alertaram as entidades.

 

Os signatários também chamaram a atenção para o contexto do país durante o julgamento, com aumento gradual dos casos de assédio judicial contra jornalistas. “Uma tese firmada pela mais alta corte do país que abra margem para pedidos descabidos de responsabilização dos veículos por declarações de entrevistados pode ser um perigoso combustível para esta perseguição pelas vias judiciais”, argumentam.

Fonte: congressoemfoco



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quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Sucessor da ministra Rosa Weber herdará acervo de 344 ações

Imagem: reprodução

O futuro ministro do STF ficará responsável por processos envolvendo o combate à pandemia da covid-19, indulto natalino e penas por aborto.

O próximo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), que ocupará a vaga da ministra Rosa Weber (aposentada), herdará 344 ações. O dado consta do acervo da ministra no site do STF. Entre as mais importantes estão pedido de investigação contra autoridades por sua atuação na pandemia da covid-19 e processo com repercussão geral sobre o indulto natalino.

Covid-19

Na Petição (PET) 10064, a CPI da Pandemia pediu que se investigue o então presidente da República, Jair Bolsonaro, e outros agentes públicos por incitarem a população a adotar comportamentos supostamente inadequados para o combate à covid-19.

Indulto natalino

O futuro ministro do STF irá herdar, ainda, o Recurso Extraordinário (RE) 1450100, com repercussão geral (Tema 1.267), em que o STF decidirá se é constitucional o indulto natalino concedido pelo presidente da República a pessoas condenadas por crime com pena privativa de liberdade máxima não superior a cinco anos.

Assédio contra imprensa

Por sua vez, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7055 discute a existência de assédio judicial contra a imprensa em razão da pulverização da distribuição de diversas ações de reparação de danos contra um mesmo jornalista.

Aborto

O sucessor da ministra Rosa Weber será relator da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1087, em que o Partido Liberal (PL) pede que a punição para abortos provocados por terceiros seja equiparada à do crime de homicídio qualificado.

Por sua vez, o futuro ministro não votará na ADPF 442, que trata da descriminalização da interrupção voluntária da gravidez, da qual a ministra era relatora. Isso porque ela já votou na sessão virtual de julgamento, suspenso por pedido de destaque do ministro Luís Roberto Barroso.

Indicação

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva indicou o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, para a vaga da ministra Rosa Weber, mas seu nome ainda precisa ser aprovado pelo Senado.

Fonte: STF/RP/RM


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sexta-feira, 29 de setembro de 2023

Barroso assume Presidência do STF com defesa da conciliação nacional

Foto: reprodução
“A democracia venceu e precisamos trabalhar pela pacificação do país”, afirmou o novo presidente da Corte.

O ministro Luís Roberto Barroso tomou posse, na quinta-feira (28), na Presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com uma defesa da criação de consensos visando ao desenvolvimento e à consolidação da democracia brasileira. “A democracia venceu e precisamos trabalhar pela pacificação do país. Acabar com os antagonismos artificialmente criados para nos dividir”, afirmou.

Para o novo presidente da Corte, é preciso que o país se aglutine em torno de denominadores comuns, “de uma agenda para o Brasil”. Entre os temas que devem ser objeto de consenso estão o combate à pobreza, o desenvolvimento econômico e social sustentável, a prioridade para a educação básica, a valorização da livre-iniciativa e do trabalho formal e a liderança global em matéria ambiental.

Nesse sentido, três elementos são essenciais: integridade, civilidade e confiança. “Todos eles vêm antes da ideologia, antes das escolhas políticas pessoais”, ressaltou.

Eixos da gestão

Barroso anunciou que sua gestão se dará em torno de três eixos: o conteúdo, que visa aumentar a eficiência da justiça, avançar a pauta dos direitos fundamentais e contribuir para o desenvolvimento econômico, social e sustentável do Brasil; a comunicação, que envolve melhorar a interlocução com a sociedade e explicar didaticamente as decisões, “desfazendo incompreensões e mal-entendidos”; e o relacionamento, que implica a abertura para a sociedade. “A gente na vida deve ser janela e não espelho, ter a capacidade de olhar para o outro, e não apenas para si mesmo”.

Segurança

Outro ponto que deve ser enfatizado na gestão do novo presidente é a segurança - jurídica, democrática e humana. A primeira deve proporcionar um bom ambiente para o desenvolvimento econômico, “sem surpresas”. A segurança democrática diz respeito a eleições limpas, liberdades públicas, independência entre os Poderes e respeito às instituições. Por sua vez, “como princípio e fim”, a segurança humana inclui o combate à pobreza, às desigualdades e à criminalidade, “com segurança pública e valorização das polícias, treinadas numa imprescindível cultura de respeito à cidadania e aos direitos humanos”.

O presidente do STF disse que pretende ouvir a todos - trabalhadores e empresários, comunidades indígenas e agricultores, produtores rurais e ambientalistas, gente da cidade e do interior. “E, também, conservadores, liberais e progressistas”, destacou. “A vida na democracia é a convivência civilizada dos que pensam diferente”.

Gratidão

A primeira parte do discurso foi dedicada “ao reconhecimento às pessoas que pavimentaram o meu caminho até aqui” - sua família, a “legião de amigos”, servidores e assessores. Barroso também prestou reconhecimento a professores, desde o Colégio de Vassouras às Universidades de Yale e de Harvard.

Ao homenagear a ministra Rosa Weber, que deixa a Presidência do STF, o ministro lembrou sua trajetória da magistratura e sua atuação “em um dos momentos mais dramáticos de nossa história”, liderando a reconstrução do Plenário após os ataques de 8 de janeiro. “Em nome da nação agradecida, em nome dos que sabem distinguir as grandes figuras da história deste Tribunal, eu a reverencio pelos imensos serviços prestados ao Brasil”, afirmou.

Desenho institucional

Ao falar do papel do STF, o novo presidente ressaltou que a Constituição da República, além de demarcar a competência dos Poderes e definir direitos e garantias dos cidadãos, contempla os sistemas econômico, tributário, previdenciário, de educação, de preservação ambiental, da cultura, dos meios de comunicação, da proteção às comunidades indígenas, da família, da criança, do adolescente, do idoso, em meio a muitos outros temas. “Incluir uma matéria na Constituição é, em larga medida, retirá-la da política e trazê-la para o direito. Essa é a causa da judicialização ampla da vida no Brasil. Não se trata de ativismo, mas de desenho institucional”, assinalou.

Contudo, Barroso defendeu que o Tribunal aja com autocontenção e em diálogo com os outros Poderes e a sociedade. “Numa democracia não há Poderes hegemônicos”, ressaltou. “Garantindo a independência de cada um, conviveremos em harmonia, parceiros institucionais pelo bem do Brasil”.

União

A união da Corte também foi ressaltada pelo ministro. “Estivemos mais unidos do que nunca na proteção da sociedade brasileira na pandemia. E, também, estamos sempre juntos, em sólida unidade, na defesa da democracia”.

Barroso lembrou que, recentemente, em todo o mundo, a democracia constitucional viveu momentos de sobressalto, com ataques às instituições e perda de credibilidade. “Por aqui, as instituições venceram, tendo ao seu lado a presença indispensável da sociedade civil, da Imprensa e do Congresso Nacional”.

Apesar dessa vitória, ele ponderou que as democracias contemporâneas ainda têm desafios a equacionar e vencer: a inclusão social, a luta contra as desigualdades e o aprimoramento da representação política.

Direção certa

Barroso destacou o papel do STF e do Poder Judiciário na proteção dos direitos fundamentais. “Nessa matéria, temos procurado empurrar a história na direção certa”, afirmou, lembrando o reconhecimento dos povos indígenas, das pessoas com deficiência, a preservação do meio ambiente, a ascensão das mulheres, a luta da população negra e o reconhecimento de direitos da comunidade LGBTQIA+.


“Há quem pense que a defesa dos direitos humanos são causas progressistas. Não são. Essas são as causas da humanidade, da dignidade humana, do respeito e consideração por todas as pessoas”.

 

Judiciário

Ao falar, também, como presidente do CNJ, Barroso ressaltou a independência e a produtividade do Judiciário brasileiro e destacou dois pontos que merecerão sua atenção: aumentar a participação de mulheres nos tribunais e ampliar a diversidade racial. “Além disso, com inovações tecnológicas e Inteligência Artificial, vamos procurar aumentar a eficiência e a celeridade da tramitação processual no Brasil”, afirmou.

Valores

Ao encerrar seu pronunciamento, Barroso reafirmou os valores que já havia manifestado na sua posse como ministro do STF, há dez anos. “Creio no bem, na justiça e na tolerância como valores filosóficos essenciais. Creio na educação, na igualdade, no trabalho e na livre iniciativa como valores políticos fundamentais. E no constitucionalismo democrático como forma institucional ideal”, pontuou. “Assumo a Presidência do Supremo e do CNJ sem esquecer que sou, antes de tudo, um servidor público. Um servidor da Constituição. Que eu possa ser abençoado para cumprir bem essa missão”, concluiu.

Leia a íntegra do discurso de posse do ministro Luís Roberto Barroso.

Confira a galeria de fotos da cerimônia de posse.

Fonte: STF/CF//VP


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sexta-feira, 22 de setembro de 2023

STF derruba tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas

Foto: reprodução

O Plenário decidiu que a demarcação independe do fato de que as comunidades estivessem ocupando ou disputando a área na data de promulgação da Constituição Federal.

O Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou, na quinta-feira (21), a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas. Por 9 votos a 2, o Plenário decidiu que a data da promulgação da Constituição Federal (5/10/1988) não pode ser utilizada para definir a ocupação tradicional da terra por essas comunidades. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1017365, com repercussão geral (Tema 1.031). Na próxima quarta-feira (27), o Plenário fixará a tese que servirá de parâmetro para a resolução de, pelo menos, 226 casos semelhantes que estão suspensos à espera dessa definição.

O julgamento começou em agosto de 2021 e é um dos maiores da história do STF. Ele se estendeu por 11 sessões, as seis primeiras por videoconferência, e duas foram dedicadas exclusivamente a 38 manifestações das partes do processo, de terceiros interessados, do advogado-geral da União e do procurador-geral da República.

A sessão foi acompanhada por representantes de povos indígenas no Plenário do STF e em uma tenda montada no estacionamento ao lado do Tribunal. Após o voto do ministro Luiz Fux, o sexto contra a tese do marco temporal, houve cantos e danças em comemoração à maioria que havia sido formada.

Ancestralidade

Primeiro a votar nesta tarde, o ministro Luiz Fux argumentou que, quando fala em terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas, a Constituição se refere às áreas ocupadas e às que ainda têm vinculação com a ancestralidade e a tradição desse povos. Segundo ele, ainda que não estejam demarcadas, elas devem ser objeto da proteção constitucional.

Direitos fundamentais

Ao apresentar seu voto, a ministra Cármen Lúcia ressaltou que a Constituição Federal, ao traçar o estatuto dos povos indígenas, assegurou-lhes expressamente a manutenção de sua organização social, seus costumes, línguas, crenças e tradições e os direitos sobre as terras tradicionalmente ocupadas. Para a ministra, a posse da terra não pode ser desmembrada dos outros direitos fundamentais garantidos a eles. Ela salientou que o julgamento trata da dignidade étnica de um povo que foi oprimido e dizimado por cinco séculos.

Critérios objetivos

O ministro Gilmar Mendes também afastou, em seu voto, a tese do marco temporal, desde que assegurada a indenização aos ocupantes de boa-fé, inclusive quanto à terra nua. Segundo ele, o conceito de terras tradicionalmente ocupadas por indígenas, que baliza as demarcações, deve observar objetivamente os critérios definidos na Constituição e atender a todos.

Posse tradicional

Última a votar, a presidente do STF, ministra Rosa Weber, afirmou que a posse de terras pelos povos indígenas está relacionada com a tradição, e não com a posse imemorial. Ela explicou que os direitos desses povos sobre as terras por eles ocupadas são direitos fundamentais que não podem ser mitigados.

Destacou, ainda, que a posse tradicional não se esgota na posse atual ou na posse física das terras. Ela lembrou que a legislação brasileira tradicionalmente trata de posse indígena sob a ótica do indigenato, ou seja, de que esse direito é anterior à criação do Estado brasileiro.

O julgamento foi acompanhado por representantes de povos indígenas no Plenário do STF e em uma tenda montada ao lado do Tribunal. Após o voto do ministro Luiz Fux, o sexto contra a tese do marco temporal, houve cantos e danças em comemoração à maioria que havia sido formada.

Caso concreto

O caso que originou o recurso está relacionado a um pedido do Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) de reintegração de posse de uma área localizada em parte da Reserva Biológica do Sassafrás (SC), declarada pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) como de tradicional ocupação indígena. No recurso, a Funai contesta decisão do Tribunal Regional da 4ª Região (TRF-4), para quem não foi demonstrado que as terras seriam tradicionalmente ocupadas pelos indígenas e confirmou a sentença em que fora determinada a reintegração de posse.

Na resolução do caso concreto, prevaleceu o entendimento do ministro Edson Fachin (relator), que deu provimento ao recurso. Com isso, foi anulada a decisão do TRF-4, que não considerou a preexistência do direito originário sobre as terras e deu validade ao título de domínio, sem proporcionar à comunidade indígena e à Funai a demonstração da melhor posse.

Fonte: STF/PR/CR//CF


quarta-feira, 16 de agosto de 2023

Ministro André Mendonça poderá votar em julgamento sobre marco temporal de terras indígenas

Imagem: reprodução

A atuação anterior do ministro como advogado-geral da União não impede que ele vote sobre o tema de repercussão geral.

Por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o ministro André Mendonça pode participar do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1017365, com repercussão geral, que discute o chamado marco temporal para a demarcação de terras indígenas. O ministro terá direito a voto em relação à matéria de repercussão geral, mas não poderá se manifestar sobre o caso concreto.

Questão de ordem

Em junho, Mendonça havia pedido vista do processo e, em seguida, apresentou questão de ordem para saber se poderia participar do julgamento, por ter atuado no caso como advogado-geral da União.

Na sessão virtual encerrada em 14/8, o ministro votou pela possibilidade de sua participação porque, como advogado-geral da União, havia se manifestado apenas por meio de pedidos específicos, sem se posicionar sobre o mérito da questão.

Controle de constitucionalidade

O ministro observou que a compreensão do Tribunal é de que o impedimento e a suspeição não se aplicam, como regra, ao julgamento de ações de controle concentrado (ADIs, ADCs, ADPFs e ADOs), pois são institutos são típicos de processos em que há defesa de interesses e posições, enquanto essas ações discutem a validade de normas jurídicas.

A seu ver, esse entendimento deve ser aplicado a todas as hipóteses de controle de constitucionalidade, independentemente de a questão ter chegado ao Supremo incidentalmente, como alegação num processo entre partes (como no caso dos Recursos Extraordinários), ou por meio de ações concentradas.

Seguindo o voto do ministro, o Plenário definiu que, nos recursos extraordinários com repercussão geral, o impedimento se aplica ao processo subjetivo e à conclusão de julgamento aplicada às partes, mas não ao tema de fundo, pois nessa fase não se discutem situações individuais nem interesses concretos. "Ou seja, deve-se participar da integralidade do julgamento concernente ao tema de repercussão geral (incluindo voto, debates e sessões correspondentes), apenas deixando de apresentar voto sobre a causa-piloto (caso concreto)", concluiu Mendonça.

Marco temporal

Marco temporal é uma tese jurídica segundo a qual os povos indígenas têm direito apenas às terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição.

O caso concreto que originou o recurso diz respeito à reintegração de posse, requerida pelo Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA), de uma área localizada em parte da Reserva Biológica do Sassafrás (SC), declarada pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) como de tradicional ocupação indígena. O recurso voltará ao Plenário com o voto-vista do ministro, em data ainda a ser definida.

Fonte: STF/AR/AD//CF


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7/6/2023 - Ministro Alexandre de Moraes vota contra marco temporal para demarcação de terras indígenas



quinta-feira, 3 de agosto de 2023

Ministro Alexandre de Moraes propõe critério para diferenciar usuários de traficantes de maconha

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Segundo ele, flagrantes são tratados de forma diferente dependendo de etnia, renda ou local da prisão.

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, na quarta-feira (2), o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 635659, com repercussão geral (Tema 506), sobre a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio. Único a votar nesta tarde, o ministro Alexandre de Moraes propôs a fixação de um critério nacional, exclusivamente em relação à maconha, para diferenciar usuários de traficantes.

Tratamento mais brando

O ministro afirmou que o artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006) deixou de punir com prisão o porte de drogas “para consumo próprio”, mas não define critérios objetivos para diferenciar consumo próprio de tráfico. Essa definição fica a cargo do sistema de persecução penal (Polícia, Ministério Público e Judiciário), que interpreta a norma de formas diversas.

Distorção

Dessa forma, o porte de pequena quantidade de entorpecentes passou, em muitos casos, a ser qualificado como tráfico, tornando a punição mais dura e aumentando significativamente o número de presos por tráfico. Além disso, pessoas presas com a mesma quantidade de droga e em circunstâncias semelhantes podem ser consideradas usuárias ou traficantes, dependendo da etnia, de nível de instrução, renda, idade ou de onde ocorrer o fato.

Para o ministro, essa distorção decorre do excesso de discricionariedade para diferenciar usuários de traficantes. Em respeito ao princípio da isonomia, ele destacou a necessidade de que os flagrantes de drogas sejam tratados de forma idêntica em todo o país. “O STF tem o dever de exigir que a lei seja aplicada identicamente a todos, independentemente de etnia, classe social, renda ou idade”, afirmou.

Parâmetros

Ele propôs que sejam presumidas como usuárias as pessoas flagradas com 25g a 60g de maconha ou que tenham seis plantas fêmeas. Ele chegou a esses números a partir de levantamento que realizou sobre o volume médio de apreensão de drogas no Estado de São Paulo, entre 2006 e 2017. O estudo foi realizado em conjunto com a Associação Brasileira de Jurimetria e abrangeu mais de 1,2 milhão de ocorrências com drogas.

Elementos caracterizadores

De acordo com o ministro, a autoridade policial não ficaria impedida de realizar a prisão em flagrante por tráfico quando a quantidade de maconha for inferior ao limite. Entretanto, é necessário comprovar a presença de outros critérios caracterizadores do tráfico, como a forma de acondicionamento da droga, a diversidade de entorpecentes e a apreensão de instrumentos e celulares com contatos, por exemplo. Da mesma forma, nas prisões em flagrante por quantidades superiores, o juiz, na audiência de custódia, deverá dar ao preso a possibilidade de comprovar que é usuário.

Solução consensual

Após o voto, o relator do RE, ministro Gilmar Mendes, pediu o adiamento do julgamento para construir uma solução consensual, diante dos novos argumentos e da mudança das circunstâncias desde 2015, quando apresentou seu voto, como a implementação das audiências de custódia. Inicialmente ele votou para descriminalizar todas as drogas para uso próprio.

Nos outros dois votos apresentados anteriormente, o ministro Luís Roberto Barroso propôs a descriminalização, exclusivamente em relação à maconha, do porte de até 25 gramas ou a plantação de até seis plantas fêmeas para diferenciar consumo de tráfico, até que o Congresso edite lei sobre o tema. Já o ministro Edson Fachin considera a regra inconstitucional exclusivamente em relação à maconha, mas entende que os parâmetros para diferenciar traficantes de usuários devem ser fixados pelo Congresso Nacional.

Fonte: STF/PR/CR//CF


Leia mais:

10/9/2015 - Suspenso julgamento sobre porte de drogas para consumo próprio


terça-feira, 25 de julho de 2023

Supremo suspende pagamento de parcela da dívida pública do Maranhão no valor de R$ 276 milhões

Ministro Alexandre de Moraes aplicou entendimento da Corte no sentido de suspender atos que comprometam a continuidade de políticas públicas ou serviços essenciais à coletividade.

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a suspensão do pagamento da parcela, no valor de quase R$ 276 milhões, relativa a empréstimo contraído pelo Estado do Maranhão junto ao Bank of America. O ministro deferiu medida liminar solicitada na Ação Cível Originária (ACO) 3649 pelo ente federado.

O estado alegou que houve uma queda nas receitas estaduais em razão das alterações impostas pelas Leis Complementares 192/2022 e 194/2022 às alíquotas do ICMS, sua principal fonte de recursos próprios. Ressaltou que a União, os estados e o Distrito Federal firmaram acordo homologado pelo STF, no qual demonstraram que essa limitação de alíquotas de ICMS impactou seus orçamentos e sua gestão fiscal, reduzindo a expectativa de receitas e a capacidade de arrecadação.

Além da suspensão temporária do pagamento da parcela com vencimento neste mês, o governo estadual pediu que a União se abstenha de bloquear receitas próprias ou decorrentes de repartição constitucional obrigatória pertencentes ao Estado do Maranhão, afastando assim a execução de contragarantia relativa ao aval concedido ao contrato de empréstimo.

Desequilíbrio financeiro

Segundo o ministro Alexandre de Moraes, a Corte tem concedido o pedido de suspensão dos efeitos de atos praticados pela União que possam comprometer, de modo grave ou irreversível, a continuidade da execução de políticas públicas ou a prestação de serviços essenciais à coletividade.

No caso dos autos, o relator entendeu que a restrição à tributação estadual, ocasionada pelas LCs 192/2022 e 194/2022, acarretou um profundo desequilíbrio nas contas dos entes da federação, tornando excessivamente oneroso, ao menos nesse estágio, o cumprimento dos contratos de financiamento da dívida pública. Por essa razão, a seu ver, é justificável a intervenção judicial até que se concretizem os mecanismos que restabeleçam o equilíbrio da base contratual.

Ao atender o pedido do estado, o relator também vedou à União a execução de contragarantias, caso venha a pagar as prestações voluntariamente, enquanto vigorar a liminar.

Leia a íntegra da decisão


Fonte: STF/EC/AD//VP


quarta-feira, 19 de julho de 2023

Agentes públicos municipais e parentes não podem celebrar contratos administrativos

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O STF afastou apenas a vedação em relação a parentes de servidores que não ocupam cargos em comissão.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou entendimento de que lei municipal pode proibir a administração pública de realizar contratos com parentes até o terceiro grau de agentes públicos eletivos ou em cargos de comissão. A decisão foi no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 910552, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.001), na sessão virtual encerrada em 30/6.

No caso dos autos, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) havia julgado inconstitucional dispositivo da Lei Orgânica do Município de Francisco de Sá que proíbe parentes até o terceiro grau do prefeito, do vice-prefeito, dos vereadores e dos servidores locais de contratarem com o município. Segundo o TJ-MG, essa vedação não existe na Constituição Federal nem na estadual.

No recurso apresentado ao STF, o Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MP-MG) sustentou que, ao estabelecer a vedação, o legislador municipal apenas exerceu sua autonomia constitucional, dando concretude aos princípios da moralidade, da impessoalidade e da isonomia.

Proporcionalidade

No voto que prevaleceu no julgamento, o ministro Luís Roberto Barroso observou que o Supremo já afirmou a constitucionalidade de leis municipais que vedam a contratação com a administração municipal de cônjuges, companheiros e parentes de agentes eletivos e de servidores e empregados públicos municipais que ocupem cargo em comissão ou função de confiança.

A seu ver, o dispositivo é desproporcional apenas no ponto em que alcança pessoas ligadas por matrimônio ou parentesco a servidores que não ocupam cargo em comissão ou função de confiança. Nesses casos, não é possível presumir risco de influência sobre a conduta dos agentes responsáveis pela licitação ou pela execução do contrato. Nesse sentido, Barroso votou, no caso concreto, para que o artigo 96 da Lei Orgânica do Município de Francisco Sá seja interpretado de modo a excluir a proibição de contratação dessas pessoas ligadas.

Princípios da administração

Ficaram vencidos a ministra Cármen Lúcia (relatora) e o ministro Edson Fachin, que votaram pelo provimento do recurso. Para a relatora, o dispositivo visa dar eficácia aos princípios da impessoalidade, da igualdade e da moralidade administrativa. Também vencido, o ministro Alexandre de Moraes afastava a limitação em relação aos vereadores e parentes quando a contratação obedecer cláusulas uniformes, uma vez que essa exceção, prevista no artigo 54 da Constituição, se estende a eles.

Tese

A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: “É constitucional o ato normativo municipal, editado no exercício de competência legislativa suplementar, que proíba a participação em licitação ou a contratação: (a) de agentes eletivos; (b) de ocupantes de cargo em comissão ou função de confiança; (c) de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, de qualquer destes; e (d) dos demais servidores públicos municipais”.

Fonte: STF/SP/AD//CF


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quinta-feira, 8 de junho de 2023

Ministro Alexandre de Moraes vota contra marco temporal para demarcação de terras indígenas

Foto: reprodução

Julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro André Mendonça.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal prosseguiu, na quarta-feira, o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1017365, que discute o chamado marco temporal para a demarcação de terras indígenas. Após o voto do ministro Alexandre de Moraes, o ministro André Mendonça pediu vista.

Único a votar na sessão de quarta-feira (7), o ministro Alexandre considera que a data da promulgação da Constituição Federal (5/10/1988) não pode ser utilizada como ponto de definição da ocupação tradicional da terra por comunidades indígenas. Até o momento há dois votos nesse sentido e um contra. Em setembro de 2021, o relator, ministro Edson Fachin, afirmou que o direito à terra pelas comunidades indígenas deve prevalecer, ainda que elas não estivessem no local na data de promulgação da Constituição. Em sentido contrário, o ministro Nunes Marques entendeu que essa data deve prevalecer.

Marco temporal

Marco temporal é uma tese jurídica segundo a qual os povos indígenas têm direito apenas às terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição.

Direito originário

O caso concreto que originou o recurso diz respeito à reintegração de posse, requerida pelo Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA), de uma área localizada em parte da Reserva Biológica do Sassafrás (SC), declarada pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) como de tradicional ocupação indígena. No recurso, a Funai contesta decisão do Tribunal Regional da 4ª Região (TRF-4), para quem não foi demonstrado que as terras seriam tradicionalmente ocupadas pelos indígenas e confirmou a sentença em que fora determinada a reintegração de posse.

Reparação

O ministro Alexandre de Moraes defendeu que, prevalecendo a hipótese do marco temporal, a demarcação de terras de uma comunidade retirada à força do local antes da promulgação da Constituição seria impossível. Segundo ele, não há um modelo global de reparação aos povos originários pela ocupação de suas terras pelas nações colonizadoras, e essa é uma das questões históricas mais difíceis a serem enfrentadas no Brasil e no resto do mundo. “É uma questão que vem afetando a paz social por séculos sem que haja, até hoje, um bom e efetivo modelo a ser seguido. Nenhum país do mundo conseguiu resolver de forma plena e satisfatória esse problema”, disse.

Conciliação

Em nome da segurança jurídica, o ministro apontou a necessidade de conciliar os direitos dos indígenas com os de produtores rurais que adquiriram as terras regularmente e de boa-fé. Ele propôs que, se for reconhecida a ocupação tradicional sobre terras que tenham uma cadeia de domínio legítima, os proprietários não podem ser prejudicados. Nesses casos, a União deve ser responsabilizada e pagar indenização sobre o valor total dos imóveis, e não apenas sobre as benfeitorias.

Ocupação consolidada

Para o ministro, nos casos em que houver uma ocupação consolidada afetando uma terra tradicional indígena (uma cidade, por exemplo), a desocupação, além de provocar insegurança jurídica, não seria de interesse público. Nesses casos, ele propõe que, sendo realisticamente impossível readquirir as terras, a União faça a compensação com terras equivalentes, com a expressa concordância da comunidade.

Vista

Após o voto do ministro Alexandre de Moraes, o ministro André Mendonça afirmou que precisa refletir melhor sobre a questão e pediu vista. Ele disse que devolverá o processo em prazo hábil para que a ministra Rosa Weber possa proferir seu voto, tendo em vista que ela se aposenta até 2 de outubro. Segundo o Regimento Interno do STF, em pedidos de vista, os processos ficam automaticamente liberados para voltar a julgamento após 90 dias.

Indígenas no Plenário

Cerca de 50 indígenas acompanharam o julgamento no Plenário do STF. Lideranças vieram do Nordeste, do Sudeste, do Sul e do Norte do país, entre eles representantes da Terra Indígena Raposa Serra do Sol (RR). Também estavam presentes o cacique Raoni Metuktire e a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara.

Entidades relacionadas à causa também enviaram representantes ao Plenário, entre elas o Instituto Socioambiental (ISA), a secretaria dos Povos Indígenas do Governo do Estado do Ceará, e a Área de abrangência da Articulação dos Povos e Organizações do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME).

Fonte: STF/EC/CR//CF


terça-feira, 9 de maio de 2023

Após Congresso adiar análise de PL das fake news, STF pode julgar regras do marco civil da internet

Foto: reprodução

Decisão é do ministro Dias Toffoli, relator de recurso apresentado pelo Facebook.

Dias depois do adiamento da discussão pelo Congresso Nacional do PL das Fake News, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), liberou para julgamento o recurso que discute as regras do Marco Civil da Internet. A lei, sancionada em 2014, determina em seu artigo 19 que "o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros" se não cumprir determinação judicial para a retirada de conteúdo.

A liberação para a pauta do plenário foi feita na quinta-feira (4), por Toffoli. Na terça-feira (2), o GLOBO mostrou que ministros do Supremo avaliavam a possibilidade de a Corte se debruçar sobre o tema diante de uma demora do parlamento em analisar o texto que institui medidas para o combate à desinformação nas redes sociais e regras para a atividade das empresas de tecnologia no país. A inclusão na pauta de julgamentos, agora, caberá à presidente do tribunal, ministra Rosa Weber.

O recurso do qual Toffoli é relator foi apresentado ao STF pelo Facebook e discute a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que exige prévia e específica ordem judicial de exclusão de conteúdo para a responsabilização civil de provedor de internet, websites e gestores de aplicativos de redes sociais por danos decorrentes de atos ilícitos praticados por terceiros.

No Recurso Extraordinário ao STF, o Facebook sustenta a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que teria como princípios norteadores a vedação à censura, a liberdade de expressão e a reserva de jurisdição. De acordo com a empresa, a liberdade de comunicação envolve não apenas direitos individuais, mas também um direito de dimensão coletiva, no sentido de permitir que os indivíduos e a comunidade sejam informados sem censura.

A big tech argumenta que, admitir a exclusão de conteúdo de terceiros sem prévia análise pela autoridade judiciária acabaria permitindo que empresas privadas “passem a controlar, censurar e restringir a comunicação de milhares de pessoas, em flagrante contrariedade àquilo que estabeleceram a Constituição Federal e o Marco Civil da Internet”.

Definição necessária

A necessidade de uma definição por parte da Câmara dos Deputados para tornar crime a divulgação de informações falsas na internet é vista como urgente por uma ala de ministros ouvida pelo GLOBO.

Publicamente, os posicionamentos dos magistrados deixam transparecer esse apoio. Na decisão em que determinou a remoção de ataques ao chamado PL das Fake News e a realização de depoimentos de presidentes no Brasil de Google, Meta e Spotify, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que é "urgente, razoável e necessária" uma definição dos termos da responsabilidade solidária civil das empresas pelo conteúdo publicado por elas, e acrescenta que essa definição pode ser "legislativa e/ou judicial".

Segundo Moraes, a definição da responsabilidade sobre o conteúdo publicado pode ocorrer tanto pelo Legislativo quanto pelo Judiciário.

Uma regulação pelo Legislativo também é enfatizada pelo ministro Luís Roberto Barroso. Em entrevista concedida nesta terça-feira, à TV Migalhas, o magistrado afirmou que “a regulação é inevitável” e disse que uma eventual criminalização das fake news "não é censura".

— A regulação é absolutamente inevitável, o que precisamos acertar é a dose do remédio — disse.

Por Mariana Muniz


Fonte: OGLOBO


sexta-feira, 28 de abril de 2023

Como se constrói um ministro do STF

Imagem: reprodução

De peregrinações por gabinetes a assessoria de imprensa, conheça regras do jogo para obter uma vaga ao Supremo.

O período de seca em Brasília começava a dar as caras quando a então presidente da República Dilma Rousseff fez um anúncio tão aguardado pelos meios jurídico e político. O nome do advogado constitucionalista Luís Roberto Barroso foi indicado pela petista ao Supremo Tribunal Federal (STF) em 23 de maio de 2013, seis meses após a abertura da vaga com a aposentadoria de Carlos Ayres Brito. Apesar de seu nome estar entre os cotados para vaga publicamente, Barroso só soube da indicação uma semana antes, durante reunião que, a pedido da hoje chefe do banco do Brics, teve a pauta omitida aos jornalistas. 

Perguntei para ela: ‘Se a imprensa me perguntar…’, eu ainda brinquei: ‘Eu sou kantiano, eu não gosto de mentir, se a imprensa perguntar se eu estive aqui, o que a senhora gostaria que eu dissesse?’. Ela disse: ‘Diga que eu quis lhe fazer uma consulta jurídica’”.

A reunião, intermediada pelo à época ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, foi a primeira sabatina de Barroso antes de obter o assento no Supremo em 2013 — ele ainda passaria formalmente, como manda o figurino estendido na Constituição Federal, por questionamentos da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e plenário da casa. 

Segundo ele, Dilma fez perguntas sobre separação de poderes, federação e royalties. “Eu era advogado no Rio na briga dos royalties, ela disse, ‘quer dizer que eu não posso mudar os royalties’ ela ainda brincou, e eu dei a minha opinião sobre as questões em geral, ela não fez nenhuma pergunta… Nem sobre Mensalão, nada que eu pudesse considerar inconveniente.” Naquela época, Barroso já sabia que para galgar o cargo de ministro era necessário entrar na estreita fila composta pelas alianças do Alvorada. Soube disso por telefone anos antes, em 2009, quando lhe informaram a possibilidade de ser convidado a assumir a vaga aberta com o falecimento de Carlos Alberto Menezes Direito. 


Luís Roberto Barroso durante posse como ministro do STF em 2013
- Foto: Nelson Jr/ SCO/ STF - reprodução

A conversa foi com Pedro Abramovay, secretário de Assuntos Legislativos entre 2009 e 2010 — no governo Lula 2. Eram cinco nomes e Barroso era o quinto da lista. “Eu perguntei a ele: ‘E quem me apoia?’. Ele falou: ‘Ninguém, mas também ninguém tem oposição ao seu nome, de modo que, se houver um impasse, pode ser a alternativa”.

O vencedor daquela disputa seria José Antonio Dias Toffoli, que, então advogado-geral da União, já havia sido advogado do PT. A escolha de Toffoli, segundo reportagem de 2010 da revista Piauí, relata uma conversa que ele teria tido com Lula: “Você já sabe do que nós vamos falar”, disse Lula a Toffoli. “Eu sei do que nós vamos falar, presidente, mas eu não vou aceitar porque o seu preferido, o do coração, não sou eu.” Lula encerrou o assunto: “É, mas o Sig [Sigmaringa Seixas] não quis, e vai ser você mesmo”. Um abraço teria selado o convite e a concordância de Toffoli. 

Os bastidores revelados com exclusividade a pesquisadores da Fundação Getulio Vargas (FGV), num projeto que se aprofunda na história do Supremo, mostram incontáveis elementos que rodeiam e influenciam na escolha dos 11 integrantes da última instância do poder judiciário brasileiro e sustentáculo da República. 

São questões ocultadas, mas ainda muito presentes na atual disputa — iniciada meses antes de Ricardo Lewandowski desocupar a cadeira, em 11 de abril deste ano. Na receita para chegar lá, estada em Brasília, jogo com a imprensa, interlocutores no Congresso, no Planalto e no próprio STF; fogo amigo e disputas ideológicas. Diferentemente do processo eleitoral comum, Lula é o único eleitor, rodeado por cabos eleitorais. 

A vaga deixada por Lewandowski será a nona indicação de Lula, que chegará à décima com a vaga que será aberta em outubro, com a aposentadoria da atual presidente da corte, Rosa Weber. 

A Agência Pública conversou com pessoas envolvidas nessa corrida para entender a regra do jogo em seus bastidores. Foram ouvidos ministros, ex-ministros, congressistas, juristas e lideranças políticas, além de especialistas, de modo a reunir dados e informações que desnudam ao leitor elementos inerentes ao processo de construção da imagem de um postulante ao STF em suas peregrinações prévias por gabinetes executivos e legislativos, em busca de apoios políticos.

Lewandowski, atual ministro do STF


Aposentadoria de Lewandowski abre disputa acirrada para vaga no Supremo
- Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil - reprodução

O percurso se inicia dois, três e até quase dez anos antes de alguém surgir entre os finalistas dessa competição, ressaltou um jovem advogado constitucionalista que atua nos tribunais, em Brasília, e se articula para se tornar em no máximo uma década nome cativo sondado ao STF. “Campanha”, para ele, não é o termo adequado — lobby nu e cru é o que se faz, pelo menos no meio jurídico, afirma.

O advogado busca tornar-se cada vez mais conhecido entre ministros por meio de suas ações judiciais para, com isso, estabelecer elos importantes nos gabinetes e ter seu nome repercutido nos bastidores. Também preza por manter relações com a imprensa; um café aqui e outro ali, conquistando a confiança — vez ou outra até a amizade — dos jornalistas. “Não tenha dúvida que se sai uma notícia dizendo que eu sou um ‘supremável’ vai ter parlamentar prestando atenção nisso. E se sai uma notícia dessas, não tenha dúvidas, muda inclusive a minha advocacia. […] o dono de um jornal não te odiar já facilita muito a sua vida.”

Sem lista tríplice, sem pedidos de voto — a exemplo do Superior Tribunal de Justiça (STJ) —, a politização das campanhas ao Supremo causa certo desconforto a algumas alas, mas não deixa de ser vista nos corredores do poder como imprescindível e naturalizada. 

“Ele tem que procurar todo mundo que possa, de alguma maneira, ser ouvido no governo, e a grande dificuldade é saber quem são esses interlocutores de fato perante o presidente”, explica um ministro do STJ que pediu para não ter seu nome revelado e que assistiu de perto a campanha de colegas ao Supremo, um deles André Mendonça, indicação de Jair Bolsonaro. “Foi bater [na porta dos gabinetes] no Congresso porque estava numa possibilidade de um veto, uma retaliação em relação ao presidente.” Era o contra-ataque à ideia de “terrivelmente evangélico”. Deu certo.

“Quanto maior a exposição, pior”

Para os gravadores e câmeras, as declarações de envolvidos na disputa atual são resumidas em frases republicanas que nem de longe retratam o cenário instalado desde que o jurista Manoel Carlos Neto, 43 anos, e o advogado Cristiano Zanin, 47, surgiram como possíveis opções de Lula. Outros candidatos são cogitados num embalo mais comedido: Pedro Serrano, um dos fundadores do grupo Prerrogativas; Bruno Dantas, presidente do Tribunal de Contas da União (TCU) e a juíza federal Adriana Cruz. 

Zanin, no entanto, é o nome da vez. E Lula cogitar uma indicação de seu advogado gerou críticas de que estaria violando o princípio da impessoalidade e comprometeria a legitimidade do tribunal perante a sociedade. Mas Zanin, ao se confirmar a escolha, já recebeu a chancela pública de membros atuais e antigos da corte, como Carmen Lúcia, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso e Celso de Mello, aposentado em 2020. “Todos nós, com raríssimas exceções, não fomos buscados em casa. Estávamos em algum lugar e tínhamos conexões com a vida política. Isso está dentro de um certo contexto político e ideológico. O fundamental é que saiba direito e que seja honesto”, afirmou Mello.


Favorito para ser indicado por Lula ao STF, Cristiano Zanin intensificou a presença em
Brasília - Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil - reprodução

Fernando Henrique Cardoso, que indicou três ministros em seus dois mandatos, referendou Gilmar Mendes, que — tal como Toffoli para Lula – era seu advogado-geral da União. Fato é que Zanin, na disputa com Manoel Carlos, foi o único citado publicamente por Lula até aqui. “Se eu indicasse Zanin para o STF, todos compreenderiam”, apesar de uma recente pesquisa da Quaest mostrar o contrário — a indicação é reprovada por 60% dos entrevistados.

Mas nessa corrida os candidatos devem buscar a discrição, considerada primordial por Lula — disse um de seus líderes. “Quanto maior a exposição, pior.” O comentário é sobre a imagem pública do indicado. O desafio é ser conhecido no meio jurídico e desconhecido nas outras esferas. 

Manoel e Zanin se conhecem, não são tão próximos. Nenhum deles nega a boa relação em conversas privadas com aliados. O primeiro é observado como alguém que dará continuidade aos pensamentos e posições de Lewandowski, com quem conviveu diretamente, entre 2006 e 2016. Ao deixar o cargo de assessor no STF, partiu para a iniciativa privada e deu aulas na Universidade de São Paulo (USP), onde lecionou por pelo menos dois anos. 

O segundo é um criminalista conhecido e reconhecido pela atuação que ajudou a demonstrar a parcialidade do ex-juiz e agora senador Sergio Moro (União Brasil-PR), na Lava Jato e que teve papel fundamental na recuperação dos direitos políticos do atual presidente. Zanin tratou de temas ligados à sua área de atuação em entrevistas e artigos, voltada para litígios empresariais e para o uso abusivo de mecanismos jurídicos, conhecido como lawfare.


Manoel Carlos de Almeida Neto, ex-assessor de Lewandowski, está entre os cotados para
a vaga - Foto: Carlos Humberto/STF - reprodução

A apuração da Pública indica que “aversão”, “resistência” e seus sinônimos não parecem ecoar pelos corredores do STF a respeito dos postulantes — estimados pelas atuações e velhos conhecidos dos membros da corte. 

Fontes confirmaram à Pública que ambos, há pelo menos dois meses, passam a maior parte do tempo em Brasília na expectativa de fortalecer e ampliar suas articulações onde intensificam as campanhas nos bastidores. “Tem a ver com a proximidade. Estar em Brasília facilita as coisas para você fazer políticas que chegam na preferência do presidente; para você chegar perto, para você ter diálogo com coalizões que estão face a face com o executivo central, com os parlamentos federais”, observou o professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iesp-Uerj) Fernando de Castro Fontainha, um dos responsáveis pela coleta dos dados que mostra que no intervalo de 1988 a 2013 a terra erguida nos traços de Niemeyer foi a mais visitada antes da indicação ao STF. 

Foram 45 viagens à capital; 33 a São Paulo (SP) e 28 ao Rio de Janeiro (RJ) — as três regiões no topo da lista. E não se trata de tradicionais visitas à cidade de origem — nenhum dos 33 ministros que participaram do levantamento nasceu na capital federal, e 64% dos deslocamentos envolviam razões profissionais. 

Manoel e Zanin se movimentam para a consolidação da imagem. Não é só batendo de gabinete em gabinete. É se fortalecendo com os interlocutores mais influentes mirando a decisão presidencial. É uma receita antiga: “Por exemplo, muitas vezes eu ia visitar algum gabinete e o senador dizia: ‘Olha, um grande amigo meu me ligou aqui para dar um testemunho a seu favor’. De repente, era uma pessoa como o professor Ives Gandra Martins, que não era do ciclo das minhas relações pessoais”, revelou o ministro Dias Toffoli aos pesquisadores da FGV sobre o pré-STF. “A sua vida é devassada, é virada do avesso. A sua vida, a da sua família, a dos seus amigos. É uma coisa que, realmente, é importante que seja assim”, frisou em outro trecho. 

Revirar a vida alheia pode ser desleal num outro contexto, não quando se trata de quem vai ajudar a decidir normas relacionadas de meio ambiente a direitos de minorias no Brasil. Um interlocutor amigo pessoal do presidente e considerado, inclusive, companheiro de lutas sociais confirmou à Pública ter participado de reuniões separadas com Manoel Carlos e Zanin. Foi cauteloso e desconfiado ao tratar das pautas dos encontros e reforçou uma, duas, três, quatro vezes — e tantas mais, beirando a exaustão — que nenhum dos candidatos pediu abertamente indicação ao presidente. Ambos, no entanto, teriam debatido uma das perguntas que motivaram esta reportagem: “O que é necessário para se tornar um ministro do STF?”.

Abrangentes e um tanto quanto relativos, “notável saber jurídico” e “reputação ilibada” são os critérios em alta nas discussões políticas, além, claro, da lealdade às demandas da base social de Lula e da conjuntura a ser formada a partir da posse de um dos nomes. Titulação, nesses casos, na compreensão de constitucionalistas, não guarda tanto peso quanto a capacidade de avaliar questões sobre direitos fundamentais e a independência na possibilidade de frustrar a expectativa da ala responsável pela indicação. Aspecto primordial para especialistas ouvidos, no contexto de divisão de um STF pragmático: uma ala ligada mais à iniciativa privada em temas econômicos e nacionalistas e outra apegada, em maior grau, ao caráter estatizante e social. 

Ingenuidade dizer que se busca um ministro imparcial numa instância em que a interpretação de jurisprudências nacionais e internacionais jorra nas falas do Pleno, se esgota em pedidos de vista e reflete nos manuais que regem o país em termos de lei. O fato de Zanin, caso indicado à vaga, ter de enfrentar a possibilidade de se declarar suspeito em processos da Lava Jato ou, por força legal, ser impedido de atuar em ações em que trabalhou como advogado preocupa mais membros da cúpula política do governo do que juristas.

Se falar em critérios técnicos e éticos, os dois nomes mais cogitados estão, teoricamente, em condições de atuar na corte. Um outro olhar, mais crítico e muitas vezes leigo, no entanto, também tem influência: o social — avalia Diego Werneck, professor associado do Insper e doutor em direito pela Universidade Yale, nos Estados Unidos. “A delicadeza e a importância do que o tribunal faz, decidir essas disputas de alta magnitude, em última instância… Não basta só você ser independente, você tem que convencer as pessoas de que você é. […] é importante dizer que as pessoas vão suspeitar de muita coisa que não tem nenhum fundamento, mas é importante não dar fundamento, é importante não contribuir para essas suspeitas.”

Suspeitas que se abateram sobre o ministro Luiz Fux quando de uma entrevista de José Dirceu à Folha de S.Paulo em 2013. O ex-deputado federal e ex-ministro contou sua versão a respeito de uma promessa que teria recebido de absolvição no processo do mensalão. Dirceu disse ter sido “assediado moralmente” durante seis meses por Luiz Fux, que era ministro do STJ à época e desejava ir para o STF.

Fux negou a promessa de absolvição, no entanto admitiu que procurou José Dirceu quando estava em campanha para ser ministro da corte. “Fui a várias pessoas de São Paulo, à Fiesp. Alguém me levou ao Zé Dirceu porque ele era influente no governo Lula.” Fux não viu problema em procurar quem um dia poderia julgar. “Confesso que naquele momento não me lembrei [que Dirceu era réu].”

A imagem é tudo

“Se não for dessa vez, ele não tentará mais. É muito desgastante”, disse à Pública o aliado de um dos concorrentes. No mar de desgaste, Zanin e Manoel vendem o peixe — não só nos argumentos, mas também com obras. Fontes, sob anonimato, revelaram que nas reuniões eles aproveitam para falar dos livros publicados e, não raramente, os distribuem. Colapso das Constituições do Brasil — um reflexo pela democracia, escrito por Manoel Carlos; e Lawfare: uma introdução, de Zanin, Valeska Martins e Rafael Valim, estão entre as publicações mais conhecidas em suas bolhas. Fragmentos dos portfólios entregues em gestos além da cortesia.

O que se pensa — boato ou fato verídico — sobre alguém ou uma instituição muda qualquer cenário. Aí está o papel dos interlocutores — engajar em notas atrás de notas, conversas atrás de conversas, numa publicização exacerbada de casos, comentários e opiniões para que o presidente decida, no fim das contas, qual figura lhe causará menos desgaste no futuro. 

Lula, em declarações recentes, afirmou que não vai indicar ministro para ser seu amigo. “Eu não quero indicar um ministro para fazer coisa para mim. Eu quero indicar um ministro da Suprema Corte que seja uma figura competente do ponto de vista jurídico e que esse cidadão exista lá para que a Constituição da República seja respeitada. É isso”, reforçou.

Ambos contrataram assessores de imprensa para a filtragem de conteúdo repercutido nos veículos de comunicação e contenção dos ataques sobre o histórico de vida de cada um. Clipagem do fogo amigo que ninguém vê ou prefere não admitir de onde vem, mas que está presente diariamente nas colunas dos portais de notícia. 

Estátua de Justiça, na fachada do STF em Brasília


Há quem diga que se deve chegar pronto — para tudo e todos — ao Supremo,
o ápice da carreira - Imagem: divulgação

Espalhar currículos nessa trajetória não é nenhum advento. O próprio Luiz Fux já citado nesta reportagem foi um dos ministros que também revelou — com exclusividade a pesquisadores da FGV — a construção de aliados para concretizar-se como parte do seleto time, em 2011 — primeiro ano de Dilma no Planalto. “Eu falei com muita gente na época do governo Lula, que até ele tinha tomado a iniciativa de me ligar quando estava com Lindbergh [Farias]. Mas ele já tinha, segundo consta, assim… um perfil, que preferia que não se falasse com muita gente. E eu não sabia disso. Então, eu procurei levar meu currículo para várias pessoas. Onde ele chegava, as pessoas falavam: ‘Olha, tem um currículo aqui do Fux’. ‘Ah, eu já ouvi falar. Já ouvi falar até demais.’ […] Entreguei os currículos a quem me recomendaram entregar.” 

Recomendações, ligações, conexões compõem um jogo de habilidades e — algumas vezes — sorte, num universo onde dezenas afirmam ter muita influência na escolha do presidente, mas poucos realmente a têm. Nomes considerados preponderantes nas consultas do presidente são disparados nos bastidores sem muita certeza.

É sabido que, nos seus dois primeiros mandatos, Lula consultava com frequência para as escolhas de tribunais superiores o seu ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, e o advogado e deputado Sigmaringa Seixas, ambos já falecidos — dois que Lula gostaria de ter indicado ao STF, mas que nunca aceitaram ocupar as vagas.

Em tempos de ataque às instituições, ronda a atual disputa também a transparência de pensamentos, apontada por especialistas e lideranças políticas como requisito-chave ao acerto definitivo. Sobre Zanin, pouco se sabe da sua visão relacionada à diversidade e direito tributário, por exemplo. Manoel Carlos, por sua vez, embora possua histórico acadêmico mais amplo, é observado por estudiosos consultados pela reportagem como alguém que “dança conforme a música” — por isso, levantaria dúvidas sobre os caminhos da atuação ao ter em mãos poder e independência. 

“Isso tudo se esclarece na sabatina do Senado”, disse um congressista que esteve presente numa reunião com Zanin e lideranças políticas, em março deste ano, na casa do deputado federal Alencar Santana (PT-SP). Algo informal, um tradicional vinho à noite — na alegação de um dos participantes. Na busca incessante do centrão por funções do segundo escalão nos ministérios como condicionantes para a formação de frente ampla no Congresso Nacional, nenhuma fonte procurada pela reportagem acredita na possibilidade — nem mesmo remota — da rejeição do nome indicado por Lula. “Não querem ficar contra a indicação do presidente”, comentou um deputado ao destacar ter conversado com Lula sobre o assunto, na última semana de março. Ressalvou, contudo, o posicionamento de discordância previsível da extrema direita, que já prometeu engrossar caso o indicado seja Zanin.

“As sabatinas não têm esse papel, de fato, de escrutinar esses elementos do que está no papel, do que está no currículo; de fato se aprofundar na trajetória, no posicionamento. Até em alguns casos, que a gente viu recentemente, ministros que chegaram na sabatina com suspeitas ou acusações de desvios éticos, por exemplo, relacionadas a normas acadêmicas, plágio, coisas desse tipo”, analisa Juliana Alvim, professora da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Universidade Centro-Europeia (CEU).

Para não ser injusto com a história, senadores brasileiros já rejeitaram cinco nomes propostos ao STF entre 1891 e 1894, no governo de Floriano Peixoto. Narra o ex-ministro Celso de Mello, em Notas sobre o Supremo, que não passaram no crivo: Barata Ribeiro, Innocêncio Galvão de Queiroz, Ewerton Quadros, Antônio Sève Navarro e Demosthenes da Silveira Lobo. 

Mesmo que a sabatina dure quase 12 horas, como enfrentou Edson Fachin, em 2015, não há questionamentos que desbanquem aquilo milimetricamente calculado. “Muito se diz que o Senado não rejeita nomes e que, historicamente, no Brasil, o Senado não tem o costume de rejeitar os nomes. É que aqui no Brasil, o que o presidente da República faz? Ele consulta o Senado antes, informalmente. Na verdade, é isso que ocorre”, palavras de Dias Toffoli à FGV.

As opiniões convergem na ideia de que a defesa incontestável da democracia deve estar acima de qualquer interesse, sobretudo após os atos do dia 8 de janeiro e discursos autoritários com base sólida e representantes no país. 

“Num momento desses de ameaça à democracia e de crítica ao Supremo a partir de uma perspectiva antidemocrática, é interessante alguém que reconheça o valor do colegiado, como a ministra Rosa Weber, por exemplo. Uma ministra que não abre fronte para crítica individual à toa, não vai dar uma monocrática [decisão] na véspera, como a monocrática do ministro Nunes Marques liberando o culto na véspera da Páscoa no meio da pandemia de covid na sexta-feira, em que o colegiado só poderia lidar com isso na semana seguinte”, observou Alvim. 

A postura de cada ministro é perceptível até mesmo na formação das equipes. A Pública visitou o STF, conversou com técnicos e pessoas próximas aos membros da corte. Os gabinetes — estruturas com, em média, dez assessores, três juízes, um chefe de gabinete, além de analistas e servidores de carreira — são moldados com visões que vão desde as mais crentes na imparcialidade da casa a indiretas sobre políticas sociais e econômicas. “Não dá para homogeneizar as questões.” Outra fonte reforçou a ausência de imparcialidade nas articulações em andamento: “Não existe escolha neutra”.

No ambiente técnico do STF, pouco se fala de representatividade e diversidade, embora predomine um colegiado com somente duas mulheres e nenhum negro — aliás, o único ministro negro a compor a corte em seus 214 anos de vigência foi Joaquim Barbosa, aposentado em 2014.


Joaquim Barbosa foi o único negro ministro do STF a compor a corte em 214 anos
- Foto: José Cruz/Agência Brasil - reprodução

Lula, inclusive, não se comprometeu com uma mulher ou uma pessoa negra para esta vaga, como tem sido pedido por alguns setores da sociedade. “É um critério que eu vou levar muito em conta nesse momento, mas não darei nenhuma referência, porque, se eu der, estarei carimbando a pessoa que será o futuro ministro ou a futura ministra”, afirmou.

Nas discussões de corredores gotejam suspeitas sobre o critério pessoal de Lula para a nova escolha, em tentativas de persuadir — seja por meio da exposição na imprensa ou em conversas fechadas — na decisão final. Mas o próprio Lula deu o recado: “Não adianta as pessoas ficarem plantando nome, tentando vender candidato pela imprensa, porque não é assim que se escolhe ministro do Supremo”, disse. “O critério dessa primeira vaga é alguém de caráter de confiança, que não traia a Constituição. Quem está nesse critério cai num afunilamento, que é o critério de lealdade”, pontuou o integrante de uma das campanhas e interlocutor do candidato no STF. 

Há quem diga que se deve chegar pronto — para tudo e todos — ao Supremo, o ápice da carreira que exige conhecimentos abrangentes. É uma instância sem órgão revisor, motivo de aumento da carga de responsabilidade e pressão nas decisões. Os defensores de que o aprendizado é constante e se inicia na corte, num formato diverso de qualquer outra experiência, são maioria. 

É, sem dúvida, um processo de construção bem distante da frase repetida por inúmeros ministros e ex-ministros que conversaram com a Pública: “É cargo que não se postula, não se pede”. Postula-se, se pede, se articula, se ganha, se ocupa.

Por Dyepeson Martins


Fonte: agenciapublica