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quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

DESRESPEITO À CULTURA LOCAL! - Piratas da Cultura - Por "Gojoba"

Foto: reprodução
A gestão da cultura do estado virou um verdadeiro deposito de piratas, usurpadores de valores históricos, com gente de propósito efêmero e facilmente refutáveis para o campo da cultura.

Já faz algum tempo que a gestão da cultura no Maranhão enxerga a Secretaria de Estado da Cultura apenas como uma produtora de eventos. Não há um planejamento para gerir e promover cultura o ano todo, não há sensibilidade com o fazer cultural dos grupos e das pessoas fazedoras de cultura do estado. Tudo é apenas um “espetáculo”, no pior sentido da palavra. A ordem é reunir multidões fazer um filminho, postar e esperar os likes, os comentários e compartilhamentos, ainda que isso custe caro para quem faz a verdadeira cultura do Maranhão.

Nos últimos dias nas redes sociais, o senhor Yuri Arruda, secretário da referida pasta, tem se orgulhado de interagir com seus “seguidores” sobre qual a próxima atração nacional a ser anunciada para o carnaval, sempre se exaltando de tal orgulhosa “conquista”.

Abro aspas para o calcídico das culturas de outros lugares: “Valeu apena esperar, hein? Mais 2 grandes atrações para o carnaval! Vamos juntos pagodear com @bomgosto e dançar o melhor do piseiro com @zevaqueiro. Não acredita que ainda tem mais? As surpresas estão só começando!”

Ele disse que tem mais surpresas. A única surpresa que não tem é dinheiro pra pagar as atrações locais, e olha que saímos de uma pandemia de 2 anos sem carnaval, fico pensando que nem sensibilidade essa gente deve ter.

Voltemos às surpresas prometida com alguns textinhos fofos do secretário para com as atrações de fora, abro aspas novamente: “Amanhã vocês descobrem mais duas atrações confirmadas. Algum palpite?”

E segue o romance, “Comecem dar novos palpites senão vocês vão ficar só errando! Muita coisa boa vindo por aí e ninguém tá adivinhando ainda…”. “O que será que vem por aí? Silva e Igor Kannário já estão fechados com o carnaval do MA. Hoje, vocês descobrem mais duas atrações. Quero ver se alguém vai acertar. Vou acompanhar os comentários!”

O que trato aqui nada tem a ver com divulgar ou deixa divulgar as atrações do carnaval, mas a questão é, por que não tem encaminhamentos para a contratação e pagamentos de grupos do estado? Por que não receber seus representantes para buscar caminhos para suas produções? E principalmente por que tratar com tanto desprezo e descaso o que é produzido no estado, enquanto quem vem de fora tem um tratamento todo especial com cachês altos e recebimentos adiantado?

Enquanto o pirata da vez, ou o papagaio de pirata, em seu caso, se orgulha de anunciar diversas atrações nacionais, inclusive muito questionáveis quanto a ser uma atração com características carnavalescas, pagando cachês robustos e com bastante antecedência, os grupos e produtores de nossas escolas de samba, blocos, e afins, se quer sabem o valor e a data que irão receber seus sofridos cachês. Ocorre que o mesmo marca diversas reuniões com as agremiações e quando chega no horário próximo à reunião pede aos seus assessores que sejam desmarcadas e remarcadas novamente e depois desmarca novamente, num movimento desrespeitoso e de total infâmia e falta de respeito com os representantes dos grupos.

Não vejo nenhum problema na existência de intercâmbios culturais em qualquer que seja o evento do estado, a questão está em solapar nossa produção em detrimento de outras oriundas de outros estados, inclusive para o grupos daqui, sempre alegam não haver recursos e está encontrando dificuldades para a produção do carnaval, sendo que todo mundo sabe que no carnaval, qualquer atração nacional além de cobrarem o dobro ou o triplo do que cobram em períodos normais, só aceitam saírem de seus estados com pagamento adiantado.

O mal gosto do secretário e de seus asseclas beira o ridículo, com uma programação esquálida e sem qualquer conexão com a maior festa popular do país. O que parece mais um festival de música para agradar a si próprio e a seus amigos do que realizar uma grande festa momesca.

Essa gente não gosta da nossa cultura, não vive a nossa cultura, só às usa para fazer foto e receber o próximo like. Percebam os formatos dos eventos, assim como as atrações preferidas e os locais dos eventos, não há o mínimo de esforço para se quer receber um representante da nossa cultura, eles os tratam como gente chata. Essa gente não tem coragem de assumir que não gostam da cultura feita aqui, não propõem soluções, não discute encaminhamentos, não se importam.

Cadê nosso Ministério Público? Que de forma acertada impediu a realização de festas em diversos municípios do Maranhão, vai assistir de camarote a ceifada que o governo do estado está dando em nossos grupos carnavalescos? Espero que não!!!

Por José Ribamar Gomes "Gojoba"

Fonte: ATUAL7


Foto: reprodução

Quem é Yuri Arruda Milhomem? Nasceu no dia 26 de fevereiro de 1991. É natural da cidade de Grajaú, região centro-sul do Maranhão.

É formado em Engenharia Civil e pós-graduando em Gestão Pública.

Foi Chefe de Gabinete durante a gestão do secretário Paulo Victor (de abril a agosto de 2022), período no qual foi realizado "o maior" São João do Brasil, com mais de 60 dias de ações em todo o estado. Yuri Arruda assumiu a pasta da Secretaria de Estado da Cultura do Maranhão no dia 16 de agosto de 2022, a convite do governador Carlos Brandão. É casado com Isabella Sena.


sexta-feira, 13 de janeiro de 2023

14 mil pessoas foram intoxicadas por agrotóxicos durante governo do inominável

Imagem: Reprodução

Casos levaram a uma morte a cada três dias, segundo levantamento feito pela Agência Pública e Repórter Brasil, com dados de 2019 a março de 2022 do sistema de notificações do Ministério da Saúde.

Durante o governo do "inominável" (PL), 14.549 pessoas foram intoxicadas por agrotóxicos no Brasil. Levantamento inédito feito pela Agência Pública e Repórter Brasil, com dados de 2019 a março de 2022 do sistema de notificações do Ministério da Saúde, mostra que essas intoxicações levaram a 439 mortes — o que equivale a um óbito a cada três dias.

Nesse período, o Brasil bateu o recorde de aprovações de pesticidas, com mais de 1.800 novos registros, metade deles já proibidos na Europa. O governo de Bolsonaro também foi marcado pelo avanço na tramitação do Projeto de Lei 1459/2022, apelidado de “Pacote do Veneno”, que pode facilitar ainda mais a aprovação dessas substâncias.

Segundo o levantamento, homens negros são as principais vítimas de agrotóxicos. As circunstâncias que mais levaram às intoxicações foram tentativas de suicídio, com cerca de 5 mil casos, seguidas por acidentes, uso habitual dos pesticidas e contaminações ambientais, por exemplo, quando o químico é dispersado pelo ar. As intoxicações aconteceram principalmente nas lavouras de soja, fumo e milho. 

Intoxicações e mortes por agrotóxicos no Brasil — Foto: Agência Pública / Reprodução

Os dados também mostram que os estados da região Sul concentraram a maioria das notificações, considerando o número de habitantes. Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul registraram 4,2 mil intoxicações. Nove entre os dez municípios com mais casos em relação à população estão na região.

Estados do Sul concentram mais intoxicações por número de habitantes

Os municípios com mais intoxicações notificadas considerando o tamanho da população estão na região Sul. Em Santa Catarina, o município de Rio do Campo registrou 61 casos para uma população de apenas 5,8 mil habitantes. 

Na análise do engenheiro-agrônomo e integrante da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) e da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e Pela Vida, Leonardo Melgarejo, os números altos da região podem indicar que os serviços de saúde estão fazendo um melhor trabalho de identificação destes casos do que em outros estados. “Acredito que o dado não seja porque aqui no Sul os agricultores sejam mais descuidados, mas sim ao fato de que profissionais da saúde têm mais zelo com relação aos casos de intoxicações”, diz. 

Já em números absolutos, o município que mais registrou intoxicações por agrotóxicos foi Recife, com 938 notificações no período. A pesquisadora da Fiocruz Pernambuco e vice-coordenadora do GT de Agrotóxicos da instituição, Aline Gurgel, reforça que o número maior de registros de casos em um território não significa necessariamente uma maior ocorrência de casos.

Ela cita a criação do programa de Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Agrotóxicos (VSPEA), que instituiu ações como o cadastro na atenção primária dos aplicadores de agrotóxicos e a vigilância participativa dos trabalhadores expostos a agrotóxicos. 

Homens negros: o perfil da vítima dos agrotóxicos

Além das diferenças regionais, os dados obtidos pela Agência Pública e Repórter Brasil revelam que homens negros foram o perfil mais comum entre os intoxicados.  

Para o médico e professor aposentado que coordenou o Observatório do Uso de Agrotóxicos e Consequências para a Saúde Humana e Ambiental da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Guilherme Cavalcanti de Albuquerque, a intoxicação recorde desse recorte da população pode estar relacionada ao racismo estrutural, que faz com que homens negros executem trabalhos mais precarizados, como o de aplicador de agrotóxicos. “A população negra é uma população a quem foi negado por séculos o acesso à educação e, mesmo quando há educação qualificada, o racismo estrutural impõe maior dificuldade para acesso a trabalhos menos agressivos. Resta mais aos negros esse tipo de trabalho prejudicial à saúde”, afirma.

Na mesma linha, Gurgel lembra que a baixa escolaridade dificulta a compreensão das instruções e dos riscos e perigos associados à exposição aos agrotóxicos. “Mais grave ainda é que as recentes modificações nas normativas brasileiras vulnerabiliza ainda mais a população, porque retiraram informações de alerta dos rótulos e bulas de agrotóxicos, assim como o pictograma da caveira com duas tíbias cruzadas, de vários agrotóxicos comercializados no Brasil. Para trabalhadores com baixa escolaridade, essa mudança na comunicação de risco pode levar a um maior número de casos de intoxicação, pois dificulta a identificação do perigo”, comenta a pesquisadora, referindo-se às mudanças no critério de classificação e nas embalagens de agrotóxicos feita pela Anvisa em 2019.

Lavouras de soja, fumo e milho são campeãs em intoxicações

Os casos de intoxicação registrados entre 2019 e 2022 aconteceram principalmente em lavouras de soja, fumo e milho. A soja correspondeu a 802 registros e o milho, 523. Os números altos nesse tipo de lavoura, de acordo com os pesquisadores, podem estar relacionados ao tamanho das plantações desses cultivos, onde os pesticidas costumam ser pulverizados em larga escala, normalmente por aviões, o que aumenta as chances do agrotóxico se espalhar para fora da plantação. 

A pesquisadora da USP Larissa Bombardi indicou que as plantações de soja, milho, cana-de-açúcar e algodão são o destino de 79% das vendas de agrotóxicos no Brasil. O Atlas Geografia do uso de agrotóxicos no Brasil e conexões com a União Europeia, publicado em 2017, mostra que 52% do veneno vai para plantações de soja e 10% para o milho. 


Plantações de soja foram o tipo de lavoura com mais registros de intoxicações por
agrotóxicos agrícolas desde 2019 — Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
— Foto: Agência Pública / Reprodução

Já os produtos usados em plantações de fumo registraram 734 intoxicações nos dados do Ministério da Saúde. O professor Albuquerque aponta que, apesar de não estar entre as principais lavouras em extensão no país, o cultivo de fumo é um dos que mais usa agrotóxicos. “Além disso, o cultivo exige contato muito próximo do trabalhador com o fumo contaminado pelo agrotóxico. Isso faz com que a incidência de intoxicação nesse plantio seja proporcionalmente maior”, comenta, lembrando que a aplicação de agrotóxicos nas lavouras de fumo muitas vezes é feita via costal.

Mais de 5 mil intoxicações foram tentativas de suicídio

Os casos de tentativa de suicídio são a circunstância mais comum das intoxicações, com 5.210 registros. Segundo os pesquisadores, dois fatores ajudam a interpretar o dado.

O primeiro é a baixa notificação de outras causas de intoxicação, que faz com que os registros por tentativas de suicídio tenham destaque. O segundo é que o uso de alguns agrotóxicos pode levar à depressão e a alterações do sistema nervoso, o que seria um fator a mais que pode levar às tentativas.

“Como há muita subnotificação, os casos de suicídio e de óbitos em geral são mais difíceis de ocultar”, avalia Albuquerque. “Mas há grande vínculo entre a intoxicação por agrotóxicos e o suicídio, porque há agrotóxicos que induzem fortemente a doenças depressivas e ao suicídio”, complementa. 

Aline Gurgel comenta que os agrotóxicos do grupo químico dos carbamatos e organofosforados têm como um de seus principais mecanismos de ação a depressão do sistema nervoso. O propamocarbe é um exemplo do grupo dos carbamatos e é usado em mais de 40 culturas no Brasil, incluindo nas de abobrinha, alface e tomate. Os organofosforados compreendem uma ampla gama de agrotóxicos, entre eles o acefato, o quinto agrotóxico mais vendido no Brasil.

Pandemia reduziu registros de intoxicações

A quantidade de casos de intoxicações por agrotóxicos caiu durante os anos de pandemia do coronavírus: em 2019 foram 5.875 casos para 4.073 em 2020, e 3.816 em 2021. 

Segundo Leonardo Melgarejo, a queda era esperada e pode não significar uma diminuição real de intoxicações. “Durante a pandemia, as pessoas evitaram aglomerações, especialmente em locais de risco [como hospitais e postos de saúde]”, afirma, mencionando dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) de que apenas uma a cada 50 intoxicações por agrotóxicos é registrada. 

A pesquisadora da Fiocruz concorda com os impactos da pandemia nas notificações. “Os serviços de saúde foram sobrecarregados em decorrência da pandemia, a identificação de casos suspeitos de intoxicação, bem como a notificação de agravos como intoxicações, muito provavelmente foram prejudicadas”, pontua Gurgel.

Ela também reforça que as intoxicações por agrotóxicos são subnotificadas por diferentes motivos além da Covid-19, como a falta de treinamento dos profissionais e a baixa cobertura laboratorial para confirmação de casos.

Além disso, há dificuldade dos intoxicados chegarem aos postos de atendimento pela distância dos serviços de saúde e a dificuldade de locomoção. “Os agricultores nem sempre procuram atendimento e quando procuram é porque houve uma intoxicação aguda e sentiram medo de morrer. Então as outras intoxicações, de impacto mais baixo, mas que acontecem de forma crônica, sequer são registradas”, comenta Melgarejo.

Fonte: revistagalileu




Papinhas de bebês: estudo indica presença de agrotóxicos em refeições industrializadas




sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

Crianças Yanomami morrem quase 13 vezes mais por causas evitáveis

Imagem: Reprodução

Considerando apenas 2019 e 2020, foram oito mortes por malária de crianças menores de 5 anos, o equivalente a dois terços do total de óbitos nessa faixa etária em todo o Brasil, segundo a Agência Pública.

Em 16 de setembro, a comunidade de Makabei, na Terra Indígena (TI) Yanomami, chorou a morte de uma criança de apenas 2 anos, que vamos chamar de M. Ela estava com malária, infectada pelo Plasmodium falciparum, o mais agressivo dos protozoários que causam a doença, e desenvolveu malária cerebral, uma complicação grave que, não raramente, leva à morte.

A morte de M. não é um caso isolado. Nos três primeiros anos do governo Bolsonaro (2019-2021), ao menos 14 crianças menores de 5 anos morreram em decorrência de malária na maior TI do país, localizada entre Amazonas e Roraima.

Os dados inéditos foram obtidos pela Agência Pública junto à Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). Considerando apenas 2019 e 2020, os últimos anos em que há dados nacionais disponíveis, foram oito mortes por malária na TI Yanomami, o equivalente a dois terços do total de óbitos nessa faixa etária em todo o Brasil, onde 12 crianças faleceram por complicações da doença.

Júnior Hekurari Yanomami, presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kuana (Condisi-YY) e responsável por relatar o caso de M. à Pública, resume o processo de luto que uma morte como essa causa em seu povo. “Choram todos os dias, todas as noites. Toda a comunidade, não só a mãe, a família inteira. Ficam de luto, chorando, de manhã, de tarde, de noite. Ficam chorando durante meses”, explica o líder indígena, que preside também a Urihi Associação Yanomami.

A malária, que matou mais de uma dezena de crianças Yanomami e infectou milhares em três anos, está incluída em uma lista de “óbitos por causas evitáveis”, classificação que abrange doenças tratáveis, como pneumonia, desnutrição, diarreia e verminoses.

Se considerarmos todas as mortes por causas evitáveis, o cenário na TI Yanomami se mostra ainda mais aterrador: entre 2019 e 2021, “ao menos 404 crianças menores de 5 anos”, morreram no território indígena por causas que poderiam ter sido evitadas ou tratadas. É uma média de 134 a cada ano, sendo os dados de 2020 e 2021 ainda preliminares.


Terra Indígena Yanomami — Foto: Bruno Fonseca/Agência Pública - Reprodução

Para se ter uma dimensão do tamanho da tragédia entre os Yanomami, basta comparar as taxas nacionais com os números encontrados na TI. Entre 2019 e 2020, últimos anos com dados disponíveis em nível nacional, a taxa de óbitos evitáveis de crianças com menos de 5 anos no Brasil foi cerca de 165 a cada 100 mil habitantes, de acordo com informações obtidas no DataSUS. Na TI Yanomami, no mesmo período, a taxa foi de 2.275 mortes a cada 100 mil habitantes. São  13,7 vezes mais crianças que perderam a vida, de acordo com os dados obtidos via LAI pela reportagem.

Garimpo e ausência do Estado são corresponsáveis pelas mortes

“Quando uma criança indígena morre, assassinada pela ganância dos predadores do meio ambiente, uma parte da humanidade morre junto com ela”, disse o presidente eleito Lula (PT) em seu discurso de vitória após o segundo turno das eleições, em 30 de outubro. Na TI Yanomami, os mais de 20 mil garimpeiros “predadores do meio ambiente”, a ausência e a corrupção do poder público são apontados como os principais responsáveis pela morte de centenas de crianças indígenas anualmente.

A cada contato feito pela reportagem com fontes Yanomami ou ligadas ao território ao longo dos últimos meses, uma mesma situação se repetiu. Além de atualizações verbais sobre o cenário na TI, cada diálogo vinha acompanhado de novas fotos que reforçam o que está ocorrendo na TI Yanomami.

São imagens quase sempre de crianças, extremamente magras, com os ossos à mostra e a barriga inchada. Algumas delas, como M., mencionada no início deste texto, estão no colo de suas mães, à beira da morte. Outras fotos revelam postos de saúde extremamente precários, onde dezenas de famílias se amontoam em redes, à espera de atendimento médico.

Uma das imagens recebidas pela Pública não mostra nenhuma criança, mas sim uma página de um caderno com anotações. Enviada pela liderança indígena Fernando Yanomami, o registro traz o nome de dez comunidades da região do Palimiú, acompanhado do número de mortes por doenças, especialmente malária, ocorridas em cada uma delas. São 74, entre crianças e adultos. Não é possível saber se todos os óbitos computados foram contabilizados oficialmente.


Caderno de Fernando Yanomami, da região do Palimiú, traz informações sobre óbitos
em várias comunidades da região — Foto: Arquivo pessoal - Reprodução


Em conversa com a reportagem, Fernando destaca a comunidade de Haxiu, que lidera a lista de óbitos, com 17 mortes, e explica os motivos que levaram a aldeia a esse cenário. “Sem saúde, sem rádio, muito sofrimento lá. Tem garimpo, muito garimpo, invasão mesmo. Rio contaminado, sujo, lama, barro mesmo. Muito sujo. Morreram”, diz.

Para Júnior Hekurari, da Urihi Associação Yanomami, o que está ocorrendo é uma “crise humanitária”. “Fome, malária, todos os Yanomami com malária. E malária pega com fome, é morte certa. É muito triste. Eu já várias vezes clamei ao governo para ajudar, mas a ajuda não está conseguindo chegar nas comunidades. As comunidades estão sem medicamentos, não tem ação permanente [de saúde]”, afirma a liderança indígena.

Na visão do médico e pesquisador Paulo Basta, trata-se de “um estado permanente de crise ambiental, social, sanitária, sob o ponto de vista de violação de direitos”. “É uma crise que vem progredindo de maneira a colocar os Yanomami numa situação ainda de maior vulnerabilidade com o crescimento do garimpo nas terras indígenas”, explica Basta, um dos responsáveis por uma série de estudos sobre os Yanomami conduzidos pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em parceria com a Unicef.

Para ele, a violência dos garimpeiros criou um clima de medo no território, fazendo com que a Sesai não mais coloque profissionais de saúde em áreas de conflito conflagrado, deixando os indígenas “abandonados à própria sorte” e tendo que recorrer aos garimpeiros quando têm alguma questão emergencial. 

“É claramente insuficiente o serviço de saúde prestado a essa população. A cobertura das unidades de saúde é baixa, a qualidade do atendimento é péssima. Não há infraestrutura local, não há medicamentos em quantidade e qualidade suficientes, não há insumos, não há equipamentos pra fazer procedimentos. Não há estrutura pra acolher pacientes com quadros graves, tampouco há estrutura pra fazer remoção desses pacientes pra unidades de saúde na cidade em tempo oportuno”, afirma o pesquisador.

Mortes por desnutrição na infância ocorrem 191 vezes mais que a média nacional

Em setembro de 2021, a Pública revelou que o índice de mortes por desnutrição na infância da TI Yanomami era o maior do país, com 24 mortes por desnutrição entre 2019 e 2020, na faixa etária de até 5 anos. Números atualizados mostram um cenário ainda pior: foram 29 óbitos, o que representa 7,7% do total de 374 mortes no país, mesmo com os Yanomami sendo cerca de 30 mil – apenas 0,013% da população brasileira.

Quando se considera o índice por 100 mil habitantes, as mortes por desnutrição na infância entre os Yanomami ocorreram 191 vezes mais do que a média nacional. A TI Yanomami contabiliza também pelo menos 14 crianças em 2021, ano que ainda não tem dados disponíveis em nível nacional.


Taxa de mortes evitáveis por 100 mil habitantes, entre crianças de 0 a 5 anos
- Foto: Bruno Fonseca/Agência Pública; dados: Ministério da Saúde - Reprodução

Além disso, em 2021, 56,51% das 4.245 crianças Yanomami acompanhadas pelo Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (Dsei-Y) tinham um quadro de desnutrição aguda (baixo ou baixíssimo peso para a idade). Em 20 dos 37 Polos Base do Dsei-Y, o índice era superior a 50%, chegando a 82,93% na região do Homoxi, uma das áreas onde o garimpo mais se expandiu nos últimos anos.

Os dados são ainda piores do que os apresentados pela Pública no ano passado, referentes a 2019, quando 54,32% das crianças Yanomami apresentavam desnutrição aguda, com o índice passando de 50% em 18 dos 37 Polos Base. A título de comparação, dados do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan) do Ministério da Saúde mostram que, em 2021, 4,27% das 4,5 milhões de crianças menores de 5 anos no Brasil tinham um quadro de desnutrição aguda.

A tragédia se repete quando se analisam outras moléstias. As mortes de crianças por pneumonia no Brasil foram cerca de 2.400 entre 2019 e 2020, sendo que 78 delas eram Yanomami, o equivalente a 3,2% do total – tendência que se manteve em 2021, quando ao menos 46 crianças do território indígena morreram em decorrência da doença.

O índice é semelhante para mortes por diarreia: foram 26 em dois anos na TI Yanomami, 3,5% do total no Brasil. Os dados obtidos pela Pública mostram também que pelo menos oito crianças de 0 a 5 anos morreram por Covid-19 na TI Yanomami entre 2020 e 2021.

Saúde Yanomami teve fraude na compra de medicamentos

Uma série de fatos ocorridos nas últimas semanas traduzem as razões pelas quais a TI Yanomami continua apresentando alguns dos piores índices de saúde do país.

Em 30 de novembro, a Polícia Federal (PF) e o Ministério Público Federal (MPF) deflagraram a Operação Yoasi, visando combater um esquema de desvio de recursos públicos que deveriam ser destinados à compra de medicamentos para abastecer o Dsei-Y. 

A fraude, de acordo com as investigações, teria se iniciado em outubro do ano passado, quando a empresa Balme Empreendimentos Ltda. firmou contrato com o Dsei-Y para o fornecimento de 90 tipos de remédios. Ao longo do último ano, porém, foram entregues menos de 30% dos medicamentos contratados.

O esquema, que teria movimentado cerca de R$ 600 mil, envolve dois ex-coordenadores do Dsei Yanomami, Rômulo Pinheiro e o ex-vereador Ramsés Almeida da Silva, além de uma farmacêutica, um assessor de Ramsés e o empresário Roger Henrique Pimentel, dono da Balme Empreendimentos.

Entre os medicamentos afetados está o vermífugo albendazol, que é utilizado de maneira coletiva no tratamento de verminoses e que, por conta da fraude investigada, deixou de ser aplicado em mais de 10 mil crianças, de acordo com o MPF.

A falta desse e de outros fármacos já vinha sendo denunciada pelos Yanomami pelo menos desde julho, quando a Hutukara Associação Yanomami divulgou carta relatando casos extremos de verminose, inclusive com crianças expelindo vermes pela boca. Há inclusive registros visuais da situação. 

Além de vermífugos, as fontes relataram falta de antibióticos usados no tratamento de pneumonia e a necessidade do uso de remédios mais caros, com mais efeitos colaterais, para combater a malária. “No ano passado, foi feito um esforço tão grande pra formar o ‘kit covid’ e enfiar goela abaixo da população que hoje não tem cloroquina pra fazer tratamento de malária”, conta o médico e pesquisador Paulo Basta, que alerta para a possibilidade de desenvolvimento de resistência dos parasitas causadores da doença por conta do uso indiscriminado de medicamentos mais fortes.

De acordo com ele, os postos de saúde do território só não ficaram em situação pior graças à atuação de ONGs e da sociedade civil organizada, que fez vaquinhas para compra de medicamentos e outras ações de saúde na TI. 

No mesmo 30 de novembro em que foi realizada a Operação Yoasi, a PF e o Ibama deflagraram a terceira fase da “Operação Guardiões do Bioma”, que destruiu aviões e equipamentos utilizados por garimpeiros ilegais que atuam na TI Yanomami.

Em reação à operação, garimpeiros atearam fogo na Unidade Básica de Saúde Indígena (UBSI) do Homoxi, que já está há mais de um ano fechada por causa de ameaças contra os profissionais de saúde que lá atendiam. Reportagem do Fantástico (TV Globo) que revelou a construção de 150 km de estradas clandestinas no território mostrou também imagens de uma nova operação contra garimpeiros, realizada em 7 de dezembro.

Também em 30 de outubro, o MPF em Roraima emitiu uma recomendação pedindo que o Ministério da Saúde nomeasse um interventor no Dsei-Y e que a Sesai criasse um grupo específico para acompanhar em tempo real a situação da saúde na TI Yanomami. No documento, o procurador da República Alisson Marugal destaca que, entre o começo de 2020 e a metade de 2022, foram empenhados mais de R$ 225 milhões na saúde Yanomami – o mais caro Dsei do Brasil –, sem que isso tenha se convertido em qualquer melhoria no atendimento de saúde dentro da TI.

Marugal já havia tomado outras medidas em relação à saúde dos Yanomami em anos anteriores. Em 2020, apresentou recomendação demandando que a Sesai voltasse a fornecer alimentação nos postos de saúde do Dsei-Y; diante da negativa do órgão, o procurador entrou com Ação Civil Pública (ACP), que não precisou prosperar porque a Sesai voltou atrás, abrindo licitação.

No ano seguinte, os MPF em Roraima e no Amazonas apresentaram recomendação conjunta demandando ações para melhoria dos serviços de saúde da TI. A despeito de a Sesai ter acatado parcialmente a recomendação, os indicadores de saúde do território indígena continuaram piorando.

A taxa de mortes evitáveis na faixa etária de 0 a 5 anos por 100 mil/habitantes na TI Yanomami foi calculada com base em uma estimativa de 6 mil crianças nessa faixa, o que vai ao encontro de dados de 2010 da Associação Hutukara, que fala em 20% da população tendo menos de 5 anos.

Fonte: revistagalileu


Em tempo!

Texto atualizado às 12:30 de 05/01/2023: Após revisão dos dados extraídos do DataSUS e obtidos via LAI, a reportagem precisou ser corrigida nos seguintes trechos:

– Onde estava “quase 10 vezes mais”, no título, houve alteração para “13 vezes mais”;
– No quarto parágrafo, o trecho “ao menos 429 crianças menores de 5 anos”, foi alterado para “ao menos 404 crianças menores de 5 anos”.
– Também no quarto parágrafo, o trecho “143 a cada ano”, foi alterado para “134 a cada ano”;
– No quinto parágrafo, onde estava “cerca de 260”, houve alteração para “cerca de 165”.
– Também houve alteração no quinto parágrafo de “a taxa foi de 2.400 mortes” para “a taxa foi de 2.275 mortes” e “9,2 vezes” para “13,7 vezes”;
– Por fim, houve correção dos dados no infográfico.

A versão acima já está com as informações corrigidas.

Atenciosamente,

sexta-feira, 26 de agosto de 2022

DETRAN-MA atrasa emissão de CNHs em São Luís

Imagem: Reprodução

Desde o último dia 26/07 quando paguei todas as taxas e fiz o exame obrigatório para renovação da CNH, que venceu no dia 07/07/2022, venho enfrentando dificuldades para receber a minha CNH.

A previsão de entrega foi agendada para o dia 10/08 no VIVA Shopping da Ilha, e me dirigi ao mesmo no dia 15/08/22, para o recebimento. Pois bem, em chegando lá, sou encaminhado ao guichê "DEV' responsável pela entrega das carteiras, e o atendente informa que minha carteira havia sequer sido impressa, "autorizada a emissão", mas não impressa.

Em conversa, o atendente me informou que estava havendo dificuldades estre o órgão e a gráfica responsável pela impressão das CNHs, e que diversos condutores estavam enfrentando a mesma situação.

Vejam, as pessoas estão pagando as taxas, pagando o exame médico, mas o DETRAN-MA não está honrando seu compromisso com a gráfica responsável, que não está emitindo as CNHs.

Bom, vejamos então aonde está o problema? As CNHs que estão sendo renovadas na atual gestão, estão tendo suas taxas devidamente pagas pelos condutores, e os exames, que são pagos em espécie ou por PIX, estão sendo pagos às clínicas credenciadas, mas as carteiras não estão sendo emitidas, e no meu caso, sequer impressa. A questão que fica é; as taxas estão sendo repassadas, sendo assim, por que as carteiras não estão sendo emitidas pela gráfica credenciada, e nem entregues aos condutores que pagaram e cumpriram todas as suas obrigações?

Seria interessante que o Sr. Hewerton Pereira, Diretor-Geral do Detran-MA, explicasse o porquê, das CNHs que estão sendo renovadas, não estarem sendo impressas e entregues aos condutores.

INFORMAÇÃO IMPORTANTE: as CNHs são enviadas ao VIVA Shopping da Ilha, todas as terças-feiras.


Imagem: Daniel Braz


No meu caso, já faz 16 dias de atraso, até o prazo estipulado, dia 10/08/22, para a entrega. Mas em conversa com o atendente do VIVA São Luís Shopping, mais uma vez, dia 25/08/22, tem pessoas que estão esperando a meses e não recebem as CNHs impressas, mesmo pagando todas as taxas e cumprindo todos os procedimentos exigidos. E aí???


Imagem: Daniel Braz


MAIS UMA: a 'OUVIDORIA' não funcionou nesse dia! (25/08/22).



Fotos: Daniel Braz

Aproveitando o ensejo, acho que já está na hora de providenciarem uma faixa de pedestres na entrada principal do Shopping da Ilha para o bairro do Maranhão Novo, pois fica muito difícil atravessar a avenida sem a devida sinalização, em quaisquer horários! Alô Secretaria de Trânsito e Transportes do município!!!


Por Daniel Braz


Em tempo:

As pessoas que passaram a utilizar a CNH digital, antes da renovação, devem baixar a nova CNH pelo aplicativo: "CARTEIRA DIGITAL DE TRÂNSITO", na Play Store (Android). Segundo informações do próprio DETRANMA, após o acesso da nova CNH pelo aplicativo, a impressão física, é autorizada em até 4 dias úteis.




É uma pena que tenhamos que descobrir isso sozinhos, pois na ocasião da renovação, não está sendo repassada esta preciosa informação. Lamentável!


terça-feira, 19 de abril de 2022

As escolas que o Centrão esqueceu

Foto: Reprodução
Enquanto o governo Bolsonaro abre o cofre da educação para aliados de Ciro Nogueira, municípios do Piauí têm obras em colégios abandonadas há quase dez anos.

A escola não tem alunos, nem professores, nem banheiro, nem janelas. Também não tem nome. Tem, em vez disso, lixo por todos os lados, insetos e um colchão largado. No meio da imundície vive uma família de porcos. Não fosse pelas carteiras reviradas, ninguém desconfiaria de que aquela construção na zona rural de José de Freitas (PI), a uma hora de distância de Teresina, era para ser um colégio. Muito menos que essa obra deveria ter sido entregue nove anos atrás.

Uma empresa foi contratada pela prefeitura da cidade para erguer a escola em 2013. A construção seria finalizada em 120 dias, bancada com recursos do FNDE – o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, órgão que administra as verbas do Ministério da Educação a serem aplicadas nos estados e municípios. O FNDE se comprometeu a enviar 130 mil reais para que a prefeitura pagasse a construtora, mas a promessa não foi cumprida. Até hoje, segundo os registros do próprio FNDE, a prefeitura só recebeu 75 mil reais para terminar a obra. O contrato com a empreiteira foi prorrogado quatro vezes, a última delas em 2016. Desde então a obra está abandonada, sem qualquer utilização.

“Tem quase dez anos que essa escola tá aí, aos pedaços. Abandonaram totalmente, ninguém nunca soube o porquê”, diz Iracema Barroso, dona de casa que vive perto do colégio, no povoado Creoli, que fica a cerca de 10 km do centro da cidade. Ela conta que, durante quase três anos, a escola chegou a funcionar com 42 alunos, mesmo inacabada. Sua sobrinha estudou ali durante esse período. Como não havia banheiro no colégio, a menina precisava ir até em casa para fazer suas necessidades. Crianças que moravam mais longe não tinham essa opção, então recorriam ao terreno que fica atrás da escola. Não há outra escola no povoado. Hoje as crianças do Creoli precisam estudar no centro da cidade.


Um dos porcos que vive na escola do povoado Creoli, em José de Freitas (PI)
- Foto: Vitória Pilar - Reprodução

A falta de verbas para essa obra contrasta com a dinheirama que tem sido distribuída pelo FNDE nos últimos meses. Conforme revelou o Estadão, o órgão – aparelhado pelo Centrão e presidido por Marcelo Ponte, ex-chefe de gabinete do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira – autorizou 2 mil novas obras de escolas em várias cidades, embora o país tenha hoje 3,5 mil obras inacabadas, esperando por recursos há anos. Essas novas obras foram apelidadas de “escolas fake”, já que o FNDE não tem orçamento suficiente para custear todas até o fim. Elas servem, no entanto, para dar palanque a prefeitos e parlamentares em ano eleitoral. Só no Piauí, terra de Nogueira, foi autorizada a construção de 52 novas “escolas fake”. Enquanto isso, em outros colégios, como o de José de Freitas, obras já contratadas não receberam os recursos prometidos e foram abandonadas.

Roger Linhares, prefeito de José de Freitas, é do Progressistas, mesmo partido de Nogueira. Os dois aparecem em várias fotos juntos nas redes sociais de Linhares. Em outubro do ano passado, depois de se reunir com Nogueira em Brasília, o prefeito anunciou ter obtido recursos para vários projetos do município, entre elas a renovação da frota de ônibus escolares com verbas do FNDE. Nenhuma palavra sobre a escola largada aos porcos. Procurada pela piauí, a assessoria de Linhares afirmou que, quando ele recebeu as obras inacabadas da gestão anterior, não havia documentos no sistema do FNDE que permitissem retomar as construções. “Ele teve todo o interesse em retomar as obras”, disse a assessoria, mas “teve toda uma burocracia para que pudesse dar continuidade”. Segundo a prefeitura, os projetos agora estão refeitos e as obras serão retomadas em breve.

A poucos quilômetros do povoado Creoli, às margens da rodovia PI-366, ainda no município de José de Freitas, há outra obra que foi contratada em 2013 e hoje está abandonada. Onde deveria haver um colégio com duas salas de aula há apenas paredes de concreto e tijolos quebrados do lado de fora. Dos 248 mil reais prometidos pelo FNDE, só foram entregues 124 mil. Francisco Lemos, que mora na outra margem da estrada, em frente à obra, conta que faz anos que não aparecem mais pedreiros para tocar a construção. Para mostrar à piauí a deterioração da obra, ele precisou sacar um facão e cortar o mato que já cerca por todos os lados o terreno onde ficaria a escola. Parte da construção é inacessível. O sobrinho de Lemos, que mora com ele, poderia estudar ali. Em vez disso, o menino, de cinco anos, precisa ser levado de moto até o centro da cidade para ter aulas.

A escola não tem alunos, nem professores, nem banheiro, nem janelas. Também não tem nome. Tem, em vez disso, lixo por todos os lados, insetos e um colchão largado. No meio da imundície vive uma família de porcos. Não fosse pelas carteiras reviradas, ninguém desconfiaria de que aquela construção na zona rural de José de Freitas (PI), a uma hora de distância de Teresina, era para ser um colégio. Muito menos que essa obra deveria ter sido entregue nove anos atrás.

Uma empresa foi contratada pela prefeitura da cidade para erguer a escola em 2013. A construção seria finalizada em 120 dias, bancada com recursos do FNDE – o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, órgão que administra as verbas do Ministério da Educação a serem aplicadas nos estados e municípios. O FNDE se comprometeu a enviar 130 mil reais para que a prefeitura pagasse a construtora, mas a promessa não foi cumprida. Até hoje, segundo os registros do próprio FNDE, a prefeitura só recebeu 75 mil reais para terminar a obra. O contrato com a empreiteira foi prorrogado quatro vezes, a última delas em 2016. Desde então a obra está abandonada, sem qualquer utilização.

“Tem quase dez anos que essa escola tá aí, aos pedaços. Abandonaram totalmente, ninguém nunca soube o porquê”, diz Iracema Barroso, dona de casa que vive perto do colégio, no povoado Creoli, que fica a cerca de 10 km do centro da cidade. Ela conta que, durante quase três anos, a escola chegou a funcionar com 42 alunos, mesmo inacabada. Sua sobrinha estudou ali durante esse período. Como não havia banheiro no colégio, a menina precisava ir até em casa para fazer suas necessidades. Crianças que moravam mais longe não tinham essa opção, então recorriam ao terreno que fica atrás da escola. Não há outra escola no povoado. Hoje as crianças do Creoli precisam estudar no centro da cidade.

A falta de verbas para essa obra contrasta com a dinheirama que tem sido distribuída pelo FNDE nos últimos meses. Conforme revelou o Estadão, o órgão – aparelhado pelo Centrão e presidido por Marcelo Ponte, ex-chefe de gabinete do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira – autorizou 2 mil novas obras de escolas em várias cidades, embora o país tenha hoje 3,5 mil obras inacabadas, esperando por recursos há anos. Essas novas obras foram apelidadas de “escolas fake”, já que o FNDE não tem orçamento suficiente para custear todas até o fim. Elas servem, no entanto, para dar palanque a prefeitos e parlamentares em ano eleitoral. Só no Piauí, terra de Nogueira, foi autorizada a construção de 52 novas “escolas fake”. Enquanto isso, em outros colégios, como o de José de Freitas, obras já contratadas não receberam os recursos prometidos e foram abandonadas.

Roger Linhares, prefeito de José de Freitas, é do Progressistas, mesmo partido de Nogueira. Os dois aparecem em várias fotos juntos nas redes sociais de Linhares. Em outubro do ano passado, depois de se reunir com Nogueira em Brasília, o prefeito anunciou ter obtido recursos para vários projetos do município, entre elas a renovação da frota de ônibus escolares com verbas do FNDE. Nenhuma palavra sobre a escola largada aos porcos. Procurada pela piauí, a assessoria de Linhares afirmou que, quando ele recebeu as obras inacabadas da gestão anterior, não havia documentos no sistema do FNDE que permitissem retomar as construções. “Ele teve todo o interesse em retomar as obras”, disse a assessoria, mas “teve toda uma burocracia para que pudesse dar continuidade”. Segundo a prefeitura, os projetos agora estão refeitos e as obras serão retomadas em breve.

A poucos quilômetros do povoado Creoli, às margens da rodovia PI-366, ainda no município de José de Freitas, há outra obra que foi contratada em 2013 e hoje está abandonada. Onde deveria haver um colégio com duas salas de aula há apenas paredes de concreto e tijolos quebrados do lado de fora. Dos 248 mil reais prometidos pelo FNDE, só foram entregues 124 mil. Francisco Lemos, que mora na outra margem da estrada, em frente à obra, conta que faz anos que não aparecem mais pedreiros para tocar a construção. Para mostrar à piauí a deterioração da obra, ele precisou sacar um facão e cortar o mato que já cerca por todos os lados o terreno onde ficaria a escola. Parte da construção é inacessível. O sobrinho de Lemos, que mora com ele, poderia estudar ali. Em vez disso, o menino, de cinco anos, precisa ser levado de moto até o centro da cidade para ter aulas.


O esqueleto da obra de um colégio na zona rural de José de Freitas (PI)
- Foto: Vitória Pilar - Reprodução
 

Em 2017, constatando o atraso nas obras – que àquela altura já chamava atenção – o Ministério Público Federal abriu um inquérito civil para apurar se houve crime de improbidade administrativa por parte da prefeitura de José de Freitas, já comandada na época por Roger Linhares. O caso não foi para frente, e o inquérito terminou com apenas uma recomendação, feita em 2019: que fossem retomadas as obras das duas escolas, além de duas creches que estavam paradas, e que a prefeitura adotasse “imediatamente as providências necessárias à preservação dos recursos federais já empregados”.

Nos últimos três anos, nada mudou. As obras continuam paradas e o patrimônio pago com dinheiro federal se deteriorou. As carteiras escolares estão danificadas, assim como parte das paredes construídas. Ao ser questionada sobre esse ponto específico, a assessoria do prefeito Linhares afirmou que as obras já estavam paralisadas quando ele assumiu a prefeitura, em janeiro de 2017. É evidente, no entanto, que a situação piorou desde então. As fotos da última vistoria feita pelo FNDE na escola do povoado Creoli, em junho de 2016, mostram um ambiente limpo, com as carteiras alinhadas e um ventilador de coluna. Hoje o ventilador não está mais lá, as carteiras estão reviradas e os porcos tomaram conta do lugar.

Maxwell da Mariinha, outro correligionário de Ciro Nogueira, postou recentemente nas redes sociais um vídeo que gravou em frente à sede do FNDE, em Brasília. Ele é prefeito de Altos, cidade colada em Teresina. No vídeo, gravado ao lado do deputado federal Flávio Nogueira (PT-PI), o prefeito explicou o motivo da visita: “Estamos aqui pleiteando a liberação de mais uma creche, mais um colégio [de] treze salas e uma quadra coberta.” No mesmo dia, o prefeito se reuniu com Eliane Nogueira, mãe de Ciro, que assumiu o mandato do filho no Senado desde que ele se tornou ministro do governo Bolsonaro. No dia seguinte, Maxwell da Marinha foi recebido pelo próprio ministro em seu gabinete.

A prefeitura de Altos obteve no final de 2021 autorização do FNDE para gastar 200 mil reais na construção de uma nova creche orçada em 3 milhões de reais, segundo o Estadão. Também foram autorizados 293 mil reais para a aquisição de ônibus escolares. Enquanto isso, a cidade tem duas obras de quadras esportivas escolares abandonadas por falta de verbas do mesmo FNDE. O órgão, que se comprometeu em 2013 a repassar 503 mil reais para a construção de cada quadra, transferiu apenas 125 mil para cada uma delas. Consequentemente, as obras, contratadas em 2013, mal começaram, tiveram que parar. Estão abandonadas.

A primeira quadra esportiva é anexa à Unidade Escolar Vicente Delmiro, na Comunidade Quilombo, zona rural do município. A única evidência de que algo estava sendo construído ali é a existência de alguns muros contíguos de tijolo. Também há algumas poucas barras de metal, mas tudo foi tomado pelo mato, que chega a quase três metros. A segunda quadra fica no outro extremo da cidade, no povoado Montanha. Ali, a construção se limita a seis muros de concreto: três de um lado, três de outro, formando o que seriam os extremos da quadra. Mas onde deveria estar a obra há um matagal. 


Muros de concreto e um matagal onde deveria haver uma quadra esportiva,
em Altos (PI) — Foto: Vitória Pilar - Reprodução

Ao ser questionada pela piauí, a assessoria do prefeito de Altos alegou que a culpa pela paralisação das obras é da administração anterior, que teria executado mal a obra. Quando Maxwell da Mariinha assumiu a prefeitura, não era financeiramente viável retomar uma construção nessas condições de degradação, afirmou a assessoria. O FNDE também foi procurado para esclarecer o porquê de novos recursos não terem sido liberados para concluir as obras em Altos e em José de Freitas, mas não respondeu aos contatos da reportagem. O espaço segue aberto para manifestações.

“A gente não tem ideia se um dia vai ter quadra. Por enquanto a gente fica aqui encarando essas paredes”, lamenta José Mesquita, de 65 anos, que trabalha como vigia e faz-tudo da Unidade Escolar Deputado Prado Junior. Foi a família de Mesquita que, vinte anos atrás, doou o terreno para a construção da escola, situada ao lado da construção abandonada. Hoje, segundo ele, estudam no colégio mais de duzentas crianças que poderiam ser beneficiadas pela obra. “Tem campinho de terra aqui, mas seria bom uma quadra, né?”

Dono de uma mercearia nos arredores da escola, Camilo Rodrigues, de 38 anos, é cético quanto à possibilidade de a obra ser concluída. “Só fingiram que iam trazer a quadra pra cá”, afirma, sentado numa cadeira de plástico em frente à lojinha. Seus dois sobrinhos, de 8 e 9 anos, estudam no colégio. Ele conta que a construção não engatou em nenhum momento. “Essa quadra só foi derramamento de dinheiro. Derramamento de dinheiro no bolso de alguém, né?”, ironiza Rodrigues. “Eita Piauí que não tem jeito.”

Por Luigi Mazza e Vitória Pilar

* Reportagem atualizada às 19h15 do dia 15/04/2022 para incluir posicionamento da prefeitura de Altos.


Fonte: piauifolha


sexta-feira, 8 de abril de 2022

DENÚNCIA - Com verba do FNDE, prefeito constrói casa e é investigado pela PF

Foto: Reprodução
Com oito obras de creches autorizadas no ano passado com verba do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), o prefeito Luciano Genésio (PDT), de Pinheiro, Maranhão, está sob uma grande investigação envolvendo desvios de recursos na  área de Educação. Aliado de primeira hora dos dois homens fortes do PP no governo do presidente Jair Bolsonaro, Arthur Lira, presidente de Câmara de Deputados, e Ciro Nogueira, ministro da Casa Civil, Genésio chegou a ser afastado do cargo em janeiro deste ano após uma operação da Polícia Federal no município.

Mas depois de cerca de 40 dias fora do cargo ele voltou graças a uma liminar da Justiça. Com cerca de 84 mil habitantes, o município, que é um dos que mais se beneficiaram do programa Proinfância na região, conforme revela reportagem do GLOBO, vive em meio a denúncias de desvios de orçamento público e de notícias envolvendo o enriquecimento do prefeito, que está construindo uma casa de 24 quartos, com direito à pista de pouso, em Povoado Apertado.


"Desde que assumiu o cargo, ele enricou', ele, o prefeito de Pinheiro, é ligado a Athur Lira e ao ministro Ciro Nogueira.diz adversário político de Luciano Genésio

 

Foto: Reprodução

Felipe Dayvisson Carvalho da Silva, conhecido como “Felipe Chicão” (foto acima), vereador do MDB do município de Pinheiro fez uma grave denúncia contra prefeito de Pinheiro Luciano Genérsio e o desembargador Federal Cândido Artur Medeiros Ribeiro Filho (foto abaixo), do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1).


Foto: Reprodução

O parlamentar afirmou que o gestor pinheirense comprou a decisão judicial que o retornou ao cargo. 


"Essa liminar que ele obteve para voltar ao cargo é um absurdo. Dizem que custou milhões”, acusa Felipe Chicão.


Pelo menos 15 dos 17 vereadores da cidade são aliados de Genésio. Procurado, ele não foi localizado pelo GLOBO para se manifestar sobre as denúncias, fruto de investigação da PF e do Ministério Público. Chefe de gabinete do prefeito, Bruna Ramalho informou que ele cumpre uma agenda política em Brasília junto ao senador Werveton Rocha (PDT-MA), pré-candidato ao governo do estado. Genésio é tratado como uma das principais lideranças políticas da região e, antes da investigação da PF, chegou a ser vice-presidente da Federação dos Municípios do Estado do Maranhão (Famem).

Um dos poucos adversários do prefeito, o vereador Felipe Chicão (MDB) de Pinheiro chegou a entrar com um pedido de instalação de uma CPI para verificar desvios da atual gestão municipal e de afastamento definitivo de Genésio, mas o requerimento foi recusado pela Câmara Legislativa. Ele diz ainda que, no ano passado, também houve suspeitas de malversação de recursos públicos para o combate à Covid-19.

Felipe Chicão, acrescentou que Genésio está deixando o PP para se filiar ao PDT, (CORREÇAO: JÁ ESTÁ FILIADO AO "PDT" DESDE 18/03/22) de forma a viabilizar o apoio à candidatura de Werveton Rocha ao governo do estado. "Ele tem estreita ligação com o governo federal. No dia seguinte à operação da PF, ele estava com o Lira numa visita oficial ao Maranhão. Os dois posaram juntos para foto naquele dia" (foto abaixo).


Foto: Reprodução


Em declaração, o prefeito diz ter conhecido Arthur Lira há cerca de um ano, quando ele esteve em São Luís, e que esteve com Ciro Nogueira (foto abaixo) apenas cinco vezes, sempre buscando recursos para o município, disse ele.


Foto: Reprodução

Em março deste ano, a PF desarticulou um suposto esquema de fraudes em licitação, superfaturamento e simulação de fornecimento de alimentos para merenda escolar. As fraudes teriam ocorrido no âmbito do Programa de Alimentação Escolar do FNDE. Os contratos teriam sido fechados com a prefeitura de Pinheiro, mas também com as administrações de São Bento e Peri-Mirim.

De acordo com a PF, os contratos foram firmados com as principais associações rurais da região e teria sido apurado o desvio de quase totalidade dos recursos. Entre 2018 e 2021, somente as três prefeituras teriam se envolvido em irregularidades calculadas em R$ 3,8 milhões. Os valores desviados teriam chegados a agentes públicos, segundo a PF, através dessas associações e de empresas de fachada.

Um dia após a operação 5ª Potência, no dia 23 de março,   Genésio esteve com Arthur Lira, durante cerimônia em que o presidente da Câmara de Deputados foi homenageado com a Medalha do Mérito Municipalista Maria Félix. Na ocasião, Lira estava acompanhado do senador Weverton Rocha


Casa teria pista de pouso e até cinco suítes, uma das quais, sem o closet
e o banheiro - mede cerca de 50 metros quadrados. Há pelo menos
30 cômodos nos dois andares da construção. - Foto: Reprodução

O prefeito mostrou a planta do imóvel que tem 1.300 metros quadrados de área construída e, segundo ele, pode parecer maior porque os cinco quartos têm closet e banheiros grandes. Ele afirmou também que declara cerca de R$ 80 mil por mês de imposto de renda. 

Enquanto se vê engendrado em denúncias nas áreas da Educação, Genésio também chama atenção pela mudança no padrão de vida. Ele está construindo uma casa no povoado da cidade com pista de pouso e área para vaquejada. As obras estariam paradas desde que as operações da PF tiveram início.

Fonte: ig.com / via oglobo / g1


sexta-feira, 4 de março de 2022

Guerra na Ucrânia expõe racismo, intolerância e xenofobia aos refugiados

Imagem: Reprodução

A invasão russa à Ucrânia chegou ao seu oitavo dia na quinta-feira, (3), com o número assustador de um milhão de refugiados, segundo informações da Agência da ONU para Refugiados (Acnur).

O desespero expôs o racismo e a xenofobia na Europa, onde pessoas negras têm enfrentado barreiras impostas tanto pelas instituições governamentais de assistência quanto pela mídia.

Com a urgência e rapidez das notícias veiculadas nas redes sociais, principalmente no Twitter, residentes do país europeu e até mesmo autoridades usam o microblog para se manifestar sobre o conflito. É por lá que muitos refugiados relatam episódios de segregação racial ou xenofobia no momento de tentar deixar o país.

Um homem identificado como Alexander Somto publicou um vídeo, segundo seu próprio relato, gravado na fronteira da Ucrânia com a Polônia. Nas imagens, viaturas bloqueiam uma estrada com policiais armados e jovens aparecem nos vídeos gritando e avisando que são apenas estudantes.

“Veja como eles estão ameaçando atirar em nós! Estamos atualmente na fronteira Ucrânia-Polônia. Sua polícia e Exército se recusaram a deixar os africanos atravessarem, eles só permitem ucranianos. Alguns dormiram aqui por 2 dias sob este frio escaldante”, diz Alexander Somto na publicação.

Outro relato foi feito em entrevista à CNN nessa quarta-feira, 2, também repercutiu nas redes sociais. Nele, uma aluna africana de Medicina afirmou que ela e outros estrangeiros receberam ordens para sair de um carro público, em um posto de controle entre a Ucrânia e a fronteira da Polônia, permanecendo no transporte apenas cidadãos ucranianos a bordo. “Eles disseram que se você é negro, você deve andar”, afirmou.

Na mídia

Os comentários de alguns jornalistas, ao relatarem o conflito, exibiu uma “guerra de narrativas” que se criou sobre pessoas brancas e não-brancas. Um dos exemplos que mais circularam nas redes sociais foi a fala de Charlie D’Agata, do canal norte-americano CBS News. Na última sexta-feira, 25, o jornalista disse que a guerra entre a Rússia e a Ucrânia não era esperada por se tratarem de países europeus.

“Esse não é um lugar, com todo respeito, como Iraque, ou Afeganistão, que tem visto conflitos por décadas. Essa é uma cidade relativamente civilizada, relativamente europeia. Preciso escolher essas palavras com cuidado, também. É uma cidade que você não espera que isso aconteça”, comenta o jornalista ao vivo. Horas após a transmissão, D’Agata pediu desculpas em suas redes sociais.

Também no dia 26, o jornal The Telegraph publicou um artigo do jornalista Daniel Hannan, no qual ele escreveu, em um trecho, que “eles se parecem tanto com a gente”. “Isso é o que faz ser tão chocante. A Ucrânia é um país europeu. Sua população assiste Netflix e tem contas no Instagram, votam em eleições livres e leem jornais não censurados. A guerra não é mais uma coisa que atinge populações empobrecidas e remotas. Pode acontecer com qualquer um”, afirmou.

Discriminação

O mestre em História e estudioso de relações étnico-raciais Juarez Silva Jr. indica haver vários pontos a serem observados quando se fala de racismo. O primeiro é o de “marca”, quando o preconceito e discriminação acontece a partir da aparência física, o fenótipo, que identifica facilmente o discriminado como “diferente” e com associação negativa histórica e cultural, como é o caso do racismo clássico nas Américas.

O segundo é a origem, quando não há muita “marca” fenotípica, mas há outros elementos especialmente culturais, como língua, religião, tradições culturais, que fazem a identificação do “diferente”. Em ambos os casos, segundo Juarez Silva Jr., há uma associação do diferente como “estrangeiro, intruso ou invasor”. Nesse caso, a discriminação é mais nítida e chamada de xenofobia.

“Os brasileiros, por exemplo, estão mais acostumados com o racismo de marca, por isso muitos brancos ficam surpresos ao serem às vezes discriminados em países estrangeiros, porque não é comum por aqui, mas muito comum na Europa e América do Norte, por exemplo”, exemplifica ele.

“A questão étnica também é fator preponderante nos conflitos mundo afora. Grupos étnicos são grupos de cultura mais do que de fenótipo. No caso da região do conflito, o grupo preponderante é das línguas eslavas, ou seja, tem grande parte da história e cultura compartilhada. Daí termos tantas guerras na Europa e Eurásia. O interessante é que normalmente o público externo enxerga essas diferenças nesses contextos, mas quando se trata de outros continentes com África, por exemplo, enxergam todos como uma ‘coisa só’ e até falam em ‘irmãos matando irmãos’, como se não fosse o mesmo que sempre aconteceu nas ‘guerras brancas’, guerras étnicas”, questiona ele.

O mestre em História e estudioso de relações étnico-raciais Juarez Silva Jr. - Foto: Reprodução

Direito à igualdade

A União Africana, organização que reúne os 55 países do continente, condenou publicamente o tratamento que vem sendo dispensado aos cidadãos de países africanos que estão na Ucrânia. “Relatos de que africanos são selecionados para tratamento dissimilar inaceitável são chocantemente racistas e uma violação da lei internacional”, diz o comunicado assinado por Macky Sall, presidente da entidade, também presidente do Senegal, e por Moussa Faki Mahamat, presidente da Comissão da União Africana e ex-primeiro-ministro do Chade.

Fonte: AGÊNCIA CENARIUM / Via jornalismocultura