sábado, 26 de junho de 2021

À CPI, irmãos Miranda reafirmam pressão e irregularidades na compra da Covaxin e Luís Miranda aponta Ricardo Barros como mentor de pressões

Foto: Reprodução

Os questionamentos ao deputado Luis Miranda (DEM-DF) e ao servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, irmão do parlamentar, se concentraram nas pressões sofridas pelo servidor e nas supostas irregularidades dentro do processo de compra da vacina Covaxin. Foram mais de 8 horas e meia de reunião da CPI da Pandemia na sexta-feira (25).

O presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), lembrou que Luis Ricardo veio direto do aeroporto para o Senado, depois de várias horas de um voo internacional. Segundo Aziz, o servidor estava no exterior para buscar vacinas contra a covid.

— Somos devedores ao trabalho do servidor, que veio ajudar a CPI e o Brasil — afirmou Aziz.

O relator da comissão, Renan Calheiros (MDB-AL), questionou Luis Ricardo sobre as observações dele no processo de compra da Covaxin. Segundo o servidor, na análise dos documentos, foram encontradas informações que não batiam com o texto original do contrato da Bharat Biotech com o Ministério da Saúde. Algumas dessas divergências seriam na forma de pagamento, na quantidade de doses e na indicação de empresas intermediárias. Renan disse estranhar a divergência de nomes de empresas intermediárias e afirmou que suspeita de operações em algum paraíso fiscal.

— É um óbvio movimento para dificultar a fiscalização — registrou Renan.

Aziz cobrou de Luís Miranda a entrega à CPI de dois dossiês com denúncias de supostas irregularidades no Ministério da Saúde, ainda na gestão do ministro Ricardo Barros, que foi chefe da pasta entre 2016 e 2018. Para o presidente do colegiado, a posse desses dossiês será importante para a condução dos trabalhos da CPI. Ricardo Barros foi apontado por Luís Miranda como indicado pelo presidente Jair Bolsonaro de ser o mentor das pressões em torno da compra da Covaxin. 

Críticas

O senador Marcos Rogério (DEM-RO) disse estar impressionado porque a agilidade, que antes era tão cobrada, agora tem sido apontada como indício de algo errado. A fala do senador tem a ver com as críticas de que o processo de compra da Covaxin andou bem mais rápido do que outras empresas, até mesmo sem esperar a aprovação da Anvisa. Ele ainda pediu uma apuração da situação pelo Ministério da Saúde e disse ter a impressão de que a denúncia não passa de uma “denúncia vazia”. Segundo o senador, na compra da Covaxin não houve o superfaturamento que foi divulgado pela imprensa. Ele disse que a oposição, que esperava demais, chegou a fazer acusações levianas.

— É maior fake news da história da pandemia no Brasil! Esta CPI está diante de uma fraude de narrativa — afirmou o senador.

O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) quis saber do deputado e do irmão se eles tinham alguma informação sobre irregularidades envolvendo a Precisa Medicamentos, intermediária da compra da Covaxin, e o governo do Distrito Federal. Luís Ricardo negou conhecer a situação e o deputado Luis Miranda disse saber do caso apenas pela imprensa. Para Izalci, há falhas de controle no Ministério da Saúde e há muito mais para a CPI investigar.

Na visão do senador Humberto Costa (PT-PE), a Precisa Medicamentos é uma espécie de empresa VIP dentro do governo. Ele ainda defendeu que os representantes da empresa compareçam à CPI. Para Rogério Carvalho (PT-SE), a CPI já tem cumprido importantes papéis para o país, como a pressão pela compra de mais vacinas. Ele ainda lamentou a postura do governo diante da crise do coronavírus e elogiou a iniciativa do servidor Luis Ricardo.

Presidente

O vice-presidente da comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), destacou que as denúncias dos irmãos Miranda foram levadas à maior autoridade do país, o presidente Jair Bolsonaro. Ao responder a Randolfe, o servidor Luis Miranda disse que o processo da Covaxin foi marcado por “exceção da exceção”, em relação às pressões recebidas. Ele disse que os pedidos de agilização não ocorreram em relação às outras vacinas e lembrou que o Brasil ainda não recebeu nenhuma dose da Covaxin pelo fato de a Anvisa ainda ter dado a autorização para a vacina.

O líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), leu uma nota para apontar que o presidente Bolsonaro, assim que foi alertado pelo deputado Luis Miranda, levou o fato ao então ministro da Saúde Eduardo Pazuello. Conforme a nota do governo, Pazuello pediu ao coronel Elcio Franco, então secretário-executivo da pasta, para verificar a situação. A conclusão foi de que o contrato estava correto.

Bezerra ainda fez uma defesa da Precisa Medicamentos e da Global Gestão de Saúde e disse que não houve superfaturamento na compra da Covaxin. A nota ainda ressalta o compromisso do governo com a lisura e com a transparência e nega qualquer assédio ao servidor Luis Ricardo.

Emendas

O senador Eduardo Girão (Podemos-CE) questionou o deputado se ele recebeu emendas parlamentares extras e por que não discursou na Câmara fazendo a denúncia sobre o caso da Covaxin. Luis Miranda confirmou que teve algumas emendas extras atendidas no Orçamento e reafirmou que falou com a maior autoridade do país, o presidente da República. Ele ainda ressaltou que, depois da saída do ministro Pazuello, não teve mais canais de contato com a Presidência da República.

— A gente [devia] pegar esse recurso, que está reservado para a Covaxin, e destinar para outra vacina. Precisamos agir agora — pediu o deputado.

A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) afirmou que a postura do governo diante da pandemia é “uma defesa da morte”. Ela manifestou solidariedade às famílias das mais de 500 mil vítimas da covid, criticou Bolsonaro e fez uma defesa da estabilidade no serviço público. Segundo Zenaide, a segurança da estabilidade permite ao servidor fazer as denúncias dos esquemas de corrupção, como foi o caso de Luis Ricardo.

Ameaças

A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) afirmou lamentar uma tentativa da base governista de desqualificar os depoentes. Ela criticou a previsão de recebimento antecipado de US$ 45 milhões dentro da compra da Covaxin e questionou Luis Ricardo sobre as recorrentes irregularidades dentro de um contrato de compra de vacina. Ele disse que o normal são falhas pontuais como a falta de indicação de peso líquido ou peso bruto, ou ainda erros de quantidade. Segundo o servidor, com um número grande de correções graves, a primeira vez foi na compra da Covaxin. Ele também disse desconhecer um suposto pedido de propina negado, que teria sido citado pelo ministro Eduardo Pazuello, ex-titular da pasta da Saúde.

Em relação a ameaças, o deputado Luis Miranda lamentou o que chamou de “incitação de violência” por parte do ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Onyx Lorenzoni, que disse em entrevista que ele teria de prestar contas a Deus e ao governo, além de chamá-lo de traidor. O deputado anunciou que vai acionar a Justiça contra o ministro. Luis Miranda também citou várias ameaças em suas redes sociais e disse que, durante um dos intervalos, teve um “desconforto” com o senador Marcos do Val (Podemos-ES).

— Nós não atacamos o governo. Apenas apontamos um fato que precisa ser investigado. Não fizemos nada de errado — declarou o deputado, que chegou para depor com colete à prova de balas e com uma Bíblia na mão.

Em resposta, Marcos do Val disse ter sido ameaçado pelo deputado e pediu o registro dessa informação nas atas da CPI. O senador disse não ver nenhum indício de corrupção na situação mostrada pelos irmãos Miranda. Marcos do Val tentou passar um vídeo sobre denúncias que já foram veiculadas na imprensa contra o deputado, que supostamente teria aplicado golpes milionários em sócios, quando morava nos Estados Unidos. Omar Aziz negou a exibição do vídeo por considerar que o tema era divergente do foco da CPI e para evitar constranger o convidado.

— Não é uma questão de censura, mas de objeto — afirmou o presidente do colegiado.

Divergências

Os questionamentos aos irmãos Miranda foram marcados por divergências e interrupções entre senadores da oposição e da base governista. Enquanto o foco da oposição eram as pressões sofridas pelo servidor e as supostas irregularidades na compra da Covaxin, os senadores da base governista diziam que os documentos foram corrigidos e que não há irregularidade na compra. Houve muita interrupção, discussão e alterações entre os senadores. Aziz chegou a suspender a sessão por dez minutos, pediu calma ao deputado Luis Miranda e cobrou objetividade dos senadores.

Por várias vezes, Bezerra interrompeu os depoentes. O deputado Luis Miranda reclamou que estava sendo constrangido pelo líder do governo, mas Bezerra apontou que o deputado estava assessorando o irmão, o que seria ilegal. O líder ainda pediu para que a CPI não procure “ver fantasmas onde não existe”, pois várias empresas “trabalham com off-shore”. Randolfe pediu calma e disse que Bezerra estava muito nervoso. Em resposta, ele disse que a base do governo estava “absolutamente tranquila”.

Em participação remota, o senador Jorginho Mello (PL-SC) defendeu o governo, chamou Luis Miranda de “larápio” e pediu que a Câmara dos Deputados leve o deputado ao Conselho de Ética, por supostamente falar mentiras.

— Picareta! Vinagre! Vai lavar tua boca, picareta! — disse Jorginho Mello ao deputado, que o acusou de responder processos na Justiça.

Renan questionou se o deputado Miranda e o seu irmão conheciam o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), entre outros vários nomes. Por conta dessa citação, Flávio Bolsonaro pediu uma questão de ordem e, de forma remota, negou qualquer vínculo com qualquer empresa fornecedora de medicamentos. Ele ainda questionou quais as verdadeiras intenções de Renan com a relatoria da CPI, ao citar pessoas ligadas a sua família.

— O senador Renan Calheiros parece que é o dono da CPI. Renan Calheiros não pode fazer o que bem entender e não pode quebrar o sigilo de quem ele quer — reclamou Flávio Bolsonaro.

Diante de tantas interrupções e divergências, Marcos Rogério disse que a situação estava “insalubre”. Eliziane Gama (Cidadania-MA) lembrou que o colega ficou mais de meia hora com a palavra, parecendo “ser o relator da comissão”. Marcos Rogério ainda disse conhecer a verdadeira motivação do deputado Luis Miranda em fazer as denúncias, mas disse que não queria “falar sobre isso”. Aziz e outros membros da comissão pediram que o senador tornasse pública essa suposta motivação. Marcos Rogério, no entanto, não quis continuar com o assunto e o deputado Luis Miranda pediu respeito.


Miranda aponta Ricardo Barros como mentor de pressões no Ministério da Saúde


O deputado Luis Miranda em
depoimento à CPI da Pandemia - Reprodução

O deputado Luis Miranda (DEM-DF) confirmou que o presidente Jair Bolsonaro citou o nome do deputado Ricardo Barros (PP-PR) como suspeito de ser o mentor por trás das supostas irregularidades na compra da vacina Covaxin. A informação foi passada à CPI da Pandemia ainda na sexta-feira (25).

Em resposta ao vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Luís Miranda disse que o presidente Bolsonaro tinha a desconfiança da atuação de um deputado em torno das pressões no Ministério da Saúde em favor da vacina da empresa indiana Bharat Biotech. Luís Miranda, no entanto, disse não recordar do nome citado, mas apontou que o deputado é da base governista e ligado ao presidente Bolsonaro.

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) desafiou o depoente a “ter coragem” de citar que o nome do deputado em questão era o de Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara dos Deputados. Para o senador, o depoimento de Luis Miranda ficaria incompleto ao não apontar o nome do colega deputado. Alessandro Vieira também disse que vai apresentar um pedido de convite ou convocação para a CPI ouvir Ricardo Barros.

Na mesma linha, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) pediu que o deputado Luis Miranda não tivesse receio de indicar o nome citado por Bolsonaro. Simone defendeu uma homenagem ao servidor Luis Ricardo, irmão do deputado. Segundo Simone, Luis Ricardo impediu um negócio suspeito, e lembrou que uma das bandeiras de campanha de Bolsonaro era o combate à corrupção. Em resposta, Luis Miranda disse que, em alguns momentos, “é importante a gente esquecer o que a gente escutou”.

— Acho que eu já cheguei no limite de complicar minha... Não é que eu não esteja querendo colaborar. A CPI vai chegar [ao nome] e o Brasil vai perceber que estamos vivendo uma hipocrisia — declarou Luis Miranda, emocionado, para pouco depois confirmar o nome de Ricardo Barros.  

O presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), informou que pediu à Polícia Federal para providenciar proteção para a família do deputado Luis Miranda e ao servidor Luis Ricardo Miranda, irmão do deputado. Omar disse que já encaminhou o pedido há três dias e ainda não teve resposta e cobrou agilidade do governo. Diante do fato, Aziz pediu que o presidente da Câmara, Arthur Lira, garanta proteção para o deputado. Ele também disse que vai providenciar os trâmites burocráticos para a proteção do servidor Luis Ricardo.

Impeachment

Para Fabiano Contarato (Rede-ES), a revelação reforça a necessidade de impeachment do presidente Jair Bolsonaro. O senador disse esperar que o presidente da Câmara, Arthur Lira, leve avante um dos mais de 130 pedidos de afastamento do chefe do Executivo. Segundo Contarato, a CPI precisa dar uma resposta à altura sobre essa denúncia.

— Os brasileiros precisam abrir os olhos. A denúncia vem de alguém que é da base do governo — declarou.

Eliziane Gama (Cidadania-MA) afirmou que a admissão do nome de Ricardo Barros confirmaria que o presidente Bolsonaro não só sabia das supostas irregularidades como não fez nada para impedi-las. Para a senadora, trata-se de crime de prevaricação. A parlamentar manifestou solidariedade a Luis Miranda, que até chorou ao falar do nome de Ricardo Barros e do receio de ameaças a sua família.  

Resposta

Pelo Twitter, o deputado Ricardo Barros afirmou que não participou de nenhuma negociação em relação à compra das vacinas Covaxin. “Não sou esse parlamentar citado”, registrou o deputado, acrescentando que “a investigação provará isso”. Barros negou que tenha indicado a servidora Regina Célia, fiscal de contratos que teria autorizado a continuidade do processo de compra da Covaxin dentro do Ministério da Saúde. O deputado afirmou não ter “relação com esses fatos”.

Fonte: Agência Senado