terça-feira, 21 de novembro de 2023

Cientistas comprovam eficiência de planta brasileira em vazamentos de petróleo

Imagem: reprodução

Pesquisador da UFRN compartilha em artigo resultados de estudos nacionais com uso da "Calotropis procera" para absorver óleo derramado no mar.

O derramamento de petróleo é um problema ambiental gravíssimo, que pode causar danos significativos à vida marinha. Os efeitos do derramamento de óleo nesses ambientes são variados e podem afetar todos os níveis da cadeia alimentar local.

Podem, por exemplo, causar desde danos físicos a mamíferos marinhos, como sufocamento, intoxicação e perda de isolamento térmico, à contaminação de plânctons e outros organismos microscópicos. Além disso, os derramamentos de óleo podem contaminar os alimentos e o habitat dos animais, tornando-os mais vulneráveis a predadores e doenças.

Uma vez que o petróleo bruto é formado por uma mistura complexa de compostos químicos, incluindo hidrocarbonetos que apresentam compostos de diferentes efeitos tóxicos nos organismos marinhos, este quando entra em contato com o ambiente marinho passa por uma série de processos naturais que podem alterar sua composição e, consequentemente, a sua toxicidade.

Por todos esses motivos, o derramamento de petróleo no Brasil é um tipo de acidente ambiental que quase sempre tem consequências desastrosas, tanto imediatas quanto de longo prazo. Despertando, assim, a necessidade permanente de se tomar medidas para prevenir derramamentos de petróleo e principalmente mitigar seus impactos.

Técnicas de remediação de derramamentos de petróleo

Ultimamente, muitos pesquisadores vêm travando uma corrida incessante em uma busca do desenvolvendo novos materiais e técnicas para remoção e separação do petróleo da água, proveniente de derramamentos.

As quatro principais tecnologias utilizadas para remoção do petróleo em água são:

  • Difusão física: o óleo é espalhado pela água para que seja mais fácil de coletar;
  • Queima in-situ: o óleo é queimado no local do vazamento;
  • Biorremediação: micro-organismos são usados para quebrar o óleo;
  • Recuperação mecânica: o óleo é coletado com absorventes (em forma de mantas, travesseiros, barreiras e até aplicado diretamente), ou outros dispositivos.

A recuperação mecânica é, sem dúvida, a tecnologia mais comum para remoção de óleo resultante de vazamentos. Essa técnica apresenta simplicidade na aplicação e eficácia, além de não causar poluição secundária.

Entre as técnicas de recuperação mecânica, enquadra-se o uso dos materiais absorventes, que atraem o óleo e podem ser utilizados aplicando-os diretamente no derramamento de petróleo, ou empregados em forma de barreiras de contenção. Os materiais absorventes absorvem o óleo, que então pode ser removido para descarte ou até reciclado.

As vantagens da planta abundante no Brasil

Nos últimos anos, os materiais absorventes de óleo à base de fibras vegetais e resíduos agrícolas, como palha de milho, casca de arroz, serragem, fibra de algodão e fibra de sumaúma, têm recebido atenção crescente. Eles possuem as vantagens de serem de baixo custo, fácil disponibilidade, biodegradabilidade, boa eficiência e seletividade de absorção por óleo, tornando-se assim uma alternativa preferível.

Diante desse contexto, a planta brasileira Calotropis procera tem se destacado. Ela possui uma fibra natural que apresenta propriedades hidrofóbicas (aversão por água) e oleofílicas (afinidade por óleo), além de ser biodegradável, leve e de estrutura física oca. Todas essas características — aliadas ao baixo custo de produção e armazenamento — tornam a planta uma excelente alternativa como material para limpeza e remoção de petróleo em água.

A Calotropis procera é uma planta comumente conhecida como flor-cera, rosa-cera ou seringueira. Ela é um arbusto nativo da África e da Ásia, mas foi introduzida no Brasil no século 19, e é considerada invasora (erva-daninha), pois se espalha rapidamente e pode causar danos ao meio ambiente.

Essa planta produz frutos com um grande número de sementes, que germinam rapidamente, como mostrado na imagem a seguir. Isso significa que a planta pode ser cultivada de forma rápida e eficiente. Ela pode ser encontrada atualmente em diversas regiões do Brasil, mas é no Nordeste que estão estabelecidas as grandes populações dessa espécie.

Potencial comercial

Em estudo recente da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, a pesquisadora Larissa Sobral Hilário, em sua tese de Doutorado de título Avaliação da fibra Calotropis procera modificada para remoção de petróleo na superfície da água analisou as características da planta para remoção de óleo bruto em cenário de derramamento.

Os resultados do estudo mostraram que 1 grama da fibra é capaz de remover aproximadamente 76 gramas de petróleo. Já a fibra modificada chega a remover mais de 180 gramas de petróleo, superando os absorventes comerciais sintéticos, como as espumas de poliuretano e polipropileno, os quais ainda apresentam limitações de custo de produção e não biodegradabilidade.

Os primeiros resultados desse estudo foram publicados na revista Internacional Materials. Esse fenômeno se justifica devido a fibra de Calotropis possuir uma estrutura tubular típica com revestimento ceroso na superfície, e isso confere ótima capacidade de absorção de óleo.

Em 2020, em parceria com Larissa Hilário e outros colaboradores, publiquei o artigo Crude oil removal using Calotropis procera na revista BioResources. Nele, nós descrevemos um experimento onde a fibra natural foi modificada quimicamente e hidrotermicamente, obtendo resultados ainda melhores de remoção do petróleo e derivados na água.

O estudo também mostrou que planta é uma opção atraente para a produção em escala industrial de absorvente, por ser abundante, fácil de cultivar e produz um material com ótimas características para remoção de petróleo em água.

O grupo de pesquisa do Núcleo de Processamento Primário e Reuso de Água e resíduos da UFRN — este coordenado pelo professor Djalma Ribeiro da Silva, em setembro de 2021 — também obteve ótimos resultados com a combinação da fibra a outros produtos.

Em dezembro desse mesmo ano, foi depositado o pedido de patente no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) para o novo material absorvente desenvolvido por esse grupo de pesquisa. Por não necessitar de muito cuidado no manejo, a Calotropis procera pode gerar grande desenvolvimento e alcance social no Nordeste, já que é encontrada com abundância nessa região.

NOTA DOS AUTORES: Fazem parte dos estudos sobre a Calotropis procera os pesquisadores Raoni Batista dos Anjos, Larissa Sobral Hilário, Djalma Ribeiro da Silva (In memoriam), Emily Cintia Tossi de Araújo Costa, Tarcila Maria Pinheiro Frota, Aécia Seleide Dantas dos Anjos, Amanda Duarte Gondim e a bacharel em química Maíra Rachel Gerônimo de França. Agradecemos especialmente ao Professor Djalma Ribeiro da Silva (In memoriam) pelo incentivo e luta incansável pela causa ambiental.

Este artigo foi originalmente publicado no site The Conversation Brasil.

Fonte: revistagalileu