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Ativista Malala Yousafzai envia carta a Pacheco pedindo foco na educação e Sessão alerta para reverter perdas educacionais da pandemia
A ativista paquistanesa Malala Yousafzai enviou ao presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco, uma carta em que pede políticas públicas que garantam a permanência de crianças e adolescentes na escola. A carta foi lida durante uma sessão de debates no Plenário do Senado, na tarde de segunda-feira (21), pela coordenadora-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Andressa Pellanda.
A sessão especial, uma sugestão do senador Flávio Arns (Podemos-PR), está sendo realizada de forma virtual, com o tema “Busca Ativa: Toda Criança na Escola”. A senadora Leila Barros (Cidadania-DF) dirige os debates, que têm foco nas estratégias para garantir o retorno e a permanência de crianças, adolescentes e jovens nas escolas públicas brasileiras, depois da pandemia do coronavírus. Representantes do governo e especialistas em educação participam da sessão.
Carta
Na carta, Malala manifesta sua preocupação com a taxa de evasão escolar no Brasil, “que aumentou drasticamente desde o início da pandemia de covid-19 — especialmente entre as meninas”. Ela elogia os investimentos do Brasil “desde muitos anos”, mas aponta que a pandemia reverteu muitas conquistas, “com 10% dos alunos de 10 a 15 anos relatando que não irão retornar à sala de aula quando suas escolas reabrirem”.
Malala cobra "uma agenda legislativa que priorize o financiamento contínuo da educação pública no Brasil". Ela também faz um apelo para que deputados e senadores "assumam compromissos ambiciosos pela educação das meninas, garantindo a implementação de mecanismos como o Fundeb e regulamentando o Sistema Nacional de Educação”.
No documento enviado a Pacheco, Malala ainda pede por uma “busca ativa de estudantes que estão fora da escola e por estratégias intersetoriais para evitar o abandono escolar de milhares de estudantes”. Ela destacou que, desde 2020, milhares de crianças deixaram de frequentar a escola, devido às consequências sociais e econômicas da pandemia.
De acordo com especialistas em educação, a estratégia da busca ativa é primordial para que os sistemas de ensino enfrentem a exclusão escolar, principalmente de meninas, mais vulneráveis a situações de abusos e/ou violências, seja do ponto vista institucional, sexual, doméstica ou de gênero. O objetivo da busca é garantir o direito constitucional à educação pública, gratuita e de qualidade para todas as crianças e todos os adolescentes.
Malala e Andressa
Malala Yousafzai nasceu em 1997, no Paquistão. Ela é conhecida pela militância em favor dos direitos humanos, das mulheres e pela educação de qualidade. Em 2012, quando tinha 15 anos, ela sofreu um atentado dentro de um ônibus escolar. Um radical religioso — que não aceitava a educação para mulheres — atirou três vezes contra ela. Depois de recuperada, intensificou sua defesa por uma educação que inclua todos os meninos e meninas. Em 2014, se tornou a pessoa mais jovem a receber um prêmio Nobel da Paz.
Andressa Pellanda, que leu a carta de Malala, é militante pela educação, especialista em ciência política e uma das integrantes da Malala Fund no Brasil. A organização é um coletivo de 11 educadores comprometidos em promover a educação de meninas, principalmente de indígenas e quilombolas, nas regiões do país com os piores índices educacionais.
Sessão temática alerta para necessidade de reverter perdas educacionais da pandemia
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pandemia. O alerta foi feito por senadores e debatedores durante sessão temática, na segunda-feira (21), com o tema Busca ativa: toda criança na escola. Os participantes também pediram atenção do Congresso à questão do financiamento, que, na opinião da maioria, é essencial neste momento de retomada.
A sessão temática foi sugerida pelo senador Flávio Arns (Podemos-PR). Na presidência da sessão, a senadora Leila Barros (Cidadania-DF) leu dados de um relatório divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) em janeiro. Segundo o documento, durante a pandemia, em média, os alunos aprenderam apenas 28% do que teriam aprendido nas aulas presenciais e o risco de desistência aumentou mais de três vezes.
— Mas o dado mais desolador desse documento é a perspectiva de que 10% dos alunos que abandonaram as aulas devido à pandemia jamais voltarão às escolas — lamentou a senadora.
O secretário de Educação Básica do Ministério da Educação, Mauro Luiz Rabelo, confirmou a queda no número de estudantes matriculados em 2021. A queda no número de matrículas com relação ao ano anterior foi de 1,3%. No total, 1,4 milhão de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos não estavam matriculadas na escola em 2021, número superior ao de antes da pandemia, em 2019, de 1,1 milhão.
Para reverter esse quadro, o ministério desenvolve ações como busca ativa escolar, sistema de alerta preventivo e acompanhamento personalizado da aprendizagem. De acordo com o secretário, também está sendo desenvolvido um programa com foco no Norte e no Nordeste, em parceria como Banco Mundial.
Coordenação
Para Lucas Fernandes, líder de relações governamentais do Movimento Todos Pela Educação, ações do governo são positivas, mas a resposta nem sempre ocorre de forma coordenada em estados e municípios. As capacidades de cada local, como lembrou, são diferentes no que diz respeito a recursos financeiros e técnicos. Os mais prejudicados são os alunos que já sofriam antes com a desigualdade.
— A gente vê que os mais atingidos são as crianças e jovens periféricos, negros, do campo, aqueles que historicamente são os mais prejudicados, mas, na pandemia, essa cicatriz virou uma ferida que se abriu ainda mais em termos de desigualdade no sistema educacional — disse.
Florence Bauer, representante do Fundo das Nações Unidas Para a Infância (Unicef) no Brasil, também ressaltou o aumento das desigualdades anteriores no período da pandemia. Ela lembrou que a educação tem grande impacto no crescimento econômico de um país e fez um apelo para que essa área seja tratada como prioridade absoluta em 2022.
— Tem que ser o ano da educação, o ano da busca ativa, e isso tem que se traduzir nos programas dos candidatos, tanto a nível presidencial, como estadual, com orçamentos, para que realmente possamos ainda aproveitar essa janela, que é pequena, para recuperar essas crianças e adolescentes que corremos tanto o risco de perder. Ao se perder essas crianças e adolescentes, há uma perda sim em nível individual, mas há uma perda sem tamanho como sociedade.
Busca ativa
A Busca Ativa Escolar é uma estratégia desenvolvida pelo Unicef, em parceria com a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime). A metodologia e a ferramenta são oferecidas gratuitamente para estados e municípios para que eles possam identificar, e acompanhar, crianças e adolescentes que estão fora da escola ou em risco de evasão. O presidente da Undime, Luiz Miguel Martins Garcia, afirmou que, em 2020, os números eram piores do que em 2021. Havia 1,5 milhão de alunos não matriculados na escola, mas, além deles, outros 3,7 milhões, apesar de estarem matriculados, não haviam recebido nenhum tipo de atividade.
— Eu sou muito otimista, eu acredito que, se nós fizermos bem o dever de casa neste momento, nos próximos anos, algo em torno de quatro a cinco anos, nós poderemos estar adiante do que estaríamos se não tivéssemos vivido isto e incorporado as ações que nós estamos tendo oportunidade de fazer agora. Então, nesse sentido, nós precisamos buscar essa criança onde quer que ela esteja — afirmou.
A presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), Maria Helena Guimarães de Castro, lembrou que, desde maio de 2020, todas as resoluções do conselho trazem recomendações de busca ativa, acolhimento e avaliação diagnóstica como ações emergenciais. Ela afirmou que, nesse processo, o Senado tem um papel importante na articulação entre os entes federados e a entidades ligadas à educação.
— Entendemos que, se essa prioridade e urgência não for assegurada neste ano de 2022, nós teremos problemas gravíssimos, muito maiores até do que aqueles que nós temos neste momento. É muito importante essa retomada com equidade, com qualidade, com combate às desigualdades, garantindo recursos, assistência técnica aos municípios e articulação entre os três níveis de governo. Como estamos vendo aqui, e o Senado Federal tem um papel importante nesse trabalho de articulação.
Em análise no Senado, o PL 4.458/2021, do senador Flavio Arns, declara o ano de 2022 como o Ano da Busca Ativa: Toda Criança na Escola. Já o PL 3.385/2021, do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), implementa a Política Educacional Emergencial nos anos finais do ensino fundamental e médio nas escolas públicas. A política inclui a busca ativa dos estudantes, para evitar a evasão observada durante a pandemia de covid-19. O projeto está na pauta do Plenário e pode ser votado nesta terça-feira (22).
Financiamento
A questão do financiamento também foi lembrada pelos debatedores e senadores na sessão temática. A coordenadora-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Andressa Pellanda, leu uma carta da ativista Malala Yousafzai, co-fundadora do Fundo Malala. Na carta, a ativista pediu a colaboração do Congresso em políticas públicas que garantam a permanência de crianças e adolescentes na escola.
Para Andressa Pellanda, a promulgação, pelo Congresso, da Emenda Constitucional 108 foi um avanço. A emenda, promulgada em 2020, tornou permanente o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Ainda assim, ela lembrou que a Lei Orçamentária de 2022 foi aprovada com R$ 63 bilhões a menos do que seria necessário na área da educação.
— Não adianta pensarmos em imensas estratégias de busca ativa escolar se não pensarmos em como essas estratégias serão financiadas. A gente tem um cenário muito grave de falta de recursos nesse momento para a educação. De 2015 a 2022, segundo um estudo da Direitos Valem Mais, a gente teve 45% de redução no orçamento da educação — lamentou.
A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) , que também assinou o requerimento da sessão temática, concorda. Para ela, não é possível fazer educação pública de qualidade sem recursos.
— Este parlamento tem uma responsabilidade muito grande sobre esse orçamento. É o Parlamento que o define — disse Zenaide, antes de lembrar que o contingenciamento dos recursos da saúde e da educação é frequente.
Presidente da União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme) e coordenador do Fórum Nacional de Educação (FNE), Manoel Humberto Gonzaga Lima, também ressaltou a necessidade de um financiamento compatível com o momento enfrentado pela educação.
— Que haja, por parte do governo federal, principalmente, a compreensão para o complemento de algumas ações, para que possamos atingir os objetivos — disse.
O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) disse acreditar que a perspectiva de voltar à escola em tempos normais já é difícil, porque falta internet e recursos como laboratórios e refeitórios, por exemplo. Para ele, projetos como os que direcionam recursos financeiros para incentivar a permanência de alunos da escola precisam servir como exemplo para todo o país.
Fonte: Agência Senado