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Foto: Reprodução |
Maximiano compareceu após uma série de adiamentos. E já havia dado sinais de que se esquivaria das perguntas. Cabeça da empresa representou no Brasil o laboratório indiano Baraht Biotech, Maximiano pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que sua presença na CPI fosse facultativa, alegando ser um investigado pela CPI. Na véspera, a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, rejeitou o recurso da defesa e manteve a obrigação de Francisco comparecer. O dono da Precisa foi convocado na condição de testemunha.
O sócio da Precisa abriu mão dos 15 minutos de fala que normalmente são dados a testemunhas e investigados que comparecem à CPI e por diversas vezes evocou seu direito ao silêncio para não se incriminar. Soraya Thronicke (PSL-MS) afirmou que o "silêncio falou alto". Para Fabiano Contarato (Rede-ES), Maximiano se recusou a responder a "perguntas elementares": não explicou por que os pagamentos à Precisa seriam feitos em paraíso fiscal e também não informou se a Precisa paga tributos pelas operações. Ele concluiu que os fatos incriminam quem opta pelo silêncio e lembrou que a diretora da Precisa, Emanuela Medrades, esteve na CPI com a mesma defesa, mas falou.
— Eu só posso concluir que se ela optou a falar, o silêncio do senhor leva a atribuir a responsabilidade criminal ao senhor por corrupção passiva, ativa, falsificação de documento - apontou Contarato.
Entre as perguntas que ficaram sem resposta está ainda a incompatibilidade do padrão de vida de Maximiano com seus rendimentos declarados. Renan Calheiros quis saber sobre as movimentações financeiras e perguntou se os valores altos são resultado de lavagem de dinheiro. Maximiano permaneceu em silêncio.
— Poderia explicar como pagou algumas centenas de milhares de reais em gastos de cartão de crédito, com uma renda declarada apenas de R$ 52 mil em 2020? - perguntou Renan.
Contrato
A Precisa representou no Brasil o laboratório indiano Baraht Biotech, que fabrica a vacina Covaxin, e estaria envolvida em irregularidades no processo de compras do imunizante pelo Ministério da Saúde. A vacina estava sendo negociada ao preço de US$ 15 a dose, e o contrato previa a aquisição de 20 milhões de doses, num total aproximado de R$ 1,6 bilhão, com a conversão da época. Renan quis saber do empresário quanto desse valor ficaria com a Precisa e, mais uma vez, a resposta não veio. Segundo Renan, Ministério da Saúde e a empresa não encaminharam o contrato para a CPI.
— Não sei se o silêncio de Vossa Senhoria quer que o Brasil e mesmo os membros desta Comissão Parlamentar de Inquérito acreditem que, num negócio tão vultoso, 1,614 bilhão, as obrigações das partes não foram sequer estabelecidas, já que nós não temos acesso a esse contrato. Até hoje esse contrato não foi remetido pela Precisa nem pelo Ministério da Saúde - criticou.
Questionado por Renan sobre o preço da Covaxin ser 50% mais alto que as outras vacinas, Maximiano limitou-se a dizer que o contrato de compra da Covaxin envolvia 20 milhões de doses a 15 dólares por unidade, valor fruto de negociação.
— Quem determina o preço de venda da vacina não é a Precisa, e sim o seu fabricante, a Bharat Biotech, que tem uma política internacional de preços. Nós conseguimos que ela fosse praticada no seu piso para o governo brasileiro, com frete, seguros e todas as despesas envolvidas.
O relator apontou, porém, documentos do Itamaraty e da CPI estimando outros valores, bem inferiores, para a Covaxin.
Simone Tebet (MDB-MS) afirmou que os contratos da Precisa com o Ministério da Saúde são suspeitos e com indícios de corrupção, tráfico de influência, crime contra administração pública e até lavagem de dinheiro.
— A Precisa não tinha contrato com a Bharat. E só tem um jeito de Vossa Senhoria e a sua empresa se safarem de tudo isso: é apresentar o contrato, até para mostrar, com base nele, que esses documentos não saíram da Precisa. Mas mais grave do que isso: teve o conluio direto do Ministério da Saúde, porque isso é totalmente fraudado - apontou SImone.
Teia
Para Tasso Jereissati (PSDB-CE), é "altamente incriminador" o silêncio da testemunha sobre a forma de remuneração estabelecida entre a Baraht e a Precisa. O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) afirmou ter a impressão de que Maximiano faz parte de um grupo de "coisas ilegais que não se restringem a vacina, mas envolvem negociações escusas, lavagem de dinheiro e outros crimes".
O senador citou personagens de uma intricada teia que incluíria a participação do FIB Bank, financeira que deu garantias no contrato da Precisa Medicamentos com o Ministério da Saúde para fornecimento da Covaxin. O FIB Bank não tem autorização do Banco Central.
Segundo Tasso, não se trata verdadeiramente de um banco, mas de "uma sociedade estranha e fajuta", cuja maior parte do capital integralizado de R$ 7,5 bilhões é formado por empresas donas de terrenos que nem sequer existem. Além de Francisco Maximiano, estariam entre os envolvidos o empresário Marcos Tolentino, dono da Rede Brasil de Televisão; Danilo Berndt Trento, que acompanhou Maximiano à Índia para as negociações em torno da vacina Covaxin; e o empresário Ricardo Benetti.
— É uma das montagens mais intrincadas e vastas que eu vi na minha vida. São dezenas de empresas. Isso tudo está comprovado com ligações, um passando o dinheiro para outro, o outro passa dinheiro para um, e um dos centros é esse FIB Bank - apontou Tasso.
Aluguel
Sobre Marcos Tolentino, Francisco Maximiano disse que o conhece, mas afirmou não ter relações com ele. Senadores então o questionaram sobre um processo em que o dono da Precisa é relacionado por não pagar o aluguel de uma cobertura no bairro Campo Belo, em São Paulo. Tolentino tem autorização para entrada no imóvel. Em resposta a Randolfe (Rede-AP), ele afirmou que seria o fiador do imóvel. O senador mostrou o processo onde Maximiano aparece como locatário.
Após o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) pedir que a CPI avaliasse a possibilidade de prisão de Maximiano por mentir em relação ao contrato de aluguel, o sócio da Precisa se retratou:
— Eu formalmente consto como locatário no contrato deste imóvel. Não me recordava porque não vivi neste imóvel - disse Maximiano.
Ricardo Barros
Outro personagem dessa rede seria o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR) de acordo com senadores. Maximiano também é sócio da Global Saúde, acusada de não ter cumprido contrato fechado com o Ministério da Saúde para fornecer remédios de alto custo. O negócio foi feito no fim de 2017, quando a pasta era chefiada pelo deputado federal Ricardo Barros, atual líder do governo na Câmara.
Em depoimento à CPI, Barros disse não ter relação pessoal com Maximiano, negou ter participado de processos de negociações de vacinas e deu explicações sobre os problemas contratuais com a Global. Apesar de se negar a responder à maior parte perguntas dos senadores, o sócio da Precisa e da Global admitiu conhecer o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), e reconheceu que a emenda apresentada pelo deputado para inclusão da agência sanitária indiana na MP 1.026/2021, convertida na Lei 14.124, de 2021, era de interesse da Precisa. Ele, contudo, negou ter havido contato sobre esse assunto com Barros.
— Não houve nenhum contato com o deputado Ricardo Barros para fazer essa inclusão — disse o sócio da Precisa.
Randolfe Rodrigues (Rede-AP) exibiu ata de uma reunião no Ministério da Saúde, em 12 de janeiro de 2021, que contou com a participação do dono da Precisa. De acordo com os relatos do encontro, lidos por Randolfe, Maximiano teria sugerido aos servidores da pasta mudanças na Medida Provisória - que estava em tramitação no Congresso Nacional - e que autorizava a importação de vacinas contra covid-19. Segundo a memória do próprio Ministério, o empresário teria sugerido incluir no texto a agência reguladora indiana, permitindo assim a importação da vacina Covaxin.
Para Randolfe, os relatos da reunião sugerem uma ligação com a emenda apresentada por Ricardo Barros.
— A emenda reivindicada foi apresentada dias depois pelo deputado Ricardo Barros. É a única emenda específica com essa reivindicação apresentada pelo deputado.
Índia
Humberto Costa (PT-PE) questionou Francisco Maximiano sobre o motivo da viagem que fez a Índia, após o rompimento do laboratório indiano Baraht Biotech com a Precisa Medicamentos. O senador destacou que o rompimento se deu após a Baraht Biotech verificar que os documentos para intermediar a compra do imunizante Covaxin eram falsos.
— Eu fui à Índia apresentar para eles as evidências e as provas de que nós recebemos esses documentos da Envixia, um parceiro deles — disse o depoente.
O senador desmentiu Maximiano dizendo que tem um documento enviado pela perícia do Senado Federal que afirma que "a fraude não foi cometida pela Envixia, como disse o depoente, e sim, pelo Ministério da Saúde.
BNDES
O empresário afirmou que o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) não possui ligação nenhuma com a Precisa. Apesar disso, ele admitiu que participou de uma reunião com o senador e o presidente do BNDES, Gustavo Montezano. O objetivo seria obter um empréstimo para bancar um projeto relacionado à internet. Maximiano também é dono de uma empresa de serviços de banda larga, a Xis Internet Fibra. Em resposta ao relator, Renan Calheiros, ele negou que a Xis tenha feito repasses para a Precisa.
Horas depois da resposta, Renan Calheiros informou que há registros de transferências, ao contrário do que afirmou Maximiano.
Prisão
Diante da recusa a colaborar e da insistência de Maximiano em ficar em silêncio, senadores alegaram que a garantia constitucional estava sendo extrapolada e exigiram uma resposta. Alessandro Vieira (Cidadania-SE) apresentou questão de ordem e apontou que as perguntas não tinham conteúdo de possível autoincriminação. Senadores também discutiram a possibilidade de prisão do depoente com base em decisão do ministro Luiz Fux que atribuiu à CPI avaliar eventuais abusos ao direito ao silêncio. No fim, decidiram seguir com o depoimento.
Precisa
O tema Covaxin entrou na mira da Comissão de Inquérito depois que o servidor Luiz Ricardo Miranda denunciou que estava sendo pressionado para acelerar a compra. Luiz Ricardo é irmão do deputado Federal Luiz Miranda (DEM-DF), e ambos já depuseram à CPI. Na ocasião, os irmãos disseram ter avisado ao presidente Jair Bolsonaro, sobre a suspeita de corrupção e fraude na contratação.
Depois que as suspeitas tornaram-se públicas por meio da CPI da Pandemia, o contrato foi cancelado pelo Ministério da Saúde, e a Bharat Biotech, rompeu com a Precisa em julho.
Adiamentos
A primeira tentativa para ouvir Maximiano ocorreu em 23 de junho, mas os advogados avisaram na véspera que ele estava em quarentena, após retornar da Índia.
O compromisso foi remarcado para 1º de julho, mas foi adiado, uma vez que, no dia anterior, ele conseguira um habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF) concedendo-lhe o direito de ficar em silêncio para não se incriminar.
O empresário seria ouvido também em 14 de julho, junto com a diretora-técnica da empresa, Emanuela Medrades, mas o comando da CPI decidiu que não seria possível ouvir os dois no mesmo dia. O depoimento de Emanuela havia começado um dia antes, mas se alongou após ela ter recusado sistematicamente a responder os senadores e só foi concluído no dia seguinte.
A última da oitiva estava marcada para 4 de agosto, logo na volta do recesso parlamentar, mas o empresário pediu a mudança de data porque novamente estava na Índia. Ele havia embarcado antes de ser notificado pela Comissão, que optou por não tomar nenhuma medida. A direção da CPI chegou a avaliar o pedido de prisão de Maximiano, mas desistiu da ideia.
Estados
Durante a reunião, Marcos Rogério (DEM-RO) e Eduardo Girão (Podemos-CE) reclamaram da falta de interesse da CPI em investigar casos de corrupção nos Estados. Eles disseram ter apresentado dezenas de requerimentos de convites e convocações, que sequer foram pautados.
— Eu tenho uma série de requerimentos que nunca foram sequer pautados nesta CPI. O Senador Girão também. São 36 requerimentos de convocação de minha autoria, 6 requerimentos de convite, 6 requerimentos de informações, e 2 requerimentos de compartilhamento de informação. Dentre esses requerimentos, chama atenção a blindagem que fazem ao Estado da Bahia - criticou Marcos Rogério.
Fonte: Agência Senado