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O orçamento público é um ato do Estado contendo a aprovação prévia das receitas e das despesas públicas. Constitui-se no instrumento disciplinador das finanças públicas, ou seja, é a partir das decisões orçamentárias que definimos a possibilidade de implementação das políticas públicas. O orçamento pode ser considerado, por um lado, o ponto de partida da implementação das políticas. Por outro lado, o resultado final do procedimento orçamentário é a real prestação dos serviços públicos à população. Assim, esse é um documento que expressa as escolhas financeiras de um país.
A partir de uma perspectiva política, o orçamento é um instrumento voltado para a solução de necessidades e problemas, cujo objetivo é servir de impulsionador do bom funcionamento dos serviços públicos. A prerrogativa de proposição orçamentária, portanto, pertence ao poder executivo. Esse elabora um plano orçamentário, a partir do teor e alcance que deseja para cada política pública incluída na agenda de governo, e encaminha para a aprovação do poder legislativo. No entanto, cada vez mais, o Legislativo brasileiro vem ampliando seu protagonismo sobre o orçamento.
Na última década, o Legislativo vem incrementando sua ingerência sobre o orçamento. Por meio das emendas parlamentares, pelas alterações legais que desembocaram nas emendas impositivas (individuais ou de bancada) e pelo uso indiscriminado das emendas do relator-geral entre 2020 e 2022, o Legislativo passou a interferir intensamente no processo de políticas públicas destinando, ele mesmo, verbas para as mais diversas políticas. Foram destinados R$ 33,3 bilhões para as emendas impositivas em 2024 e, em 2023, foram R$ 26,2 bilhões.
Os dados demonstram que as emendas impositivas têm sido efetivamente ampliadas. Essa ampliação limita a atuação do governo na destinação dos recursos orçamentários para o financiamento das políticas públicas prioritárias. No entanto, a atuação do Legislativo em matéria de orçamento vai além da destinação de emendas. A votação de projetos no legislativo também demostra, em algumas ocasiões, pouco compromisso com as necessidades da sociedade brasileira e com as demandas por responsabilidade fiscal. Como exemplo disso, temos o debate legislativo sobre a PEC do Quinquênio, que está em votação no Senado Federal.
A chamada PEC do Quinquênio estabelece o pagamento de um adicional por tempo de serviço (ATS) de 5% do salário dos membros do Poder Judiciário e do Ministério Público a cada cinco anos de exercício profissional. O referido bônus incidiria na remuneração de juízes, procuradores e promotores de justiça, ampliando ainda mais a lista de privilégios concedidos a servidores do Judiciário e ampliando o fosso entre esses e os servidores dos outros Poderes da República.
A aprovação da referida PEC denota uma série de problemas. Por um lado, os legisladores brasileiros estariam premiando, sem justificativa aceitável, uma categoria profissional que já possui uma série de privilégios questionáveis. Além disso, a PEC do Quinquênio impactaria o orçamento de forma significativa e possivelmente afetaria as metas fiscais do país. E, por fim, o direcionamento de recursos para o pagamento do incremento salarial de servidores do Judiciário a cada cinco anos levaria, possivelmente, à diminuição de recursos destinados a diversas políticas públicas com potencial impacto para toda a sociedade.
Em um país que gasta cerca de 1,6% do seu Produto Interno Bruto (PIB) para custear o Judiciário (em detrimento dos 0,4% do PIB gastos, em média, por outros países do mundo), destinar mais recursos públicos para esses revela a tônica de atuação do legislativo com relação ao orçamento. É fundamental que o Poder Legislativo tome decisões responsáveis com relação ao orçamento público, seja na destinação de recursos por meio de emendas parlamentares ou na votação de legislações que possuem impacto importante sobre o orçamento.
Em 2024, a ingerência do Legislativo em questões orçamentárias é um fato. Portanto, é preciso advogar pela responsabilização dos legisladores pelas decisões tomadas com relação ao orçamento.
Por MICHELLE FERNANDEZ Doutora em Ciência Política pela Universidade de Salamanca (Espanha) e graduada em Ciência Política pela UnB. Professora e pesquisadora no Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília.
Fonte: congressoemfoco
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